Ciência

Pesquisa liga jejum intermitente a morte por doença cardíaca; ele é mesmo ruim?

Nutricionistas avaliam estudos que mostram evidências sobre efeitos desse tipo de dieta no corpo

Por Gabriel Rodrigues
Publicado em 26 de março de 2024 | 14:34
 
 
 
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Nem sempre associado a dietas saudáveis, o jejum intermitente é uma moda que especialistas em nutrição validam, por um lado, mas condenam, por outro. Agora, mais uma evidência soma-se aos argumentos sobre a prática: um estudo mostra que pessoas que se alimentam somente durante um intervalo de oito horas (e passam as demais 16 horas em jejum) têm 91% mais risco de morte por doenças cardiovasculares em comparação a quem come em intervalos regulares.

A pesquisa analisou dados de cerca de 20 mil adultos nos EUA, comparando dados de padrões alimentares de participantes das Pesquisas Nacionais de Exame de Saúde e Nutrição (NHANES) de 2003 a 2018 a informações do Índice de Morte do CDC (Centro Nacional de Controle e Prevenção de Doenças) de 2003 a 2019.

Os próprios pesquisadores destacam, porém, que a análise implica uma relação entre os dois fatores, mas não necessariamente uma causa — isto é, não é possível afirmar que o jejum intermitente tenha causado os problemas cardiovasculares.

A nutricionista Cristiane Alecrim sublinha outras ressalvas que precisam ser levadas em conta nesse tipo de estudo: “a base de dados não considera a alimentação da população e a composição da alimentação. Sendo assim, analisou-se apenas se a pessoa fazia jejum intermitente ou não e a causa da morte. Desta maneira, não há de se considerar que o jejum seja a causa raiz dos óbitos. O paciente poderia ser obeso e ter uma alimentação desequilibrada, promovendo risco à saúde cardiovascular, que foi citada com causa do óbito”. Ela recomenda atenção à conclusão de outros estudos que apresentam evidências ora positivas, ora negativas sobre esse tipo de dieta — alguns extrapolam descobertas feitas em animais à saúde humana, por exemplo. 

Em meio a tantas informações díspares, quando é recomendado aderir à prática? Nutricionistas não a condenam categoricamente, contudo destacam que só deve ser seguida com uma alimentação saudável e, claro, acompanhamento profissional. “Esse estudo é importante porque, de certa forma, vai ao encontro do que o passado nos dizia: é melhor se alimentar fracionadamente, com pequenas refeições, do que ficar oito horas ou mais sem se alimentar. É um estudo importante, mas ele precisa ser replicado. Há necessidade de novos estudos sobre isso”, introduz o presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), Durval Ribas Filho. 

“O jejum intermitente nada mais é do que uma dieta hipocalórica, com poucas calorias. Na década de 70, havia uma dieta chamada cinco por dois, em que, durante cinco dias, a pessoas ingeria de 1.500 a 2.000 calorias e, durante dois, somente 500. Na somatória, essa dieta popular era hipocalórica”, continua. Ele avalia que, com acompanhamento médico, tipos de dieta hipocalórica podem beneficiar na perda de peso de pessoas obesas, por exemplo.

O nutricionista e sócio da clínica Be Light Thiago Cunha lembra que o jejum intermitente ganhou mais tração após o Nobel de Fisiologia e Medicina ser entregue, em 2016, ao biólogo japonês Yoshinori Ohsumi. Ele pesquisou a autofagia, um processo de regeneração natural das células, em leveduras, um tipo de fungo. Com base nisso, pesquisas em camundongos demonstraram aumento da longevidade daqueles que eram submetidos ao jejum. Mas estudos em humanos ainda precisam ser aprofundados, reforça Cunha.

O que é possível afirmar por ora, diz ele, é que qualquer jejum precisa ser aliado a uma alimentação equilibrada. “Apenas indivíduos com boa rotina de treino e alimentação vão se beneficiar realmente dessa prática. Não adianta fazer o jejum e não ter uma boa alimentação. Tão importante quanto a estratégia adotada, como jejum intermitente, é como se dá a alimentação nessas janelas de oportunidade. Alguns pacientes sem comorbidade, que buscam uma rotina mais dinâmica e já têm uma boa prática alimentar, podem se beneficiar de maneira positiva do jejum intermitente”, conclui.

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