Assim como a presidente Dilma Rousseff (PT), sua inimiga política, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), deverá enfrentar nesta semana dias decisivos para conseguir se manter no cargo. Desde a última sexta-feira, quando foram revelados detalhes do dossiê elaborado pelo Ministério Público da Suíça com o caminho do dinheiro movimentado em contas secretas dele e da mulher, Cláudia Cruz, a avaliação é que o presidente da Câmara não deverá resistir muito tempo. A acusação é de que os R$ 23,2 milhões encontrados nas contas são fruto de propina em negócios da Petrobras. Dinheiro que bancou caprichos como aulas de tênis com um dos maiores especialistas do mundo na modalidade.
Afundado no escândalo da Lava Jato, Eduardo Cunha assiste o bombardeio contra ele vir de todos os lados. A oposição, antes aliada nas ações contra o governo Dilma, agora cobra publicamente seu afastamento. Em outra frente, o PSOL irá protocolar nesta terça na Comissão de Ética da Câmara o pedido de saída do peemedebista.
O que muitos dos eleitores brasileiros talvez não saibam, no entanto, é que o atual presidente da Câmara carrega um currículo recheado de episódios ligados a denúncias de corrupção. Um histórico que teve início ainda na década de 90. A começar pela Telerj, a companhia telefônica do Rio de Janeiro, onde ocupou a presidência por indicação de PC Farias, tesoureiro do ex-presidente Collor. De lá, Cunha saiu sob a acusação de superfaturamento em licitações.
Na sequência, depois da sua primeira (e última) derrota eleitoral, em 1998, recebeu o amparo de políticos evangélicos, grupo ao qual se tornou próximo, e assumiu a Companhia Estadual de Habitação (Cehab). Com os problemas de gestão, deixou a empresa com nova acusação de desvio de dinheiro.
A ascensão na vida política coincidiu com o início dos problemas com a Receita Federal, como acontece agora. Ainda como deputado estadual, ele foi acusado de realizar movimentações financeiras incompatíveis com sua renda. De lá para cá, apareceu como citado no mensalão do PT e até envolvido na venda de uma casa a um traficante.
Apesar de graves, as denúncias, até então, não haviam afetado tão fortemente a imagem de Eduardo Cunha. Ele, por sua vez, tem insistido em dizer que não cogita renunciar à presidência da Câmara.
Para o cientista político da Universidade Federal de Juiz de Fora, Paulo Roberto Figueira Leal, é o momento político que sustenta Cunha. “Ele não caiu por uma série de acasos. Para a oposição, interessa mantê-lo porque ele é um desafeto do governo. E o Planalto não quer enfrentá-lo, com medo de desfalecer a base aliada. Não há qualquer dúvida de que alguém com o histórico dele já teria caído há muito tempo”, afirma.
Figueira aposta que a queda de Cunha é uma questão de tempo. O que ninguém sabe, porém, é o tamanho do estrago que ele irá provocar enquanto resistir.
Corregedoria
Partidos. Na última quarta-feira,29 deputados de sete partidos (PT, PSOL, PPS, Rede, PROS, PSB e PMDB) entregaram pedido à Corregedoria da Câmara para que as denúncias sejam investigadas.
Outros casos
Por menos, outros presidentes da Câmara ou do Senado já caíram:
Severino Cavalcanti
2005: Renunciou após ser apontado como um dos beneficiários de um esquema de propina envolvendo um dos restaurantes da Câmara.
Renan Calheiros
2007: Denúncias que envolveram o pagamento de pensão a uma filha fora do casamento feito por um lobista levaram a seis representações no Conselho de Ética e à renúncia à presidência do Senado.
“Ele está perdido, mas fará o impeachment”, diz um colega
BRASÍLIA. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), tem hoje como pilares políticos espalhados em três fortes bancadas na Casa: a dos evangélicos, a dos ruralistas e a chamada bancada da bala. Mais do que a gratidão por desengavetar matérias que há anos eram tabu na Casa, como a que garantiu a redução da maioridade penal, esses aliados ainda têm esperança de ver votados projetos como o que revisa o Estatuto do Desarmamento e o polêmico Estatuto da Família.
Mesmo com o agravamento das denúncias, essas bancadas preferem agir com cautela. “A oposição não vai empurrá-lo para o abismo, mas também não vai segurá-lo. Não tem o que fazer. A situação dele já está definida. Ele está perdido, mas vai fazer o impeachment”, garante um colega.
“Por enquanto são denúncias”
Mesmo com seu nome citado em tantos escândalos, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) ainda conta com o apoio de vários colegas na política, inclusive de membros do próprio Conselho de Ética da Câmara. O deputado Mauro Lopes (PMDB-MG), um dos titulares do grupo, é um deles. “Por enquanto são só denúncias. As acusações sempre existiram, e, como integrante do Conselho de Ética, já analisei coisas que não passavam disso. Agora, havendo prova material, nós vamos agir com rigor. Ele terá o direito à defesa, e vamos fazer o julgamento”, diz o mineiro, sem disfarçar o tom ameno com o colega de partido.
Questionado sobre a gravidade da revelação dos gastos com as contas secretas na Suíça, o deputado de Minas desconversou. “O Ministério Público da Suíça encaminha para o Ministério Público brasileiro, que vai encaminhar para o Supremo. E eles vão analisar. Ninguém pode ser cassado por antecipação”, completou.
O parlamentar também afirmou acreditar que dificilmente o presidente da Câmara renunciará ao cargo. “Ele é uma pessoa determinada”, completou.