Denúncia

Barrada na porta da balada em BH

Jovem comemoraria aniversário no Chalezinho, mas foi impedida; ela acredita ter havido preconceito

Por Aline Diniz
Publicado em 12 de agosto de 2016 | 03:00
 
 
 
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O domingo era de comemoração: Júlia* festejaria seus 20 anos com 25 amigos. Ela havia se preparado com antecedência de dois meses para o dia da festa, separou cerca de 30% do salário para comprar um vestido e um par de sandálias de salto alto – o investimento de R$ 300 fazia sentido, afinal era o dia dela. Marcou salão de beleza para cuidar do visual e de cada detalhe. No dia 10 de julho, tudo pronto e perfeito para a balada, mas o entusiasmo parou na porta do Clube Chalezinho, na região Oeste da capital, onde a aniversariante foi impedida de entrar.

Para Júlia, os funcionários da casa informaram que ela precisaria ter mais de 21 anos. Contudo, ela teve outra interpretação: “Ele (gerente) olhou para mim de cima a baixo com preconceito e foi totalmente negativo ao falar ‘você não vai entrar’. Ele enfatizou que eu não me encaixava no perfil da casa”, disse. Diante da situação, ela procurou um advogado e entrou com um pedido de indenização na Justiça por preconceito, injúria racial e tratamento desigual, no último dia 26. Segundo o defensor Thiago Simões, o juiz já teria determinado que a casa apresentasse a defesa.

Caixa de um bar em Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte, onde mora, Júlia disse que seus clientes indicaram a boate, mas saiu do lugar humilhada. “Não sei se não gostaram da minha roupa, que não era de marca como as das outras mulheres. Elas aparentavam ser ricas, tinham joias de verdade. A gente é trabalhador, e ninguém merece isso”, disse. 

Trâmite. Júlia fez todo o processo exigido pela casa. Conversou primeiro com um “promoter” pelo WhatsApp, que colocou o nome dela na lista. Ela e outros três colegas foram para o local por volta de 19h, para assegurar a reserva. Antes de 20h, homens pagariam R$ 80, e mulheres, R$ 50. Depois deste horário, o valor subiria para R$ 100 e R$60, respectivamente. Metade é revertida para consumação.

Ao chegar, a “hostess” conferiu os documentos e entregou os quatro convites. Mas, em seguida, o segurança barrou os quatro e informou que não poderiam entrar por causa da idade e chamou o gerente. Segundo a jovem e um colega de 22 anos, que pediu anonimato, o gerente foi rude e mencionou diversas vezes a palavra perfil. “Nós imploramos para entrar”, ressaltou Júlia. O grupo ficou ainda mais triste quando eles viram dois homens de 20 anos entrarem com certa facilidade.

“Estávamos no nosso limite e não argumentamos”, ponderou o colega. Após a negativa, o grupo voltou para Betim, e Júlia, sem coragem de contar o motivo, teve que desmarcar a festa.

Simões informou que baseia o processo na Constituição, que determina que todos devem ser tratados da mesma maneira; no Código Civil, que prevê o término da menoridade aos 18 anos; na Lei da Injúria Racial Velada e no Código de Defesa do Consumidor. O pedido de indenização é de R$ 50 mil. “Lutamos por uma indenização justa, que sirva de punição para a boate”.

*A pedido da jovem, a reportagem não a identificou

Restrição não confirmada

A reportagem conseguiu localizar clientes assíduos da boate com menos de 21 anos. Uma jovem de 19 anos, que também pediu para não ser identificada, contou que entra no Chalezinho sem enfrentar problemas. “Vou às sextas-feiras. Neste ano, já fui quatro vezes e sou muito bem tratada”, afirmou.

Em contato com a casa pelo telefone, nenhum funcionário informou ter restrição em relação à idade. Também não há esse dado em peças publicitárias da boate no Facebook. (AD)

Resposta

Boate se coloca à disposição de cliente

O Clube Chalezinho, por meio da assessoria de imprensa, informou que não podia se posicionar sobre esse caso específico, porque não havia sido procurado antes para apurar e tomar as devidas providências sobre as alegações da cliente. Em nota, a casa ressaltou que “não há qualquer política discriminatória com base em gênero, religião e tampouco etnia”.

A boate se colocou à disposição para tentar solucionar o caso com a cliente e antecipou as desculpas, caso ela tenha se sentido insatisfeita com o atendimento.

Análise. Por ser um estabelecimento privado, o Chalezinho pode estabelecer regras, segundo o advogado especialista em direito do consumidor Bruno Burgarelli. Essas normas devem estar contidas, de maneira clara, em todos os materiais de divulgação da casa. Inclusive, quando houver reservas, o cliente precisa ser avisado. “Se não avisar, configura uma prática abusiva”, analisou. (AD)

Confira a nota enviada pela assessoria de imprensa do estabelecimento à redação de O TEMPO

"Lamentamos ter que explicar o caso sem ter conhecimento de informações suficientes para entender o que de fato houve e até a existência de supostos ex-funcionários não identificados, mesmo após tentarmos contato com a cliente. Mas reafirmamos a inexistência de qualquer prática de discriminação com base em etnia, o que parece ter sido alegado. Nossas restrições de entrada tem critérios objetivos tais como programas de fidelidade, serviços adquiridos, vestimentas (camisetas de time, chinelos, etc), entre outros, abertamente divulgados e disponíveis para consulta de nossos frequentadores. Mais uma vez, nos desculpamos de antemão se a cliente não foi atendida com propriedade. Estamos abertos a buscar a solução para o episódio e apresentar o funcionamento da casa para quem estiver genuinamente interessado no esclarecimento dos fatos."

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