Lei do Silêncio

BH pode tornar-se a capital mais tolerante ao barulho

Proposta pretende elevar o limite permitido de 60 decibéis para 80 decibéis no período noturno

Por Mariana Nogueira
Publicado em 01 de julho de 2017 | 03:00
 
 
 
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Belo Horizonte pode tornar-se a capital brasileira com maior tolerância ao nível de ruído, caso o projeto de lei que altera a Lei do Silêncio seja aprovado na Câmara Municipal. O alerta foi feito por pesquisadores do Laboratório de Produção Legislativa (LPL) do Centro Universitário Newton Paiva, que apresentaram um relatório técnico em audiência pública realizada na última quinta-feira na Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da Casa.

A proposta é elevar a permissão de volume de som em atividades escolares, religiosas, bares e restaurantes no período da noite de 60 decibéis (dB) para 80 dB. Segundo o coordenador do LPL, Gustavo Hermont Corrêa, a proposta vai contra todas as legislações atualmente vigentes no Brasil. Segundo ele, a média em todas as capitais do país é de 50 dB a 70 dB, sendo alterada apenas em época de grande eventos. “A festa de são João de Salvador tem (limite permitido de) 85 dB. Ou seja, com a proposta aprovada, nós vamos praticamente viver em um constante são João do Nordeste. É um absurdo”, afirmou.

Já um dos autores da proposta, o vereador Autair Gomes (PSC), afirma que projeto vai adequar a cidade à realidade atual. Ele argumenta que o alto nível de ruídos já faz parte da rotina da capital e que a proposta pode ajudar estabelecimentos e instituições a não receberem tantas multas. “Nós já convivemos e já estamos dentro desse padrão de 80 db que estão sendo propostos. Nós estamos simplesmente tirando esse peso desses locais que pagam cada vez mais multas”, explica.

O presidente da Associação de Moradores do Bairro Coração Eucarístico e Região (AmoCoreu), onde há grande concentração de bares e restaurantes, Walter Freitas, 61, acredita que a proposta é em desrespeito ao cidadão e que multas são reflexo do incômodo gerado. “Os estabelecimentos geram emprego e renda, e isso é bom, mas o direito de ter paz e tranquilidade também tem que ser respeitado”, afirma.

Segundo a fonoaudióloga da Associação Brasileira de Audiologia (ABA) e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Luciana Macedo de Resende, aumentar o nível de ruído permitido pode trazer graves prejuízos à saúde do cidadão. Ela ressalta ainda o risco de se incluir as escolas na mudança de regra. “Isso é muito sério, porque tem crianças que não conseguem aprender ouvindo ruído. Isso é um retrocesso, não deve ser aprovado. Vem contra o que é saúde, desenvolvimento e respeito ao ser humano”, avalia.

Para o autor da proposta, vereador Autair Gomes (PSC), a mudança pode ajudar na educação das crianças. “A criançada, na hora do recreio, vai ser disciplinada a não emitir esses barulhos”, afirmou.
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que 50 dB já podem provocar interferência na comunicação, risco de perda auditiva, perturbação do sono, estresse e perda de concentração.

Denúncias

Crescimento. De 2015 para 2016, o número de reclamações no Disque 156 aumentou. Em 2015, foram registradas 5.860 queixas, enquanto, em 2016, foram 8.704, um aumento de 48,5%.


Segundo turno

Resultado será imprevisível

O projeto de lei que altera a Lei do Silêncio foi aprovado em primeiro turno no ano passado e não tem data prevista para ser votado em segundo turno. Quando voltar a plenário, o resultado é imprevisível, de acordo com vereadores ouvidos pela reportagem, apesar da aprovação tranquila por 22 votos a 9 na primeira votação.

Os parlamentares explicam que a nova legislatura, que assumiu no início deste ano, mudou a composição da Câmara, e a posição dos novos vereadores em relação ao tema ainda não é conhecida.

Se for aprovado em segundo turno, o projeto ainda tem que ser sancionado pelo prefeito Alexandre Kalil (PHS) para virar lei.

De acordo com vereador do Matheus Simões (Novo), o projeto deve ser retirado e não poderia ser aprovado. “Sou extremamente contrário ao projeto, pois ele vai contra a saúde pública. O estudo feito pela faculdade Newton Paiva indica que nenhuma cidade no país possui essa tolerância de 80 db, somente em situações excepcionais, como festas de são João, Carnaval e outras”, disse.

O vereador Pedro Patrus (PT) informou que ainda não houve uma reunião com a bancada do partido para fechar questão. Segundo ele, em primeiro turno, os petistas foram favoráveis ao aumento da tolerância, mas, com as mudanças no projeto, os parlamentares ainda não estabeleceram uma posição. (Franco Malheiro)

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