Já dura mais de 13 horas o julgamento de dois dos quatro acusados de envolvimento na morte de cinco trabalhadores rurais sem terra, em novembro de 2004, crime que ficou conhecido como Chacina de Felisburgo. Os trabalham estão na fase de debates e ocorre no Fórum Lafayette, em Belo Horizonte.
Os depoimentos dos réus ocorrem nesta tarde de quinta-feira (10). O primeiro a falar foi o fazendeiro Adriano Chafik. Depois foi a vez do réu Washington Agostinho da Silva. Os dois negaram as acusações.
"Eu não sei de nada e nem vi nada. Só fui até o local pegar gado", contou Silva. Ele afirmou ter visto Chafik dar um tiro para o chão na Fazenda Nova Alegria, no dia dos assassinatos, mas teria saído do local para mexer com os bois. "Não vi fumaça, não escutei outros tiros e nem vi incêndio", disse.
Além disso, o réu desmentiu depoimentos anteriores dados à polícia. "Não lembro de nada, não me recordo". O réu depôs por cerca de 40 minutos.
Durante a fase de debates, a promotoria afirmou que o objetivo dos réus era promover uma chacina e que as vítimas foram baleadas no peito e na cabeça. Segundo a acusação, Adriano Chafik seria o mandante dos crimes, que foram cometidos com crueldade e de forma premeditada.
O promotor Christiano Leonardo encerrou sua fala pedindo a condenação dos réus por todos os crimes. "Não podemos admitir nenhum tipo de injustiça. O Brasil não pode continuar sendo o país do coronelismo, onde as pessoas que são donas de terras querem varrer todo tipo de gente delas. E é esse tipo de pessoa que se senta no banco dos réus hoje", afirmou o promotor.
A defesa começou a expor seus argumentos pouco antes das 20h e culpou o Estado pelo desfecho trágico do caso. O advogado Sérgio Habid afirmou que as terras foram herdadas pelo réu, registradas legalmente e eram produtivas. Habid sustentou que a propriedade privada é um direito e que o Estado foi omisso ao não proteger as terras que pertenciam legitimamente à Chafik.
Defesa encerrou as alegações às 22h, provocando a acusação a seguir com o debate na réplica, prometendo ter mais provas. Antes de indagar se haveria réplica, juiz pediu pausa de 30 min para o jantar.
Às 22h43 foram retomados os trabalhos. O promotor não concedeu a réplica. Em seguida o o Conselho de Sentença se dirigiu a uma sala para votação dos quesitos.
Depoimento de Chafik
O momento mais esperado do julgamento do fazendeiro Adriano Chafik e de mais um homem, acusados de envolvimento na autoria da morte de cinco trabalhadores rurais sem terra, em novembro de 2004, crime que ficou conhecido como Chacina de Felisburgo, começou na tarde desta quinta-feira (10). Chafik começou a dar o seu depoimento e nega todas as acusações feitas pelo Ministério Público.
Chafik começou a ser ouvido por volta de 12h30. Dono da Fazenda Nova Alegria, ele declarou, logo no início de julgamento, que sempre evitou o conflito fundiário, tendo recorrido à Justiça para garantir a posse da terra. Chafik disse que foram os assentados que deram início ao conflito que resultou nas mortes e que só atirou após ser ameaçado e agredido.
O fazendeiro se defendeu e contou que no dia dos cinco assassinatos, em novembro de 2004, ele, Washington Agostinho da Silva (que também será julgado), o primo de Chafik, Calixto, e um outro homem, que disse não saber o nome, foram à Fazenda Alegria para contar as cabeças de gado que ele possuía, já que entre 2002 e 2004 ele teria dado falta de pelo menos 15 animais. Quando eles chegaram no local, há cerca de seis quilômetros do acampamento do Movimento dos Sem Terra (MST) encontram cerca de cem pessoas (membros do MST) com enxadas e material de roça, incitando a violência contra ele e os companheiros. Um rapaz (irmão de uma das vítimas fatais) teria agredido Chafik com uma foice e ele atirou no chão e em direção ao homem, mas não sabe se acertou. Depois disso, ele e os outros três homens teriam ido embora.
Além disso, o acusado afirmou que apenas ele e mais dois estavam armados e por isso não seria possível que com apenas três armas eles conseguissem ter atirado pelo menos 56 vezes contra os acampados. Nos corpos das vítimas há esse número de marcas, segundo a acusação.
Chafik disse ainda que não ofereceu gasolina para que as pessoas incendiassem o acampamento e que não premeditou o crime.
"Isso é o Brasil". Foi assim que o fazendeiro justificou o fato de sua família se apropriar de terras devolutas em Felisburgo, no Vale do Jequitinhonha, na qual está a Fazenda Nova Alegria. O depoimento dele durou cerca de duas horas.
Após a leitura do resumo da denúncia feita pelo Ministério Público estadual, foram ouvidas a testemunha de acusação Wilton Soares, que denunciou que o clima de ameaças na região continua. Em seguida foi ouvida uma testemunha de defesa, José Aílton, que garantiu que a Fazenda Nova Alegria era uma das mais produtivas da região e que, hoje, se encontra “sucateada”. Outras testemunhas foram dispensadas.
O conselho de sentença é formado por dois homens e cinco mulheres. O quinto réu no processo, Adilson Rodrigues Lima, já morreu.
O julgamento
Começou por volta de 9h40, desta quinta-feira (10), o julgamento do fazendeiro Adriano Chafik e mais um homem acusado de participação na Chacina de Felisburgo, que aconteceu em 2004. A sessão acontece no Fórum Lafayette, no Barro Preto, na região Centro-Sul de Belo Horizonte. O juiz Glauco Eduardo Soares Fernandes é responsável pela audiência.
A pedido do advogado do fazendeiro e de Washington Agostinho da Silva, o julgamento foi desmembrado. Sendo assim, os outros acusados, Francisco de Assis Rodrigues de Oliveira e Milton Francisco de Souza, serão julgados em 23 de janeiro de 2014.
Em agosto deste ano, o julgamento foi adiado pela terceira vez após o advogado de Chafik, acusado de ser o mandante do crime, não comparecer ao Fórum Lafayette alegando problemas de saúde. Por esse motivo, o fazendeiro, Francisco de Assis Rodrigues de Oliveira e Milton Francisco de Souza, tiveram a prisão preventiva decretada. O outro suspeito, Washington Agostinho da Silva, não se apresentou no fórum e foi considerado foragido.
Entretanto, Chafik passou apenas 18 dias preso no Complexo Penitenciário Nelson Hungria, em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, e foi libertado há um mês.
Aproximadamente 150 integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra estão na porta do fórum.
Manifestação
Nessa quarta-feira (9), aproximadamente 120 pessoas fizeram uma manifestação na porta no Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra), no bairro Cruzeiro, na região Centro-Sul, cobrando a condenação dos acusados.
Em nota, a superintendência do Incra afirmou que a intenção do grupo é permanecer no local até esta sexta-feira (11). Além disso, a expectativa é que mais três ônibus tragam agricultores para as manifestações na capital. Os serviços do Incra estão paralisados até a desocupação da superintendência.
Caso
Quatro pessoas são suspeitas de invadir o acampamento Terra Prometida, instalado na fazenda Nova Alegria, no Vale do Jequitinhonha, em 20 de novembro de 2004, e atirar contra homens, mulheres e crianças. Cinco trabalhadores morreram e outras 12 pessoas ficaram feridas na ação, que ainda incluiu o incêndio de 27 casas e da escola do acampamento. Anos depois da chacina, as famílias ainda vivem no assentamento e aguardam que parte da área seja desapropriada.
De acordo com o Ministério Público, integrantes do MST invadiram a fazenda ao saberem que se tratava de terras que nunca pertenceram a um particular, mesmo estando ocupadas por Adriano Chafik. O fazendeiro entrou com ação de reintegração de posse, mas acabou perdendo, e as terras foram demarcadas em favor dos assentados. Inconformado com a derrota jurídica, ele reuniu 14 homens, que passaram a ameaçar os assentados, até que ordenou o ataque ao acampamento.
Ele próprio teria conduzido parte do grupo para o local. Chafik chegou a confessar o crime para a Justiça. Um quinto réu, Admilson Rodrigues Lima, morreu no decorrer do processo. Testemunhas chegaram a relatar que até hoje os integrantes do acampamento Terra Prometida ainda sofrem ameaças constantes.
Com Agência Brasil e Agência Estado
Atualizada às 23h04