O senhor acha que a vida perdeu um pouco da graça depois de tudo que passou?
Eu fui condenado e fiquei preso por cinco anos e sete meses por uma coisa que eu não fiz. Então a gente perde, sim, um pouco da graça das coisas.
O senhor pode receber uma indenização de R$ 2 milhões. O que pretende fazer com o dinheiro
Eu pretendo comprar uma coisa de algum valor para alugar e ter uma renda. Eu não trabalho mais, recebo aposentadoria. Antes de 1997, eu trabalhava, tinha emprego, estava sempre em atividade. De 1997 para cá, fiquei preso. Mas tudo para Deus tem sua hora, e aconteceu de a menina achar o cara lá no (bairro) Anchieta.
O que o senhor sente quando pensa nisso? Depois de o senhor ter sido condenado tinha esperança de sair?
Tinha vontade de fazer uma investigação. Eu estava até arrumando um detetive de direitos humanos, mas ele disse que eu tinha que pagar dois salários mínimos, e eu não consegui o dinheiro. Então segui preso até que Deus atendeu minhas orações, aquela menina achou o Pedro (Meyer). Que milagre! Porque se ela muda para outra cidade ou outro bairro, ela não ia achar ele.
Quem contou para o senhor que o verdadeiro responsável pelos crimes havia sido achado?
Foi meu primo. Ele viu uma reportagem que falava de 1997, do (bairro) Cidade Nova. Aí eles foram olhar, e era o Pedro Meyer que tinha estuprado a menina. Senti muito alívio porque a própria vítima o encontrou. Foi bom que tirou da rua aquele marginal, aquele cascavel. Um monstro, né?
E o dinheiro vai diminuir o sofrimento que o senhor passou?
Vai me ajudar, mas não vou esquecer o que eu passei nunca mais. O advogado é que não levou minha defesa. Ele e um irmão meu, que é sargento da polícia, “armaram uma casinha” para mim. Meu irmão é igual o Caim, que matou o Abel por inveja. Imagine: você tem um irmão policial, sabe que você foi acusado injustamente e não faz nada para te defender?
O que senhor perdeu de mais importante neste tempo que ficou preso?
Perdi muita coisa. Se eu estivesse trabalhando durante esse tempo, não estaria com a mente tão cansada. Deixei minhas filhas. E a minha esposa. Enquanto eu estava preso, ela ia lá na cadeia, levava minhas filhas. Mas, quando eu cheguei em casa, em 29 de novembro de 2012, ela foi embora. E minha mãe adoeceu comigo fora de casa.
Como foram os tempos da cadeia?
Tive um acidente lá, com preso tentando me matar. Eu estava do lado de fora do alojamento tomando café, para descer para trabalhar. O rapaz falou assim: “Ô seu Paulo, vamos lá em cima abrir a água, porque a cadeia está sem água. E lá em cima tinha uma nascente. Aí, eu fui mais ele. Chegou lá, ele pulou e me deu um gogó (gravata). Ele enfiou um espeto em mim, no ombro. Me levaram para o hospital, fiquei entre a vida e a morte.
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E como foi a prisão?
Quando eles foram lá no (bairro) Cidade Nova, atrás do Pedro Meyer, me levaram para a delegacia. Tinha trabalhado a noite toda, estava cansado. Fui lá para a delegacia e caí no alpendre, destronquei o pé. Mas no dia 2 de abril, quando estava aqui em casa, vem a polícia e me pega, alegando que ia me levar para o pronto-socorro por causa do pé. Eles não levaram para lá nada, levaram foi para o DI (Departamento de Investigações). Eu fiquei preso.
E o que o senhor sente quando pensa nisso?
Uma revolta muito grande. Porque a gente se sente assim com qualquer coisa que acontece na vida da gente que não é nossa culpa. Imagina uma coisa dessas, uma condenação injusta, de um crime de estupro. Fiquei preso por causa de um marginal daqueles.
Qual é o sentimento do senhor com relação a essas moças que foram violentadas e ajudaram a condená-lo.
Tenho muita pena. Não tenho nada contra elas, inclusive essa que reconheceu o Pedro Meyer 15 anos depois. Eu até queria conhecer ela e agradecer por ela ter reconhecido ele.
O que o senhor pensa da Justiça no Brasil?
Não vou dizer que a Justiça errou. O que aconteceu foi triste porque não fizeram investigação procurando os criminosos, e eu, inocente, fui para a cadeia. Mas eu não culpo o juiz nem a polícia. Até porque eles me pediram desculpas depois de tudo o que aconteceu. Eu tinha vontade é que chegassem pra mim e falassem: “é verdade, o que o senhor está falando é verdade”.