Motivados principalmente pela falta de recursos para arcar com os altos custos de um aluguel, dezenas de famílias encontraram abrigo em um terreno às margens do Anel Rodoviário, no bairro das Indústrias, na região Oeste de Belo Horizonte. Com o projeto de reforma da rodovia em andamento, que prevê intervenções em toda a extensão do Anel, a Vila Esperança se cria na contramão de uma série de remoções planejadas para a região, já que, para que as obras aconteçam, milhares de famílias terão que ser retiradas dos terrenos que cercam a via.
Mesmo assim, a nova ocupação, que começou a receber os primeiros moradores há cerca de um ano, parece aumentar a cada dia. “O número de construções aumentou bastante nos últimos meses”, diz a líder comunitária Diana Vitória Herculano Almeida, 20. Ela conta que atualmente existem 60 famílias no local. A maioria das casas é de madeira, com pequenos cômodos, com uma média de quatro pessoas por família.
Os moradores convivem com a falta de água encanada, rede elétrica e esgoto. Apesar de as casas serem numeradas, o correio também não chega ali. Boa parte dos moradores veio de bairros vizinhos e sabe dos riscos de se estabelecer em um local de trânsito intenso de caminhões e carretas, mas alega não ter outra alternativa. “Morava no bairro Vista Alegre, mas não tínhamos mais como pagar o aluguel. Tenho quatro filhos e, com o salário do meu marido, não dava para pagar as contas. A gente vive do jeito que dá”, conta a dona de casa Ana Paula Santos, 35.
Segundo ela, os moradores se ajudam e recebem doações de tempos em tempos. “Não estamos aqui por gosto, mas queremos a dignidade de ter um teto. Com o meu salário, não consigo pagar um aluguel, mas não posso deixar meus filhos morando embaixo de um viaduto”, comenta um morador de 25 anos, que não quis ser identificado.
Respostas. A Vila Esperança vive hoje um limbo de responsabilidade. A comunidade fica às margens do trecho do Anel Rodoviário que está sob concessão da Via 040. Mas, em nota, a concessionária informou que atuou na retirada de parte das edificações irregulares das novas ocupações em 10 de junho, junto com a prefeitura da capital. Porém, como a administração municipal comprovou ser proprietária do terreno, a concessionária diz não ter mais responsabilidade sobre o local.
Já a Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (Urbel) afirmou que fez o cadastro de algumas famílias, mas as remoções não foram realizadas, já que passaram a ser responsabilidade da Justiça Federal. A prefeitura informou que uma liminar expedida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais em 25 de junho determinou que o município “se abstenha de realizar intervenções no trecho referido, próximo ao pontilhão da linha férrea, inclusive a demolição das edificações”.
De acordo com a Justiça Federal, a Vila Esperança não faz parte da ação que ela tem feito com as outras comunidades do Anel, já que estão sendo atendidos apenas moradores que foram cadastrados até dezembro de 2012. Para a Justiça, como trecho faz parte da concessão da BR– 040, a responsabilidade estaria a cargo da concessionária.
Prevenção
Fiscalização. A Polícia Rodoviária Federal informou que realiza policiamento constante na BR–381 a fim de impedir novas ocupações e que comunica o Dnit sobre os infratores.
Relembre
Histórico. Em 2012, a Justiça Federal firmou um termo de compromisso com os governos estadual e federal para a reforma do Anel Rodoviário. Foi estabelecida a conclusão do projeto executivo da obra até outubro de 2013.
Novo prazo. Como o projeto não foi finalizado, uma nova reunião no dia 13 de agosto deste ano estabeleceu novas datas.
Projeto. Em setembro, o governo de Minas entregou ao Dnit o projeto funcional da reforma, com as primeiras diretrizes da obra e que deve ser aprovado até 6 de novembro. Depois, o DER-MG terá até o dia 31 de agosto de 2016 para finalizar o anteprojeto.
Modelo. A licitação será feita por meio do Regime Diferenciado de Contratação (RDC), considerado mais rápido do que a Lei de Licitações por permitir que várias etapas de uma obra sejam contratadas com uma única empresa.
Justiça administra as remoções
A ocupação irregular das mais de 4.000 famílias ao longo do Anel Rodoviário é, atualmente, responsabilidade do Programa Judicial de Conciliação para Remoção e Reassentamento Humanizados de Famílias do Anel Rodoviário e BR–381, criado pela Justiça Federal em parceria com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) em 2013. De acordo com a assessoria de imprensa da Justiça Federal, eles atuam antes das remoções, preparando as famílias para a saída, durante as retiradas e também no processo após a remoção.
Segundo a equipe responsável, as novas famílias que estão chegando a essas comunidades não terão acesso à indenização, que é apenas para pessoas que foram cadastradas em 2012.
A Justiça destacou que centenas de audiências de conciliação já foram feitas com moradores. Por se encontrarem em situação de risco maior, 64 famílias já tiveram de ser retiradas do Anel. Elas estão recebendo o aluguel social, que varia de R$ 500 a R$ 900.
Após a conclusão do processo de conciliação, todas as famílias deverão escolher entre três opções de reassentamento – indenização pelo valor do imóvel e pelas melhorias feitas nele, compra de outro imóvel no valor máximo de R$ 40 mil ou nova unidade habitacional por meio do programa Minha Casa, Minha Vida.
Conforme o Dnit, peritos judiciais são responsáveis pelo acompanhamento de todos os moradores e pela garantia dos direitos sociais da população atendida. O departamento informou ainda que é o responsável também pela prospecção e aquisição de áreas e terrenos para a construção de novas moradias.