“Uma boa cidade não é aquela onde os pobres andam de carro, mas sim onde até os mais ricos usam o transporte público.” Se a máxima do ex-prefeito de Bogotá (Colômbia) Enrique Peñalosa estiver correta, Belo Horizonte não é uma metrópole com qualidade de vida. Pelo contrário, está no caminho inverso. De 2002 para 2012, o percentual de viagens feitas de ônibus ou metrô dos moradores de alta renda caiu de 27,5% para 12,4% – uma redução de 54,9%. Entre os motivos desse recuo estão a falta de investimentos na melhoria dos coletivos e a existência de uma política econômica de incentivo à venda de automóveis. Para reverter esse quadro, a prefeitura aposta no desestímulo ao uso do transporte individual.
As informações são da Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans), com base na Pesquisa de Origem e Destino, feita em 2012. Elas servem de base para a elaboração e execução do Plano Diretor de Mobilidade Urbana (PlanMob-BH), com previsão de ações até 2020.
A região que menos usa o transporte coletivo é a Savassi, onde 9,6% das viagens feitas pelos residentes da área são de ônibus ou metrô. Em 2002, esse índice era quase cinco vezes maior, e o transporte público representava 47% das viagens. Depois da Savassi, o Sion – que compreende também o Mangabeiras, Anchieta, Serra e Santo Antônio – é a que tem menor participação. O índice foi de 33,7% em 2002 para 10,9% em 2012. Já no Buritis, Belvedere, Estoril, Pilar e Olhos D’Água, os deslocamentos em ônibus ou metrô representavam 11% em 2012, contra 38,8% dez anos antes.
Para o especialista em transporte e trânsito Francisco Magalhães, o crescimento econômico criou uma maior circulação de pessoas e um aumento da frota de veículos. Porém, o que mais pesa é a falta de investimentos para melhorar o transporte coletivo. “Não é só por ter carro que a pessoa vai deixar de usar o transporte coletivo. Andar de ônibus é mais barato, mas para atrair o usuário tem que também ser eficiente. Enquanto o ônibus concorrer com o carro nas vias, essa realidade não vai mudar”, explica. Para ele, é preciso uma postura mais ofensiva com a implantação das faixas exclusivas para ônibus.
O arquiteto e urbanista Sérgio Myssior aponta outro fator que contribui para a migração para o transporte individual: o estímulo para a compra de veículos. “O brasileiro tem uma cultura de culto ao carro. O veículo representa mais que um bem material, é um status”.
Prioridade. Com o uso do transporte público em queda livre, a prefeitura tem como plano dar cada vez mais prioridade ao transporte público nos corredores de tráfego, como com a criação do Move. Aliado a isso, o Executivo promete a melhora do serviço.
“O investimento físico em transporte coletivo é muito importante. Tem que ter uma oferta de veículos mais confortáveis. Mas ele sozinho não dá resultado. Tem que vir junto com uma política firme de incentivo a esse modo de viagem. E para isso é preciso criar o desestímulo ao uso do carro particular. A ideia é fazer isso com a redução do espaço para os automóveis”, explicou Marcelo Cintra, coordenador de políticas sustentáveis da BHTrans.
Frota
Crescimento. O número de veículos em Belo Horizonte mais que dobrou entre 2002 e 2012, crescendo 104%. Eram 742.115, e passou para 1.519.438. Atualmente, a frota da capital é de 1.620.801.
Bicicletas
A participação das viagens de bicicleta em Belo Horizonte também caiu de 2002 para 2012. No primeiro levantamento, os ciclistas eram responsáveis por 0,65% dos deslocamentos feitos na capital mineira. Dez anos depois, esse percentual caiu para 0,41%. Os moradores do aglomerado da
Serra são os que mais utilizam a bicicleta como transporte, com 1,3% das viagens. Em seguida, estão os residentes da Pampulha (1%) e de Venda Nova (0,9%).
Planejamento
Faixas exclusivas. Hoje,Belo Horizonte conta com 36 km de pistas destinadas apenas a ônibus. No Plano Diretor de Mobilidade (PlanMob-BH) – lançado em 2013 e com previsão de ações até 2020 –, a BHTrans pretende criar mais 141 km de faixas exclusivas. Entre as áreas que receberiam as faixas, estão as avenidas Cristovão Colombo, na Savassi, e Amazonas (com o Move) e
o Anel Rodoviário.
Ônibus executivo. Belo Horizonte tem hoje duas linhas de ônibus executivo, com tarifas mais caras, mas maior conforto. A ideia é criar mais 11 até 2020.
Viagens
De 2002 para 2012, a população da capital cresceu 7%. O número de viagens feitas na capital, por sua vez, aumentou 67,7%. Em 2002, foram feitas 3,7 milhões de viagens por dia na cidade. Em 2012, esse número passou para 6,3 milhões. A explicação está no aumento da população empregada. Há também uma migração de destinos, explicada pela criação de novos polos, fora do centro. Do total de deslocamentos em 2002, 32,8% tinham como destino a área central. Em 2012, foram 27,5%.