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Sem alternativa, sertanejo sai do campo para o lixão

Seca faz homem desistir da agricultura e partir para a vida em ambiente mais insalubre

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PUBLICADO EM 11/10/13 - 03h00

SERTÃO NORDESTINO. O forte calor em alguns pontos do sertão nordestino beira o insuportável para quem não está acostumado com o clima do semiárido. O sol parece mais forte, e o ambiente aberto da caatinga, com arbustos pequenos, faz com que a proteção contra os raios solares seja mínima.


Em Serra Talhada, importante cidade sertaneja em Pernambuco, em meio à caatinga, há mosquitos de todos os tipos, mau cheiro, fumaça e centenas de urubus. Tudo em meio ao calor provocado por um sol causticante. Não é exagero dizer que aquele cenário, no meio da secura da caatinga, poderia ser pintado como o “inferno nordestino”.


Carcaças de bichos, lixo doméstico e lixo industrial. Tudo estava ali misturado. E, junto com o expurgo da sociedade, estavam algumas dezenas de pessoas. De primeira, Luiz Cipriano de Souza, 61, aparece, solícito, com um sorriso no rosto, querendo saber quem são os forasteiros que chegavam por ali. Morador da zona rural de Serra Talhada (a cidade não está incluída na transposição, mas também sofre com a estiagem prolongada), ele resolveu passar a catar lixo, já que, em sua terrinha, não adianta criar animais nem plantar nada. A seca, evidenciada por três anos sem chuva boa, não deixa.

A solução encontrada pelo homem foi ir para o insalubre lixão da cidade. “Tudo o que eu plantava, morria. Já não dava mais para viver na roça. Acabei vindo para cá para não morrer de fome. Se não fosse assim, não teria meu sustento”, afirma.

Por mês, o homem tira R$ 600 para sustentar a mulher e cinco filhos. Enquanto ele contava sua vida, parecia que os mosquitos – que, a essa altura, já estavam pousados em todas as partes de nossos corpos – nos carregariam. Latinhas, garrafas PET e fios de cobre são os materiais preferidos por Luiz. O papo não pôde ser esticado porque o idoso precisava continuar o trabalho.

Com uma mão recheada de calos, mas com um aperto firme, terno e caloroso, o hoje catador de lixo, outrora agricultor, se despediu.

Não mais que cinco minutos dentro daquele “inferno nordestino” foram suficientes para causar um tremendo mal-estar em mim e no fotógrafo Douglas Magno. O calor, somado ao mau cheiro e aos materiais em decomposição, nos deu um verdadeiro nó no estômago. O simples ato de abrir e fechar as portas do carro de reportagem fez com que ao menos 50 moscas e mosquitos infestassem o veículo.

Pouco antes da saída do chamado “inferno nordestino”, ainda houve tempo de conversar com um funcionário da prefeitura, João Batista da Silva, 43, que está no lixão há 12 anos. Além de coordenar os trabalhos, ele também cata lixo para reforçar a renda. Assim, diz ele, consegue uns R$ 1.200 mensais para gastar com a mulher e o filho. E se considera “quase rico”. “Minha vida ainda é melhor do que a de muita gente que está aqui. Há quem ganhe muito menos levando essa vida que você está vendo aí”, conta, orgulhoso.

A poucos metros do lixão, havia mais um – entre tantos – riacho que secou. Muito possivelmente, se ainda existisse, o curso d’água estaria contaminado, dado que sua proximidade com aquele ambiente não deixaria que o rio sobrevivesse. 

Rádio Super

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