A parceria e a vasta obra de Chico Buarque de Hollanda e Edu Lobo encontraram o circo e o teatro no clássico espetáculo “O Grande Circo Místico”, cuja mais recente montagem se apresenta de hoje a domingo em Belo Horizonte, no Cine Theatro Brasil. Além da trilha sonora composta pelos dois para o espetáculo original, realizado em 1983 pelo diretor Naum Alves de Souza, a montagem atual também se inspira no poema “A Túnica Inconsútil”, de Jorge de Lima.
“Obviamente é muita responsabilidade, mas também um grande estímulo lidar com um material desta potência. O primeiro movimento, aconselhado pelo Naum, foi estudar Jorge de Lima e seu universo poético, ligado às esferas do sagrado. Depois disso, claro, investigamos as músicas, considerando cada letra e seus significados. Daí tecemos nossa trama”, descreve Newton Moreno, dramaturgo responsável pela criação da obra, ao lado de Alessandro Toller.
O trabalho dos dois dramaturgos foi desenvolver narrativas possíveis a partir de tais referências. “Eles criaram um melodrama típico de circo para falar exatamente sobre o circo. O estilo circense não foi somente uma linguagem encontrada para contar a história. O circo, aqui, é a essência, é a história. A guerra, por outro lado, aparece como seu oposto”, analisa o diretor João Fonseca, que dirigiu também musicais sobre Cazuza e Tim Maia.
“Criamos o nosso melodrama da guerra. Melodrama que nos aproxima das peças de circo-teatro, da guerra que estava presente nas preocupações de Jorge de Lima e da poesia, da beleza e da arte, aqui representadas pelo circo. A guerra surge, então, como nosso pior fruto, devastadora filha da surdez e da ambição, como o pior produto da máquina humana”, analisa Toller.
“Costuramos, assim, uma releitura do poema, assumindo a arte circense como protagonista, tecendo um melodrama de circo no qual nosso casal de enamorados e sua trupe lutam contra a barbárie ao apagar as cinzas dos bombardeios”, completa.
Em cena, o grande circo místico deixou de ser apenas uma inspiração para se transformar em um circo real, em que seus atores e cantores precisam manipular e demonstrar habilidades circenses. “A identidade dessa dramaturgia foi sendo composta com sopros de imagens circenses. Imaginávamos possíveis números de circo – malabarismo com granadas, equilíbrio num arame farpado – que se relacionariam ao nosso melodrama, e, muitas vezes, essas imagens, junto às canções, orientavam a construção de cenas”, exemplifica o dramaturgo.
“Quando o João (Fonseca) e os atores arquitetaram a linguagem cênica do espetáculo, percebemos que circo, interpretação, texto, música e coreografia tornavam-se discursos complementares sob uma mesma lona poética”.
Música E dramaturgia. Era de se esperar que Chico Buarque fosse a grande inspiração quando o diretor e os dramaturgos selecionassem a trilha sonora do musical, porém, para além das melodias das músicas, os artistas resolveram assumir sua potência narrativa. “O mais difícil foi fazer com que as músicas, todas lindas e muito complexas, tivessem função dramática. Elas aparecem na dramaturgia de forma orgânica, complementando o texto falado. Escolhemos músicas compostas para outras obras que se encaixaram perfeitamente em nosso espetáculo”, adianta o diretor.
“Um de nossos principais objetivos (junto ao João e ao Ernani Maletta, diretor musical) era construir uma relação narrativa legítima entre texto e canções, torná-los interdependentes. As músicas, nesse sentido, também narram, revelam sentimentos e pensamentos dos personagens, impulsionam a história. Não são meros números musicais, são dramaturgia”, finaliza Moreno.
Agenda
O quê. “O Grande Circo Místico”
Quando. Hoje, às 21h, amanhã, às 20h, e domingo, às 19h
Onde. Cine Theatro Brasil (rua dos Carijós, 258, centro)
Quanto. Entre R$ 100 e R$ 150 (inteira)