Rolezinhos que reúnem artistas e pessoas em torno da discussão sobre as temáticas negras têm servido de mote para a criação de “ROLEZINHOS – Nome Provisório”, trabalho que vem sendo desenvolvido por Alexandre de Sena para o Festival de Cenas Curtas do Galpão Cine Horto. “Ainda estamos pensando no formato da apresentação, mas a nossa mensagem já está definida. A gente precisa deixar claro para as pessoas que precisamos rever a presença do negro na sociedade porque a tendência é que essa exclusão seja desconsiderada, tomada como um processo natural. As discussões são muitas, mas nós estamos fazendo isso a partir de uma arte que pense as formas do negro se representar, que fale sobre suas vivências”, conta o ator.
O trabalho tem também como deflagrador as discussões sobre o teatro negro. “Os rolezinhos são formas de pensar a construção desse teatro contemporâneo, qual nosso modo de ensaiar e de escolher os temas que serão abordados. A gente tenta falar sobre o que vive e o que deseja de mudança. Normalmente, encontramos poucos espaços de expressão para expor nossos trabalhos e, quando encontramos, gritamos todo o peso histórico do que é ser negro. Com os rolezinhos, além disso, a gente tem se preocupado também com uma construção estética, com a uma linguagem própria desenvolvida a partir de artistas negros”, explica. “Mas é importante também pensar que muita gente, antes de nós, já deu início a essa questão, como Abdias Nascimento, nos anos 1960, Gil Amâncio e Rui Moreira, mais recentemente. Essa luta não é nova, vem se fortalecendo e ganhando espaços de reflexão”.
Para Aline Vila Real, produtora cultural, o viés artístico da proposta é um diferencial dos rolezinhos. “As discussões sobre a negritude têm ganhado mais espaço na cidade. Mas a ideia de reunir pessoas que se identifiquem com a proposta de se encontrar em espaços públicos, pensar a experiência da negritude na cidade e amarrar as nossas conversas de forma artística abre outras formas de posicionamento”, afirma.
Mulheres. As temáticas dos encontros são muitas, mas, para Aline, um assunto torna-se recorrente. “O fato de a maioria das pessoas que participam dos encontros ser do sexo feminino acaba trazendo à tona as discussões sobre a mulher negra na sociedade. E o que temos sentido é que as negras têm buscado se colocar cada vez mais. Somos mulheres de realidades e experiências diferentes, mas com uma necessidade grande de conversar sobre a especificidade de ser mulher dentro desse grupo de pessoas negras. Há um desejo de protagonismo, tanto na sociedade como na arte que cada uma desenvolve”.
Mas, como um grupo heterogêneo, a preocupação é que as discussões virem um tema para todos, como proposto em um dos rolezinhos provocados por Aline ao lado da atriz Soraya Martins. “Pensamos em um estudo que resgatasse a memória de artistas negros e negras no Brasil. Quando a gente pensa os artistas negros, sente falta de conhecimento de um legado artístico. Alguns reclamam que essas pessoas não são lembradas nos cursos de artes cênicas, por exemplo, outras falam que nós temos que buscar essas referências. Pensando nisso, queremos estudar a história de vida dessas pessoas, mesclando com as nossas próprias vidas, fazer uma apresentação sobre esses artistas falando deles em primeira pessoa, apresentar essas histórias através de nós”, explica Aline, que escolheu Clementina de Jesus como a artista que irá representar.
“Passamos por uma colonização do corpo e do pensamento que é cruel e, quando começamos a pensar sobre isso, passamos a adotar opções ativistas. Soltar o cabelo crespo ou usar roupas coloridas inspiradas em motivos afro é lugar de resistência. A gente não vai conseguir tocar em todas essas formas de luta, mas a própria presença dos corpos negros em cena, cada qual com suas particularidades, já é uma grande abertura para reflexão”, diz Alexandre.
Afinal, como afirma o artista, o título da cena “ROLEZINHO – Nome Provisório” não é aleatório. “A gente não quer mais dar rolê. A gente quer visibilidade e reconhecimento”, conclui.