Sétima arte

Musa de Almodóvar estrela 'Veneza', segundo filme de Miguel Falabella

A produção estreia inicialmente nos cinemas, portanto, a capital mineira vai ter que esperar mais um pouco

Por Patrícia Cassese
Publicado em 16 de junho de 2021 | 18:32
 
 
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Na entrevista coletiva (e online) de apresentação do filme "Veneza", que estreia nesta quinta-feira nas salas de cinemas de várias cidades do Brasil - infelizmente a capital mineira fica de fora no momento, em função das restrições por conta da pandemia -, a emoção deu a tônica. O primeiro a não segurar as lágrimas foi Eduardo Moscovis - a ponto de sua colega de set, Dira Paes, ter que que entrar em cena para tomar a palavra até que ele conseguisse se recompor. Na sequência, Carol Castro e Danielle Winits, que também estão no elenco do novo filme dirigido por Miguel Falabella, não se preocuparam em disfarçar a emoção por realizar um projeto que, na verdade, é a concretização de um sonho acalentado pelo loiro há cerca de 20 anos. 

Toda essa história, que agora ganha o écran, começou, na verdade, quando Falabella assistiu a uma montagem do texto original do argentino Jorge Accame em Buenos Aires. Encantado, foi buscar o aval do dramaturgo diletante (na verdade, sua profissão primeira é professor de Letras) para adquirir os direitos, e, com o consentimento deste, que hoje mora em San Salvador de Jujuy, fez a sua própria versão para a peça - a estreia aconteceu em 2003, com Laura Cardoso, Arlete Salles, Ewerton de Castro, Débora Olivieri, Juliana Baroni e Jarbas Homem de Mello no elenco - que, ressalte-se, depois sofreu várias mudanças.

Sucesso de público, a iniciativa chegou a ser encenada até em Lisboa. Desde então, a vontade de adaptar para o cinema a história de Gringa, a agora idosa dona de um bordel que não quer morrer antes de viajar até Veneza, onde pretende pedir perdão ao antigo amante, que abandonou décadas atrás; ficou ali, latente. Como o próprio Falabella assumiu, em uma postagem no Instagram, citada na entrevista coletiva pela mediadora, "ficou guardada em papel de seda".

Em 2018 veio finalmente a possibilidade de concretizar o projeto - e aí, quem acabou assumindo as vestes da Gringa foi ninguém menos que a veterana Carmen Maura, conhecida por seu trabalho contumaz com o diretor espanhol Pedro Almodóvar, de quem pode se considerar diva: marca presença em filme como “Mulheres à beira de um ataque de nervos”, “Volver”, "Pepi, Luci e Bom", "A Lei do Desejo"... Além dos nomes já citados, a coletiva contou com a presença de Dira Paes, Roney Vilela e Caio Manhente. Carmen Maura deu o ar da graça apenas em uma mensagem gravada.

No evento, que surpreendeu pela quantidade de jornalistas, sejam dos chamados grandes veículos quanto dos diversos sites que se debruçam hoje sobre entretenimento, arte e, em particular, a sétima arte; Falabella ressaltou a concretização de um segundo sonho: trabalhar com Dira Paes, que interpreta a personagem Rita, e com Du Moscovis, o Tonho. "A Carol (Castro, a quem ele também nunca havia dirigido) chegou depois, mas no momento que pensei nela fazendo Madalena, tudo se fechou", contou.

Tranquilas, as filmagens não foram. Até uma tormenta elétrica, que danificou severamente a estrutura do circo real onde muitas cenas se passam, a equipe enfrentou com galhardia. E se a atriz pensada por ele inicialmente para viver a Gringa - a divina Norma Aleandro, 85, de "A História Oficial" e "O Filho da Noiva" - não pode assentir ao convite, Carmen Maura, 75, sugerida inclusive pela colega argentina, acabou descobrindo que não poderia filmar no Brasil por conta de não ser aconselhável, à sua faixa etária, receber a vacina contra a febre amarela, necessária para visitantes. A solução foi filmar no Uruguai. 

Mas sim, tudo valeu a pena. No circuito de festivais, "Veneza" já faturou prêmios importantes. Levou os Kikitos de melhor direção de arte (Tulé Peake) e melhor atriz coadjuvante (Carol Castro) no Festival de Gramado de 2019, a Lente de Cristal de melhor roteiro (Miguel Falabella) no 23º Festival de Cinema Brasileiro de Miami (Inffinito Film Festival), e recebeu quatro troféus no Los Angeles Brazilian Film Festival: melhor direção de fotografia (Gustavo Hadba), melhor ator (Eduardo Moscovis), ator coadjuvante (André Mattos) e atriz coadjuvante (Carol Castro).

Segunda a falar na coletiva, Dira Paes ressaltou a relação de sua personagem, a prostituta Rita, com a cafetina Gringa, a qual, diz, a moça reconhece os vários defeitos, mas sem deixar de enxergar, ali, a generosidade. "E isso é muito tocante. Ao acolher pessoas no momento que mais precisavam, (Gringa) fez com que todos se sentissem devendo algo". A atriz também enfatizou a constatação de que, muitas vezes, para realizar um sonho, o ser humano precisa do suporte de uma outra pessoa, geralmente, alguém que pertence à sua rede de afetos. "Na verdade, o filme tem muitas entrelinhas. Fala de coisas que são pertinentes neste momento, fala da sensação de pertencimento, da segurança, a questão da raiz. Ali, há um grupo de pessoas que se ajudam, é uma comunidade".

Eduardo Moscovis citou a curiosidade de ter assistido à peça teatral. "Geralmente, não tenho uma boa memória, mas me lembro muito bem de Dona Laura (Cardoso, no papel de Gringa), linda". Ele confessa que, ao receber o convite para incorporar o elenco, não deixou de sentir um certo receio. "Sempre quando a gente vai fazer uma adaptação (do teatro parao cinema) existe isso, porque a gente sabe que os códigos artísticos são outros". 

Foi momentos depois que Moscovis chegou às lágrimas. Ao falar sobre sonhos, ele se emocionou ao constatar o quanto os artistas, nos tempos atuais, estão sendo massacrados, com acusações não procedentes de enriquecimento via leis e que tais. “A gente está sendo tão massacrado. (Ser artista) é muito diferente do que uma extrema de ódio acredita, a gente não tem uma vida boa! A gente não tem dinheiro sobrando, não rouba o dinheiro de ninguém. A gente é muito honrado, trabalha muito", disse, com o rosto congestionado.

E prosseguiu: "Ver a união dos atores, dessa equipe toda, seja nas filmagens no Uruguai, no Brasil, na Itália... Nós estávamos vivendo os nossos sonhos ali. Falar de Veneza agora, agora, neste momento, é muito potente, e, desculpa, me sinto fragilizado". Já Carol Castro, também em lágrimas, se lembrou que o filme marcou a sua volta aos sets após dar a luz à filha Nina, hoje com três anos. Moscovis a interrompeu lembrando o quanto a colega estava linda, naquele momento de vivência plena da maternidade.

Em tempo: esta é a segunda vez que Miguel Falabella se aventura na direção - anteriormente, regeu "Polaróides Urbanas" (2008)
 

"Veneza" - Miguel Falabella
Com: Carmen Maura, Eduardo Moscovis, Dira Paes, Danielle Winits, Carol Castro, André Mattos, Macarena García, Maria Eduarda de Carvalho, Georgina Barbarossa, Magno Bandarz, Carolina Virguez, Roney Villela, Giovanni Venturini, Pia Manfroni, Caio Manhente e outros.
Brasil, 2019
Drama
91 minutos
Classificação: 16 anos

 

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