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'Mulher deve votar em mulher', diz pesquisadora de gênero

Em 2014, apenas 10% das candidatas foram eleitas; segundo especilalista, eleitor não vota porque falta visibilidade para elas

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PUBLICADO EM 31/07/16 - 03h00

As candidatas que pretendem disputar cargos de prefeita e vereadora em Belo Horizonte poderão contar com um novo espaço para garantir mais visibilidade à ala feminina nestas eleições. Feminista atuante, Polianna Santos é membro do movimento Mais Mulheres no Direito, que pretende criar um site exclusivo com informações sobre candidatas.

“Estamos tentando uma parceria com a UFMG para fazer essa divulgação só das mulheres que disputarão o pleito. Queremos ampliar o espaço e promover debates entre elas. Caso contrário, nós não as veremos”, explicou. Em função dos prazos legais, somente depois de 16 de agosto será possível formalizar a parceria e promover os debates. Até lá, a página no Facebook Mulheres na Política informa sobre eleições, participação e dados. “Mulher deve votar em mulher”, defende Polianna.

Em 2012, dos 1.302 candidatos a prefeito, vice-prefeito e vereador, 401 eram mulheres (30%), segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No entanto, desse universo, apenas a vereadora Elaine Matozinhos (PTB) foi eleita. “Neste ano, o partido terá 19 candidatas à Câmara, incluindo minha disputa pela reeleição. Espero que tenhamos uma bancada feminina na Casa”, informou a única parlamentar. Segundo ela, o PTB possui estrutura sólida voltada à mulher e promove encontros para incentivar e orientar candidatas sobre dificuldades nas eleições.

A diferença brutal entre as mulheres que se candidatam e as que se elegem mostra que a visibilidade das candidaturas femininas é quase nula. Levantamento feito por Polianna Santos mostra que 6% das candidatas foram eleitas no país em 1990. Em 2014, 10% das mulheres venceram as eleições. Em 24 anos, o índice de mulheres eleitas subiu apenas 4%. “A mulher acaba sendo subjugada tanto nos partidos de direita quanto nos da esquerda”, pontuou.

Sem nunca ter tido uma mulher à frente do Executivo municipal, Belo Horizonte terá apenas duas mulheres – Jô Moraes (PCdoB) e Maria da Consolação (PSOL) – na disputa pela prefeitura em 2016.

Polianna Santos
Pesquisadora de gênero, teoria democrática e participação
Assessora jurídica da Procuradoria Regional Eleitoral

FOTO: Pedro Gontijo
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Para a especialista, as mulheres são prejudicadas no cenário político até mesmo dentro de seus próprios partidos. Por isso, defende que as siglas sejam ativas na luta pela visibilidade feminina, destacando que a falta de representatividade interfere na qualidade da democracia.

Como explicar a baixa presença de mulheres no parlamento, sendo elas a maioria do eleitorado?

Nós não conhecemos as mulheres candidatas. Pesquisas mostram que eleitores não deixam de votar em mulher só por ela ser mulher, mas porque não a veem. Se não a conhecem, como vão conhecer sua plataforma? Claro que já existem muitas mulheres na política, mas elas não têm espaço. E, muitas vezes, o próprio partido não lhes dá espaço. Não tem espaço no programa eleitoral porque é o partido que escolhe como distribuí-lo. A mulher fica prejudicada e tem menos dinheiro de todas as formas.

A nova lei estabeleceu um teto de 15% do fundo partidário para financiar a promoção de mulheres. Como vê isso?

Desde a lei de 2009, há um percentual mínimo de 5% para a divulgação da política feminina. O que a Lei 13.965/2015 fez foi manter o percentual mínimo e criar um teto de 15%, que não se explica. Se o partido deve ter 30% de candidatas, por que o máximo destinado a elas é de apenas 15%? É um percentual muito baixo.

Esse teto seria visto como retrocesso?

Não diria um retrocesso absoluto porque quase nenhum partido respeitava os 5%, apenas formalmente, na prestação de contas. Já cansei de ouvir mulheres de partidos políticos falando da dificuldade em organizar espaços de debates, palestras. Para ter uma reunião sobre participação das mulheres, o partido precisa alugar um espaço, um hotel, e a verba é limitada. Elas chegam a cobrar os recursos, mas nem sempre são atendidas.

Há desinteresse dos partidos em divulgar as mulheres?

Há essa dificuldade, mas há também falta de interesse porque não existe vácuo de poder na política. Não existe um espaço guardado para a mulher, por isso ela vai ter que tirar alguém de lá, e os homens não querem ser tirados. Isso é fato. Vai ter de ser utilizada a força, mas força legal, porque a mudança cultural pode vir a acontecer, mas demora, e temos pressa. É preciso explicar como a falta da mulher na política interfere na qualidade de uma democracia.

Como se dá essa interferência?

Discutir um tema com um monte de gente igual não é uma discussão, é um aceite. Quando um ministério ou uma Câmara Legislativa são compostos por pessoas de um mesmo perfil – homens, brancos, de meia-idade, com uma renda X –, você não está discutindo, está ratificando. Para discutir e debater, é preciso ter gente diferente. A mulher, nesse ponto, vai ser um pouco diferente. Não que a mulher vá entrar ali, revolucionar a política fazer tudo diferente. Ela pode até fazer a mesma coisa que um homem, mas precisa entrar, porque é o espaço dela de direito, já que somos maioria.

É mais importante eleger mulheres para desenvolver políticas específicas ou só para ter representatividade?

Hoje, acho que ter representatividade é mais importante, porque, na teoria do reconhecimento, uma das formas que desenvolvo o que eu sou, como é minha visão de mim mesma, diz respeito a como o outro me vê. Se o outro me vê e me trata como dona de casa, para procriar e cuidar da família, acabo aceitando e desenvolvendo isso. Enquanto aquele espaço for só de homem e isso continuar sendo difundido, não haverá mudança.

Sem uma lei favorável, como aumentar a representatividade no curto prazo?

Eu levanto a bandeira de que mulher deve votar em mulher. Tenho várias propostas para aumentar a participação da mulher na política, mas todas pouco viáveis porque quem faz a lei no país é o homem. Se hoje eu pudesse apresentar uma campanha, uma coisa que a gente mesma pudesse fazer para começar a mudar isso, seria votar em mulher. Conhecer as candidatas, pelo menos. Procure conhecê-las porque o partido não vai deixar que elas apareçam, não vai haver dinheiro para elas. Então, procure saber quem elas são, provavelmente você vai encontrar alguém com quem se identifique.

Qual proposta existe para ampliar a inclusão da mulher no sistema político?

Foi aprovada no Senado a proposta de reserva de cadeiras, assim como funciona o sistema de cotas para negros. A lógica é a mesma. Só que o projeto aprovado iria gerar resultado nas eleições proporcionais, que não é o formato da eleição no Senado. Então, é fazer graça com o chapéu alheio. É muito fácil o Senado aprovar isso, porque não o afeta, mas afeta outras Casas. Acho, seriamente, que o projeto não passa na Câmara dos Deputados, porque a afeta. Gosto da ideia de reserva de cadeira, mas tenho plena consciência de que é polêmica, porque implica em uma pessoa que teve menos voto nominal ser eleita.

Qual é a proposta mais viável?

Há pouco tempo, ouvi uma proposta maravilhosa que já existe em outros países e acho que teria muita aceitabilidade. Sugere incluir outro filtro de distribuição do fundo partidário: metade seria distribuído igualitário e a outra metade consideraria a representação do partido e o percentual de mulheres da legenda. Só aí o partido vai querer eleger mulheres. É muito cruel falar que mulher não é eleita porque mulher não vota em mulher. A culpa continua sendo nossa. A mulher não é eleita porque não recebe dinheiro, porque não tem propaganda eleitoral, não tem visibilidade.

Como vê o polêmico Partido da Mulher Brasileira?

Acho que se aproveitaram de um tema da onda. Não tem como negar que o feminismo, os coletivos de mulheres, estão conquistando um espaço. É algo que eles se utilizaram como termo, exatamente pelo fato de não haver mulher alguma. Até dentro de uma legenda que se autodenomina “da mulher brasileira” há preconceito e um desconhecimento do que é o feminismo. O estatuto pouco ou nada fala sobre a mulher. Então, essa sigla pouco ou nada significa.

O processo de cassação contra Dilma Rousseff seria o mesmo se fosse um homem em seu lugar?

Tendo agido certo ou errado, ela sofreu críticas e ataques ferrenhos pelo simples fato de ser mulher. Aqueles adesivos nos carros, aquilo é violência de gênero. E cansei de ouvir gente dizendo que nunca mais vota em mulher. Não estou nem dizendo que ela não tenha cometido irregularidades, mas que a crítica é muito mais contundente quando se trata de uma mulher. (AD) 

Rádio Super

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