Diante dos mais de 20 mil casos confirmados e suspeitos de dengue somente em Minas Gerais neste ano, surge nas redes sociais, a cada dia, uma nova promessa de “receita” para combater o Aedes aegypti – mosquito vetor também de outras doenças, como zika e chikungunya. A última novidade é atribuída ao própolis. Textos veiculados na internet, que levam o nome do biólogo e apiterapeuta Gilvan Barbosa Gama, orientam a ingestão de “algumas gotas diárias (do extrato) para que o mosquito nem se aproxime”. As mensagens que mais circulam são de 2008 e de 1993.
No texto, que surge quase sempre em blogs, o biólogo explica que o própolis, quando ingerido, exala pelo suor dois princípios ativos, flavona e vitamina B, que repelem os insetos. A mensagem ainda orienta o consumo de diferentes quantidades do extrato para adultos e crianças, tanto para prevenção quanto para tratamento da dengue instalada.
Para evitar a doença, adultos deveriam tomar “de 30 a 40 gotas diluídas em água (ausente de cloro). Um copo (da solução) a cada seis horas”, orienta o texto. No tratamento da dengue, a prescrição muda: “Tomar 7,5 ml do extrato de própolis diluído em água (sem cloro). Meio copo na crise febril e, a partir daí, repetir essa mesma dosagem mais três vezes, a cada duas horas”.
Ressalvas. Entretanto, apesar de achar “possível” que o própolis possa mesmo afastar o mosquito, o professor David de Jong, do Laboratório de Abelhas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo de Ribeirão Preto, suspeita da ausência de respaldo científico da “receita” contra a dengue.
“Seria preciso analisar as evidências para opinar. Esse pesquisador não tem Currículo Lattes, e não sei a qual instituição ele pertence. Tampouco acho publicações dele sobre qualquer assunto”, contesta. De Jong disse ainda que não encontrou qualquer estudo da USP ou de outro órgão nacional ou internacional que confirme a hipótese.
O texto sobre o uso de própolis contra a dengue cita Gama como um dos pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), mas a instituição não atendeu as ligações da reportagem.
Para o professor da USP, em princípio, não haveria problema tomar o própolis nessas condições, mas ele acredita que algumas pessoas podem desenvolver alergias, embora ele nunca tenha visto esse tipo de situação. “No Brasil, o própolis é bastante usado para problemas respiratórios e de dor de garganta, mesmo sem registro como medicamento. Em outros países, como o Japão, ele é utilizado para vários problemas de saúde, incluindo câncer”.
Como é divulgado o “tratamento”
- O própolis, quando ingerido, faz o corpo exalar dois princípios ativos (flavona e vitamina B) que repelem os insetos. Nas “receitas”, o extrato deve ser diluído em água sem cloro.
Contra os mosquitos
- Adultos: de 30 a 40 gotas diluídas. Um copo a cada 6 horas.
- Crianças de 0 a 10 anos: O número de gotas corresponde à metade do peso corporal. Contra a dengue instalada
- Adultos: ingerir 7,5ml do extrato diluído. Meio copo em caso de febre elevada. Repetir a dosagem três vezes, a cada 2 horas.
- Crianças de 0 a 3 anos: 1,5 ml do extrato diluído em caso de febre severa. Repetir três vezes, a cada 2 horas.
- Crianças de 3 a 6 anos:
3 ml do extrato diluído em caso de febre severa. Repetir três vezes, a cada 2 horas.
- Crianças de 6 a 10 anos:
5 ml do extrato em caso de febre severa. Repetir três vezes, a cada 2 horas.
Atenção!
O biólogo Gilvan Barbosa alerta sobre a necessidade de teste alérgico. “É muito rara essa sensibilidade, mas pode ocorrer. A água sem cloro pode ser trocada pela água de coco, Excelente pedida”.
Índia faz uso há mais de 6.000 anos
O própolis poderia combater qualquer microrganismo nocivo ao corpo, segundo o apiterapeuta e educador alimentar José Luiz Vazquez. “Ele inibe o crescimento de vírus, bactérias, protozoários e fungos, pois neutraliza o pH do sangue, e nenhum microrganismo patogênico procria em pH neutro”. O extrato teria que ser concentrado a 30%, sem álcool e ingerido em altas doses.
Há ainda estudos sobre o própolis contra a malária, diz Vazquez. “A medicina indiana usa o própolis para fazer procedimentos de lavagem intestinal há mais de 6.000 anos”, destaca.
Composto natural trata os sintomas
O único registro de que se tem notícia de remédio homeopático vendido para tratar os sintomas da dengue, e aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), é um composto criado pelo homeopata e professor Renan Marino, da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, em São Paulo.
A fórmula do medicamento, aceito em 2009, contém três substâncias: eupatório (Eupatorium perfolatium) – planta medicinal com ação analgésica que age nas dores no corpo típicas da dengue –, fósforo – mineral que protege as funções hepáticas, normalmente comprometidas pelo vírus, além de reduzir náuseas e vômitos – e um preparado do veneno de uma espécie de cascavel (Crotalus horridus), que tem forte ação anti-hemorrágica.
A patente do remédio foi cedida por Marino ao Laboratório Homeopático Almeida Prado, que, desde então, o comercializa com o nome de Proden. O medicamento é vendido pelo site da instituição por R$ 32,19, em caixas com 30 comprimidos. Ele atenua a intensidade e a duração de sintomas, como cansaço, desânimo, indisposição, dor de cabeça, dor muscular, náuseas e febre.