Arthur Brown, de 16 anos, estuda em uma escola secundária em Chicago. Enquanto seus companheiros sonham em passar as férias no centro comercial local, esse simples ritual adolescente é um caminho cheio de obstáculos para o jovem americano.
"Calculamos o momento certo de sair, e rezamos para não termos que ir ao banheiro em um lugar público", explica Brown, um adolescente transgênero: nasceu mulher, mas se identifica como um homem.
Para as pessoas transgênero, as soluções improvisadas para contornar a falta de acesso a banheiros públicos estão provocando debates sobre direitos básicos.
Em muitas escolas públicas americanas as discussões -e os esforços para integrar os jovens transgênero- são anteriores às amargas polêmicas que ocupam páginas e mais páginas dos jornais na Carolina do Norte e em outros lugares.
Para evitar utilizar os banheiros públicos específicos para cada gênero, as pessoas transgênero apelam a diferentes estratégias, incluindo não comer nem beber quando estão em público, ou informar-se sobre os lugares onde há banheiros mistos. Mas ainda no melhor dos casos, não são soluções ideais.
"Vemos muito mais casos de infecções da bexiga, urinárias e transtornos alimentares nos jovens transgênero", disse Jennifer Leininger, que trabalha no Hospital de Crianças Lurie de Chicago.
A solução encontrada por Brown é utilizar os banheiros reservados para "famílias" nos centros comerciais. "Já houve quem gritasse comigo por eu ter utilizados esses banheiros", disse.
Passe contra assédios e hostilidades
Robert Garofalo, que dirige um departamento específico para crianças transgênero no mesmo hospital, afirma que a questão do uso dos banheiros é uma preocupação real para seus pacientes.
"Frequentemente tenho que prescrever uma espécie de "salvo conduto' para meus pacientes transgênero, caso eles sejam hostilizados inclusive pela polícia por entrar em um banheiro", disse.
"Tudo começa com a segurança escolar", afirmou Garofalo. "Não se pode ter uma discussão sobre aprendizagem, sobre um crescimento e um desenvolvimento saudável se um estudante está preocupado com a sua segurança e seu bem-estar", acrescentou.
A escola atual de Brown fez esforços consideráveis para acomodá-lo, junto a outros estudantes transgênero.
Esse instituto situado em Deerfield, Illinois -uma comunidade de 18.000 habitantes- criou banheiros de gênero neutro em suas instalações, para permitir que Brown tenha acesso a um lugar onde possa trocar de roupa.
"Agora sou capaz de me concentrar nas aulas e não apenas em sobreviver. Posso prestar atenção na aula sem me preocupar com o que devo fazer no ginásio, ou a que banheiro devo ir", disse.
Deerfield parece, dessa forma, a anos luz de distância das batalhas culturais que acontecem no resto do país sobre o uso de banheiros públicos por pessoas transgênero. Mas esse é só um dos muitos exemplos de como as escolas tentam integrar jovens desse grupo.
O sistema de escolas públicas de Chicago, que atende a 2,7 milhões de residentes, redigiu uma normativa para os diretores dos centros.
"O diretor junto com um conselheiro, o estudante e seu familiar trabalharão juntos para estabelecer um plano individualizado de apoio a cada jovem, de forma que se sintam confortáveis em sua escola", disse Janice Jackson, alta funcionária do sistema de Escolas Públicas.
Um lado positivo
Em um de suas notas mais recentes, pedindo que as escolas acomodem os estudantes transgênero, p Departamento de Justiça mencionou os esforços de Chicago e iniciativas semelhantes no Alasca, em Massachusetts, no Oregon, no estado de Washington e no Kentucky.
Em Los Angeles, por exemplo, as escolas distritais não exigem que os estudantes se submetam a exames médicos ou a diagnósticos psicológicos para que sua identidade de gênero seja reconhecida.
Em Nova York os estudantes transgênero podem participar em aulas de educação física exclusivas para cada sexo "de uma forma consistente com sua identidade de gênero", informou uma fonte desse distrito.
Mas nem tudo é tão fácil. Os governos de 11 estados federados abriram processos contra a administração do presidente Barack Obama por causa de suas normas sobre o uso de banheiros por pessoas transgênero.
Inclusive em um subúrbio de Chicago está pendente um processo judicial por causa de um acordo que permite a uma estudante transgênero (que nasceu homem, mas se identifica como mulher) utilizar uma área especial dentro do vestuário das meninas para trocar de roupa.
Iniciado por 51 famílias, o processo alega que o acordo viola a responsabilidade de "proteger a privacidade, a segurança e a dignidade" do resto dos estudantes, disse Jeremy Tedesco, da Aliança em Defesa da Liberdade, um dos grupos religiosos que se opõe a qualquer flexibilização nas normas sobre o uso de banheiros públicos.
Garofalo, no entanto, vê um lado positivo no atual debate. "Acho que há coisas positivas que estão começando a surgir disso", disse, mencionando mais programas pediátricos para atender as necessidades de crianças transgênero.