Que tal se desvencilhar de inúmeros bens materiais, vender sua casa, seu carro, exercer o desapego e criar um novo estilo de vida, movido por uma paixão, para conhecer o mundo? Há cerca de um ano e seis meses, foi isso que o paranaense Edson Carvalho Jr. , 36, fez. A paixão que o move: a cerveja.
Criador do projeto Viajante Cervejeiro, Edson tomou como desafio para si viajar por todo o Brasil – de carona e se hospedando na casa de pessoas com quem nunca teve contato – para conhecer bares e cervejarias, além de experimentar o máximo possível de cervejas artesanais brasileiras. Em passagem por Minas Gerais – o nono Estado em sua rota –, o viajante cervejeiro conversou com o Gastrô em um bar (claro) de Belo Horizonte para falar de suas aventuras regadas a malte, lúpulo, cevada e outros ingredientes.
O desafio de Edson em girar pelo país em busca de cervejas artesanais começou em 2014. No entanto, sua relação com a bebida é anterior e teve início na Espanha. “Entre 2006 e 2007, morei em Barcelona e foi lá que conheci a cerveja artesanal. Me apaixonei e decidi que era com isso que queria trabalhar”, conta ele que, ao longo desse período, já teve a oportunidade de circular por alguns países europeus apreciando cervejas. De volta ao Brasil, vivendo em Curitiba, a paixão pela bebida já ganhava contornos diferentes, com o publicitário fazendo cursos de sommelier de cerveja e trabalhando na Mestre Cervejeiro, loja curitibana especializada em cervejas, em seus primórdios.
Inquieto, o espírito aventureiro desse viajante voltou a falar mais alto e, ao longo de um ano, entre 2011 e 2012, Edson mergulhou em um novo roteiro internacional, dessa vez incluindo alguns países do Sudeste asiático, tendo como combustível a cerveja. Novamente em terras tupiniquins, desta vez em Florianópolis, Edson tomou a decisão que, desde então, mudou sua vida. “Precisava dar algum sentido a minha vida e sempre tive uma coisa muito forte de viajar e quis aliar a cerveja a isso. Decisão tomada, Edson escolheu uma data simbólica para começar sua “nova profissão”: 1º de maio de 2014, Dia do Trabalho. “Marquei essa data para começar o Viajante Cervejeiro, mas não tinha grana para fazer. Aí comecei a pensar em eliminar custos para viajar. O primeiro deles foi que decidi não ter casa. Desde então, não tenho uma residência. Vendi carro, roupas, coleções de copo, queria estar livre pra fazer a viagem, e as coisas te prendem”, explica.
O próximo passo era pensar na logística de hospedagem. A experiência europeia, permanecendo na casa de outras pessoas por meio do programa de CouchSurfing, facilitou a vida de Edson, que, com o passar do tempo (e a repercussão que seu projeto foi ganhando nas redes sociais), não teve grandes dificuldades em conseguir anfitriões pelas localidades que visitava. “Costumo publicar meus roteiros nas redes sociais com antecedência, e as pessoas acabam me convidando para ficar em suas casas”, diz o viajante, que busca permanecer na residência das pessoas no máximo quatro dias. “Brinco que visita é como peixe. Em três dias começa a feder e o melhor é ir embora. Para se ter uma ideia, em menos de duas semanas aqui em BH, já estou na quarta casa”.
Desapegar-se de seus bens e conseguir hospedagens não foram os maiores “sofrimentos” para o paranaense. O deslocamento, este sim, tornouse uma das principais metas para Edson conhecer cervejas artesanais Brasil afora. “Tomei como desafio viajar somente de carona. Já teve gente que me ofereceu passagem, mas não aceito. Dessa forma, já foram mais de 11 mil quilômetros de estrada”, contabiliza ele, que já experimentou cervejas no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina, no Paraná, em São Paulo, no Rio de Janeiro, no Mato Grosso do Sul, no Mato Grosso, em Goiás e no Distrito Federal. “Apesar de alguns perrengues que enfrento, como ficar muito tempo ao sol ou alguém que te dá carona até um ponto qualquer e te larga no meio do nada, em algum lugar estranho, acho que essa é uma parte divertida, que rende muitas histórias”, destaca ele, que neste momento deve estar experimentando cervejas artesanais no Espírito Santo, seu destino seguinte.
Inspirado pelo jornalista e escritor britânico Michael Jackson (1942-2007), especialista em cervejas e uísques, apelidado de Beer Hunter (caçador de cervejas, em tradução literal), Edson Carvalho já se considera um profissional da bebida, apesar de aspirar voos mais altos, especialmente no aspecto financeiro, algo que ele ainda espera deslanchar em sua carreira. “Como o projeto é totalmente independente, as palestras que faço sobre cerveja e as viagens são minha fonte de renda. Elas mantêm a viagem. Sempre planejo um roteiro no Estado anterior. Então, faço contato com os lugares e já ofereço cursos, palestras. Não cobro nada para divulgar o bar, por exemplo, e tem lugares que me chamam. Quando completei um ano de viagem, parei com os cursos sobre cerveja e, agora, fico mais nas histórias, enquanto vamos bebendo, conversando e nos divertindo”.
Por mais apaixonado, especialista, profissional e sommelier de cerveja que ele seja, o viajante tem uma filosofia muito simples e importante ao tratar da bebida e da dimensão que as artesanais ganharam nos últimos anos. “Quando você começa a apreciar uma boa cerveja artesanal, sua referência muda. Mas acho que não precisa ser radical. Afinal, cerveja é confraternização. Não quero ser um ‘beerchato’. Não deixo de tomar uma cerveja, digamos mainstream, pois o que vale é confraternizar”, ensina.