Alerta

Acidentes por uso de cerol crescem 200% neste ano

De janeiro até o dia 14 de julho, já foram registradas três ocorrências em Betim

Publicado em 20 de julho de 2017 | 20:36

 
 
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Eram 9h da manhã do último dia 14 de julho. Márcio Lúcio de Goes, 53, aproveitou o dia de folga para fazer a manutenção da sua motocicleta. Subiu no veículo, deu partida e saiu de casa, sentido Belo Horizonte, pela BR–381, em direção à oficina de um conhecido. O que o manobrista não contava é que aquele, que parecia ser um dia comum, acabaria de forma trágica.

Ao chegar na altura do bairro Jardim Teresópolis, sentiu uma fisgada no pescoço. Soltou as mãos da moto e colocou na garganta, que não parava de sangrar. Naquele momento, Goes engrossava mais uma triste estatística do país: a de pessoas que são vítimas de acidentes com linhas de cerol e linhas chilenas – mistura cortante feita com cola, vidro e restos de materiais condutores, usada para soltar pipas. “Passou um filme na minha cabeça. Pensei na minha esposa, no meu filho Natan e em Deus. Achei que iria morrer”, contou a vítima, que, além de cortar o pescoço, teve uma fratura no pé.

Em Betim, levantamento feito de janeiro até o dia 14 de julho, com base em ocorrências nas rodovias e vias que cortam o município, três pessoas foram feridas por linhas com cerol – quase 200% a mais do que o registrado no mesmo período, no ano passado, quando houve apenas uma ocorrência. “E esses números são subestimados, porque quando o ferimento não é grave, a grande maioria das pessoas não é conduzida para uma unidade e não registra ocorrência”, explicou o tenente Pedro Aihara, do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais.

Os dados também acendem um alerta sobre o fato de que o risco de acidentes por cerol ou linha chilena tende a aumentar consideravelmente nesse períodos de férias escolares. “Isso porque cresce o número de crianças e adolescentes que vão às ruas soltar pipas. Por isso, o motociclista, que é a principal vítima, deve ter atenção redobrada e utilizar todos os equipamentos de segurança, como a antena de proteção, colocada no guidom da motocicleta, e que serve de anteparo para que a linha não entre em contato com o pescoço da pessoa; e a proteção de pescoço, feita de malha de aço e revestida com tecido”, disse.

Para o tenente dos Bombeiros, também é imprescindível que os pais acompanhem a brincadeira dos filhos e os orientem a não fazer uso do cerol ou da linha chilena. “Se a pessoa usar esse material, está praticando uma brincadeira de mal gosto, que pode resultar em um crime, já que uma pessoa pode morrer. Se alguém se ferir, quem estava soltando a pipa responde criminalmente por lesão corporal e, se houver morte, por homicídio culposo. No caso dos menores, os pais são responsabilizados pelos atos dos filhos”, salientou o tenente dos Bombeiros.

Prejuízos na rede

Segundo a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), entre os meses de janeiro e maio deste ano, a pratica de soltar pipas foi responsável por 840 ocorrências de interrupção no fornecimento de energia elétrica, que prejudicaram cerca de 280 mil consumidores no Estado. Em 2016, cerca de 1 milhão de pessoas tiveram os serviços afetados. “As pipas devem ser empinadas em locais abertos e afastados das linhas de distribuição de energia. Jamais use fios metálicos ou cerol e, caso a pipa fique presa, não tente resgatá-la”, orientou Demetrio Venicio Aguiar, engenheiro eletricista da Cemig.

Apesar de ter ciência que ao soltar pipa com cerol ou linha chilena pode colocar a vida de uma pessoa em risco, Carlos*, 19, morador do bairro Citrolândia, disse que vai continuar com a prática. “Não dá para soltar o papagaio sem cerol. Se a gente fizer isso, outros meninos vêm e cortam a gente. Daí, temos que fazer outro papagaio. Concordo que soltar papagaio usando cerol é perigoso e coloca a vida de outras pessoas em risco, mas quando a gente está brincando, não lembra disso”, justificou-se.

Denuncie

Usar ou vender cerol ou linha chilena é crime. Quem flagrar esse tipo de prática pode ligar para a Polícia Militar, através do número 190.

 

Projeto

Para tentar coibir os acidentes envolvendo cerol e linha chilena na cidade, a Câmara de Betim decidiu criar um projeto de lei que propõe punição para quem for flagrado usando esse tipo de material.

A proposta, em tramitação no Legislativo, quer multar em R$ 2.000 quem for flagrado nesta situação. No caso de reincidência, o valor será dobrado.

Já em âmbito estadual, desde 2002 foi aprovado a Lei 14.349, que proíbe o uso de cerol ou de qualquer outro tipo de material cortante nas linhas de pipas, de papagaios e de semelhantes artefatos lúdicos, para recreação ou com finalidade publicitária, em todo o território de mineiro.

Pela lei, quem for flagrado usando cerol ou linha cortante está sujeito ao pagamento de multa, que varia de R$ 100 a R$ 1.500, podendo ser aumentada. O valor arrecadado com as multas pagas pelos infratores é destinado ao Fundo para a Infância e a Adolescência. (Com Leonardo Cunha)

*Nome fictício