A pressão arterial do país exibiria, se fosse possível medi-la hoje, parâmetros totalmente fora da regularidade. Identificar as causas desse descontrole não seria difícil para qualquer um de nós. Ela é o resultado do esgotamento de um modelo político criminosamente patrimonialista. Que não serve de exemplo para nada. Instalado aqui há décadas, alcançou culminâncias estratosféricas nos governos dos ex-presidentes Lula e Dilma, a partir da consolidação de uma gestão de coalizão que incluía o PT como carro-chefe, mas auxiliado pelo PMDB.
No tempo do ex-presidente Ernesto Geisel, quando já não encontrava quase ninguém que defendesse a ditadura, o então chefe da Casa Civil, general Golbery do Couto e Silva, criou uma teoria sui generis. Baseando-se na movimentação dos músculos cardíacos, o esperto militar pôs em prática a teoria da sístole e da diástole, aplicada, em parte, na “abertura lenta e gradual” iniciada por seu chefe e, com alguns solavancos, continuada no governo do ex-presidente João Baptista Figueiredo, que não teve outra opção senão concluí-la.
Viver muito é bom, mas, às vezes, provoca alguns desgostos. Agora, por exemplo, as lembranças da ditadura civil-militar – um enorme e insano desperdício de tempo – não me fazem bem. Não me refiro apenas à saúde, leitor, até porque sabem todos, principalmente nós que chegamos lá, que a velhice, até agora, nunca fez bem à saúde…
Refiro-me à experiência que os longos anos deveriam trazer aos mais velhos, ainda que teimosos. Ou, então, carregaremos pela vida afora, como alguns dos mais renitentes ainda o fazem, sem jamais praticá-lo, o proverbial “conselho” do (sábio) Bobo da Corte, na tragédia teatral de Shakespeare “Rei Lear” (1605), transcrito na semana passada: “Tu não devias ter ficado velho antes de ter ficado sábio”.
Os ex-ministros Geddel Vieira Lima e Marcelo Calero quase derrubaram a pinguela que nos sobrou para alcançar a diástole e, enfim, fazer a travessia que o povo busca desesperadamente. O primeiro foi criado na velha e criminosa escola política. Carrega consigo a síndrome do escorpião: quando menos se espera, o ferrão destila o veneno. O outro, um neófito, deve estar à cata de algum dividendo político. Por que não enfrentou de peito aberto (e coragem) o colega de equipe? Sua melhor arma, para se salvar de incômodos, é o gravador?
Deixo um episódio que já provocou náuseas para me referir ao voo da Chape, que deveria levar e trazer os campeões do Chapecoense, mas terminou na morte de 71 passageiros, e, depois, à morte, aos 90 anos, do caudilho Fidel Castro. Quanto ao trágico voo da morte, talvez a sincronicidade de acontecimentos explique alguma coisa. Quanto ao “comandante”, volto a dizer que o acompanhei desde muito jovem e, entusiasmado, em janeiro de 1959, recém-bacharel em direito, torci por sua vitória ao vê-lo descer da Sierra Maestra e adentrar Havana – a alegre e sofrida cidade que se transformara em verdadeiro bordel para servir a seus vizinhos. Fidel expulsaria, esperava eu, o imundo ditador Fulgencio Baptista e restituiria a liberdade ao povo cubano.
Fidel permaneceu em Cuba, leitor, durante 58 anos. Há oito, transferiu o poder ao irmão Raúl, pouco mais novo que ele. Depois de conquistado o poder, a férrea e cruel ditadura que implantou em seu país propiciou avanços na educação e na saúde, mas jamais contribuiu para devolver a seu povo seu maior bem – a liberdade.
A crise política, o voo da Chape e a morte de mais um caudilho
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