Ano de 1934, Alemanha. Tempos difíceis, de preconceito e intolerância. Uma família judia muda-se para um condomínio após reformar o imóvel. A presença dos novos inquilinos não agrada a todos os moradores, mas não impede a mudança.
Apesar das melhorias, a nova residência tinha problemas antigos. Entre eles, a presença de ratos. Na primeira semana, a família matou um roedor e jogou no lixo do condomínio. Na segunda, eliminou mais dois, e, na seguinte, outros três. Os demais moradores, em sua maioria alemães arianos, ficaram incomodados. Reuniram-se e decidiram expulsar a família de judeus. A justificativa? Estavam levando ratos para o condomínio.
Essa história também se aplica à discriminação ao PT e a seus expoentes na atualidade.
Há 13 anos, elegia-se presidente do Brasil um operário que não fazia parte do “condomínio do poder”: não pertencia à “raça predominante” na política nacional nem à elite branca deste país. Era um nordestino que poderia ter morrido à míngua na seca, ou, quem sabe, assassinado nas favelas onde morou. Um ex-preso, que na ditadura lutou contra o sindicalismo pelego, por melhores salários para os trabalhadores e, contra todos os prognósticos, conseguiu mudar a face do poder no Brasil.
Lula assinou o decreto de adesão do Brasil à Convenção da ONU contra a Corrupção e deu autonomia ao Ministério Público, nomeando para comandá-lo o nome mais votado pela categoria, diferentemente de seu antecessor, que costumava indicar o mais alinhado com seus interesses. Ele também fortaleceu a Polícia Federal e lhe deu independência, já que, antes, era dirigida por um delegado filiado ao PSDB, várias vezes candidato a deputado. Criou, ainda, a legislação da delação premiada e enviou ao Congresso o projeto de lei que tornava a corrupção crime hediondo.
Com sua sucessora não foi diferente. Dilma Rousseff nunca havia estado no “condomínio do poder”. Jamais tinha sido eleita para um cargo político. Era uma ex-presa política, torturada no regime de exceção. E também incomodou. Fez mudanças estruturais na Petrobras, demitiu servidores envolvidos com irregularidades e aprovou no Congresso a lei de combate à corrupção.
Pois bem. Assim como na história, aqueles que tiveram a iniciativa de combater a “praga”, hoje, são execrados, acusados de ser os donos dos “ratos”. E, com a proposta inconstitucional de impeachment, tentam expulsar do “condomínio” uma presidente eleita legitimamente.
Fica o alerta: se não houver uma reação contundente da sociedade civil organizada, o exterminador acabará caçado como rato. Precisamos defender nossa democracia, a tão duras penas construída, a fim de que o Brasil não reproduza preconceitos históricos de uma elite para a qual somente seus membros podem morar no “condomínio do poder”.
A história que abre este texto é fictícia, mas bem que poderia ser real, na Alemanha de 1934 ou no Brasil de 2015.
O colunista Márcio Garcia Vilela escreve agora aos sábados.
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Sobre exterminadores e ratos
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