Em tempos em que se discute a redução da maioridade penal, de 18 para 16 anos, pouca atenção se dá a um fenômeno cada dia mais crescente: a maldade, a violência e a impunidade são fruto da ausência firme de autoridades e de uma sociedade cada vez mais desigual, trancada em si e alienada.
Tome-se o exemplo de um assalto em plena tarde de terça-feira em São Paulo, em que dois menores de 11 e 14 anos (!) agrediram uma senhora em um estacionamento de um shopping – antigo local seguro de compras – e, perseguidos pela PM por vários quilômetros, acabaram batendo o carro em outro e trocando tiros com os policiais. Entre os feridos por balas perdidas e pelo acidente, cidadãos trabalhadores e inocentes, vítimas de uma tragédia sem fim. Levados à delegacia, conforme reza o Estatuto da Criança e do Adolescente, devido à idade mínima, ambos tiveram seus pais chamados para se responsabilizar.
A passagem pela instituição que em São Paulo se chama “Casa” (antiga Febem) não foi possível pela pouca idade. Entrevistada, uma das mães, aos prantos, diz: “não tem jeito com esse menino, é o cão, saio de casa às 4h da manhã, chego às 11h da noite, trabalho honestamente, mas ele não vai para escola, fica na rua com má companhia, usando droga e assaltando!”. Então, eu pergunto: cadê pai e mãe para dar castigo, punir, estabelecer limites? Na sua ausência, quem deverá exercer esse papel? Avós, familiares, vizinhos, creches sociais, babás para classes mais abastadas? Ou seriam escolas em horário integral, projetos esportivos comunitários, trabalho de ONGs que estimulassem arte, cultura, ecologia? Pois o certo é que na fase pré-puberdade é que se moldam mais firmemente a estrutura do caráter, as primeiras noções de cidadania, ética e moral. E o que dizer da formação religiosa, que por séculos inibia as tendências instintivas para violência, sexo, transgressões em geral?
Um estudo que gosto de citar quando assunto semelhante vem à tona é o caso dos adolescentes elefantes. Tudo começou quando um dos parques de preservação de elefantes ficou superpovoado. A solução encontrada foi transferir parte do bando para outro parque, a centenas de quilômetros, na África do Sul. Para tanto, optou-se pelo embarque dos menos pesados, portanto crianças e adolescentes. Tudo certo, até que, passado algum tempo, chegaram notícias de comportamento atípico dos elefantes, matando outros animais, invadindo tribos, destruindo construções, agressivos entre si, entre outros relatos, o que desafiou veterinários, biólogos e estudiosos.
Após uma série de encontros e estudos, verificou-se que a sociedade dos elefantes é matriarcal (a fêmea exerce poder e domínio) e que, sem os adultos para controlá-los, puni-los, estabelecer hierarquia, limites, o bando de elefantes adolescentes se tornara desajustado, com má índole, violento e não sociável, e que não adiantaria retorná-los a seus pais e parentes, pois houvera uma mudança de caráter irreversível. Após polêmicas , o governo Sul-africano autorizou que fossem abatidos e mortos em caçada.
Quem se interessar por uma ciência chamada “etologia”, que compara o comportamento animal com os seres humanos, poderá verificar situações como esta relatadas entre chimpanzés, leões, etc. Então, pergunto: quem será por nós? Pois, se por um lado, a revolta tem levado a tristes casos de linchamento, somos nós, ricos, remediados e pobres que, como coletivo, atendemos pelo nome de “sociedade”, quem tem a culpa, das gerações de meninos de rua, órfãos de nós mesmos, gerados por um ventre social doentio, desmamados à força, nutrindo-se do pó, das pedras, vingando-se sem misericórdia nos tiros, tirando dos “bacanas” o que julgam precisar para se igualar ao sonho consumista e às vaidades fúteis.
A guerra urbana não distingue herói de bandido, bons ou maus. Somos vítimas e autores das atrocidades que nos fazem ter prisão domiciliar, sair para trabalhar, voltar correndo na lentidão dos transportes públicos e privados, com muros altos, cercas, alarmes e muita, muita reza!
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