O melhor hotel de Pirapora é o Canoeiros. Ao lado do Velho Chico, dele vejo as pedras onde a água se espraiava em caudais. O cartão-postal da cidade é desmentido pela realidade. A estiagem dos últimos anos levou para longe as corredeiras sob a ponte histórica, de estrutura metálica e pilares de pedra.
Surgiram enormes bancos de areia, lajedos secos e o curso do rio se afastou uns 200 metros. O volume principal flui do outro lado, bonito, verdinho, sem mechas de lama que sinalizem chuva na cabeceira de um afluente remoto. A água pouca diminui a sensação de perigo e atrai para um mergulho a meninada do município vizinho de Buritizeiro.
A paisagem faz dó, quando se pensa nos 12 milhões de ribeirinhos que dependem das águas do Velho Chico, país adentro. Enquanto isso, a tevê mostra usina de dessalinização de água marinha, em Barcelona e na Ilha de Fernando de Noronha. Noutra matéria, associa-se o desmatamento amazônico à falta de chuvas no Sudeste. Fico pasmo ao ler em <CF82>O TEMPO</CF> que a cidade mineira de Rio Paranaíba – onde está a nascente do rio homônimo – precisou cavar poços artesianos para o povo beber água!
Na semana seguinte, ao escrever este artigo, leio no caderno de economia a ótima matéria “Às margens da seca”, confirmando que o nível da barragem de Três Marias e do rio São Francisco é o mais baixo da história e que cerca de 3.000 cidades brasileiras podem enfrentar problema de abastecimento de água até o ano que vem.
Sentado à mesa para comer o delicioso churrasco de surubim, pergunto-me se as próximas gerações terão o mesmo privilégio. Espero que sim. A iguaria é gostosa no hotel e magnífica no Egnaldo. Outrora trivial, na companhia de pirão, em simples e substanciosa moqueca barranqueira, virou comida de rico, pois conta na faixa dos R$ 100 para uma pessoa ofende os bolsos remediados do Norte de Minas e torna injustificável a recusa do garçom em providenciar uma saladinha básica com tomate, alface e cebola sem custo extra para o freguês!
Errou na mão o Egnaldo, que bem podia ser mais generoso no detalhe. Afinal, trabalha com artigo de luxo, o filé alto de surubim, com seus nacos branquinhos de carne tenra, coisa para turista, mais caro que um bacalhau no Bairro Alto de Lisboa.
Antes de regressar, passo o fim de semana com a família, no Alto Paranaíba, com direito ao melhor pão de queijo que possa existir. O amarelo do ovo caipira e a leveza da massa, aliados à qualidade do queijo da região e do polvilho doce – por que tem gente que ainda insiste em usar azedo? – garantem maciez e sabor incomparáveis à quitanda. Ficam ainda melhores na companhia dos parentes queridos.
A caminho de Belo Horizonte, numa tarde de domingo, vou parando nas fazendinhas de Serra de Salitre e Cruzeiro da Fortaleza, abrindo porteiras e arriscando a buzina, para ver se compro meia dúzia de queijos curados. Dali até Campos Altos, Araxá, Medeiros, Pratinha, qualquer estrada que se pegue conduz a inúmeras queijarias de primeira grandeza, num raio de cem quilômetros. Pena, só encontro queijos frescos. E sem forma (o uso do circunflexo diferencial faz tanta falta quanto a própria forma) para protegê-los, chegarão esborrachados em casa.
Com a esperança renovada pelo humor e a alegria de viver dos tios Dário e Angélica, quase nonagenários, sonho com um céu plúmbeo sobre as nascentes e os afluentes do Paranaíba, do Grande e do Velho Chico, pois sei que ali estou pertinho do divisor de águas das três bacias.
Também sonho com fazendas e fazendeiros abertos para o turismo rural e mais preparados para a venda direta ao consumidor. O bucolismo das colinas suaves do Alto Paranaíba, as vaquinhas girolandas no pasto e a simplicidade dos donos, mais um franguinho com angu e quiabo, são ingredientes de uma receita de sucesso garantido.
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