Responda ligeiro: você pode comprar tudo com dinheiro? A resposta ágil, nítida e sensata é um baita de um “não”. Você sabe disso! Sem se apegar muito à demagogia e aos clichês, mas sendo, desta vez, certeiro: eu nunca vi etiqueta de preço em relações de amor, de honestidade, de amizade, de sinceridade... E isso pode ser muito bem comprovado no filme “Foxcatcher – A História que Chocou o Mundo”. Bom, se chocou o mundo, eu não sei, pois eu nunca tinha ouvido falar na vida dos personagens desse filme. Na verdade, nesse caso, não saber da história é até bom, já que você tem a oportunidade de viver o suspense por inteiro e descobrir o trágico roteiro pouco a pouco, bem sorrateiro.
O longa de Bennett Miller, indicado ao Oscar deste ano em cinco categorias (Melhor Diretor, Ator, Ator Coadjuvante, Roteiro Original e Maquiagem) – sem levar nada –, é uma história real, baseada na vida dos irmãos Schultz, Mark (Channing Tatum) e Dave (Mark Ruffalo), ambos vencedores da medalha de ouro em luta greco-romana nas Olimpíadas de Los Angeles (1984). Certo dia, em seus treinos modestos, o carrancudo Mark recebe uma proposta de John Du Pont (Steve Carrell), entusiasta do esporte e herdeiro bilionário de um tradicional clã norte-americano da indústria química e de guerra. (Só um parênteses dramático e rotineiro: a atuação séria e impecável desse trio de atores já vale o tempo no sofá e o preço da pipoca de micro-ondas. É sério, os três estão irreconhecíveis!).
Voltando ao raciocínio derradeiro: o ricaço acaba levando Mark para treinar no centro de treinamento que constrói em sua fazenda Foxcatcher, na Pensilvânia. E, a partir daí, surge uma relação entre os dois (nada homossexual, não é esse o ponto), em que rola um fascínio dominador, uma intimidade estranha, algo diferente aos olhos de qualquer um. Resumindo esse lado companheiro: um se torna “escravo” do dinheiro do outro, e esse outro, claro, não consegue comprar o talento, a juventude, muito menos o brilho do lutador parceiro.
Em certo momento do filme, Du Pont confessa a Mark que, quando era pequeno, sua mãe chegava a “comprar” alguns amiguinhos na escola para que ele tivesse companhia. Claro, um toque traiçoeiro. Após anos de contatos forçados e falsos, ele conta que isso foi um tiro no escuro, pois nenhum “amigo” foi suficientemente amigo para durar por toda a sua vida. Um golpe grosseiro!
É, guerreiro, a vida é feita de interesses. Toda e qualquer relação, seja ela pessoal, amorosa, de trabalho, de lazer, tudo é realizado na base da troca. Não estou querendo ser ou parecer um desacreditado no mundo ou nas pessoas, indicar que só recebemos chutes no traseiro. Não é isso. Só estou colocando os pingos nos is, pois todo mundo sabe que ninguém faz nada, absolutamente nada, sem que queira algo em troca. Calma, antes de me xingar ou me achar um mercenário biscateiro, digo que esse “algo” pode ser apenas um sorriso, um beijo, um olhar de aprovação verdadeiro. Mas é algo em troca. E esse modo de agir e pensar é tão natural e saudável que não soa como um real convite interesseiro. É algo bonito como a vida, intenso como o amor ou um doce brigadeiro, necessário como o oxigênio, esse fiel escudeiro. Porém, chegar a comprar alguém não é permitido a ninguém. Essas são lições que você só aprende com o passar dos anos, não dá pra ter um jeitinho brasileiro.