Não é de hoje que o caixa 2 é utilizado no país para espúrias atividades que objetivam o controle do poder político com a ajuda da força do dinheiro. O golpe militar de 1964 já havia utilizado a prática para financiar as atividades com dinheiro entregue debaixo dos panos por industriais de São Paulo. Muito antes disso, em 1946, conforme contou Sérgio Machado em sua delação premiada, as empreiteiras já davam as cartas, usando de subterfúgios do tipo para garantir o sucesso de seus aliados no poder.
A perpetuação da prática ao longo dos tempos certamente ajuda a explicar o motivo de os políticos brasileiros acharem tão desnecessário discutir as ilegalidades praticadas ao obter recursos não contabilizados. Entre pequenas variações, repetem o mantra de que “é preciso diferenciar o caixa 2 da corrupção”. Não cola.
Petistas já usavam isso quando o escândalo do mensalão ganhou corpo e tornou-se inegável. A primeira atitude, de negar a prática criminosa, foi abandonada quando a investigação começou a tornar óbvio e visível que havia um esquema de compra de apoio político que, ironicamente, ajudou a aprovar uma reforma da Previdência, tal como a que se discute hoje. José Dirceu e companhia relatavam que era apenas uma questão de dinheiro não contabilizado.
Mais tarde, tucanos mineiros passaram a usar a tese de caixa 2 para diferenciar o caso petista do que teria ocorrido em Minas Gerais nos idos de 1998, na campanha à reeleição do então governador Eduardo Azeredo (PSDB). Tal como os petistas, ignoravam a denúncia de que os recursos não contabilizados escondiam a participação de estatais no financiamento eleitoral. Ainda hoje, com Azeredo já condenado em primeira instância pelo fato, batem insistentemente nessa tecla.
Agora, com a Lava Jato, grandes partidos e importantes figuras do Legislativo, do Executivo e até do Judiciário apelam mais uma vez para a tática de redução de danos. Dos males, o menor é assumir que houve caixa 2. Afinal, “um cara que recebeu cem pratas para se eleger não pode ser colocado no mesmo bolo” de quem roubou a Petrobras, como disseram por aí.
Assim, PT, PSDB, PMDB e outros encontraram a saída para seus problemas judiciais na articulação de uma manobra para anistiar o caixa 2 e, na prática, parte do que sempre se soube ser corrupção.
Não basta a nenhum deputado, porém, limpar sua barra na Justiça com a anistia do ilícito responsável por estar no Congresso. Hoje, seus variados processos já repousam confortavelmente nos arquivos do STF, que tem casos demais e ministros de menos para julgá-los. Para que continue assim, é preciso, mais que isso, assegurar que não percam o cargo e, consequentemente, o foro privilegiado.
É aí que reside a ânsia política de garantir a aprovação de um novo sistema eleitoral, que adote a lista fechada. Assim, com o cidadão votando em um partido, e não nos candidatos, a mancha que a Lava Jato deixa no currículo dos políticos desaparecerá debaixo de uma decisão indireta dos caciques, que os colocarão no topo da lista. Para completar, bastaria trazer de volta à discussão o parlamentarismo. Os caciques escolheriam quem assumiria vagas na Câmara, e esses escolhidos disputariam o cargo de primeiro-ministro. O povo assistiria a tudo de fora, para não atrapalhar.
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