Vivi o suficiente para poder afirmar alto e bom som que somos uma sociedade violenta. E não me refiro apenas aos momentos em que especialistas se põem em acordo para denominar “ditadura”, como a de Vargas ou a de civis e militares em 1964. Lembrei outro dia a um pesquisador que o período JK também conviveu com a aplicação da censura: para lograr obter a mudança da capital, Juscelino valeu-se dela para tentar calar Billy Blanco, que ousou escrever a canção “Não Vou pra Brasília”. Antes disso, quase todas as peças de Nelson Rodrigues, nosso maior dramaturgo, foram censuradas. Não é preciso dizer que, durante todo o período pós-1946, o país conviveu e utilizou a lei antigreve, Decreto-Lei 9.070, de 15 de março de 1946. Em suma: artistas e intelectuais, além dos trabalhadores submetidos ao capital, esses sempre foram tratados com a brutalidade de foras da lei, ou por leis específicas elaboradas sob medida para torná-los cidadãos de segunda ou terceira categoria.
Quando Lula ouviu Marcio Thomaz Bastos, seu primeiro ministro da Justiça, e permitiu ações espetaculosas, envolvendo a Polícia Federal, escrevi neste jornal que, para mim, política e polícia nunca deveriam andar juntas. Sempre pensei isso. E sou filha de juiz de direito e neta de desembargador e convivi com honrados promotores de Justiça, como o saudoso dr. Jair Leonardo Lopes. Nem preciso dizer que sou também advogada.
Apoio o combate diuturno à corrupção. E, para mim, corrupção não ocorre apenas quando alguém se apropria e utiliza em benefício próprio o que pertence à sociedade. A má distribuição de recursos públicos também é corrupção no sentido mais elaborado possível, pois priva os que precisam do Estado das mais comezinhas necessidades do ser humano. Agora mesmo, há poucos dias, recebi um livro tido e havido como notável estudo feito nos Estados Unidos sobre o tema: “Corruption and Government: Causes, Consequences and Reform”, de Susan Rose-Ackerman, editado pela Cambridge University Press. Estou lendo-o devagarinho, e tomando notas, agora que meus olhos e meus neurônios já não mais funcionam com a capacidade de que gozei quando jovem.
Digo tudo isso porque estou absolutamente revoltada com o que aconteceu na semana passada com minha UFMG, universidade onde estudei e onde fui professora por anos. Afirmo que não há nenhuma razão dentre as que foram invocadas – “impedir a articulação de artifícios e a subtração de provas” – para a realização de condução coercitiva do reitor e de vários pró-reitores, supostamente por desvio de recursos. Todos poderiam ter sido notificados ao mesmo tempo e obrigados a se apresentarem por si sós e prestar esclarecimentos.
Em especial, repudio o tratamento dado à professora Heloisa Murgel Starling, cuja foto vem sendo exibida nas redes como “pseudo-historiadora que usava a ‘Comissão da Verdade’ para caluniar as Forças Armadas”.
Relatar a história é obrigação dos historiadores.
Quem conseguiu até hoje refutar as informações, a duras penas, por ela coletadas?
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