Qual a maior semelhança entre o 7 a 1 e a cirurgia de Neymar? Se você respondeu “Belo Horizonte”, errou. Tudo bem que, geograficamente falando e analisando simploriamente os dois fatos, eles têm, claro, uma ligação direta com a capital mineira. Mas quero ir um pouco mais fundo na discussão. Os dois acontecimentos, no mais forte poder da palavra, expuseram um aspecto tragicômico do Brasil contemporâneo. “Vergonha”, “tragédia”, “humilhação” foram algumas descrições para o fatídico 8 de julho de 2014. Mas, tão logo passou o chororô no estádio depois de o mundo ficar boquiaberto com aquilo que se passava no Mineirão, o que se viu depois foi uma enxurrada de trocadilhos, deboches, no mais puro estilo brincalhão dos brasileiros. Lembram? Agora, voltemos para 2018. Notaram algo parecido? Desde a espetacularidade da notícia da pré-chegada do craque até o embarque de volta para mansão, em Mangaratiba, foram cinco dias de frisson, especialmente de dentro para fora (de Belo Horizonte para o restante do planeta).
Overdose
Como costumamos perder o amigo, mas não perdemos a piada, tivemos na porta do hospital Mater Dei, nas redes sociais e até na mídia tradicional o destilar do genuíno veneno cômico verde-amarelo. Torcedores esticaram o Carnaval na Contorno, o quinto metatarso do pé direito de Neymar virou tema de stand-up, e até Galvão Bueno entrou na onda e narrou a operação, com comentários de Arnaldo César Coelho (para quem não soube, foi no programa “Bem, Amigos!”).
Parcimônia
Tudo bem que todas essas brincadeiras ganharam vida porque o fim dessa história, do ponto de vista clínico, tende a ser feliz, e o atacante terá condições de vestir a 10 amarelinha na Copa, em junho. Não que com o contrário (Neymar fora do Mundial) nossa criatividade cessaria, mas ela seria bem mais branda. Afinal de contas, zombar da desgraça alheia tem limite. Machucado e fora da semifinal de 2014, quase ninguém ficou ironizando a ausência de Neymar na oportunidade.
Invencionices
Aliás, essa mania do brasileiro de fazer piada de tudo e de si mesmo precisava ser estudada. É cada uma que aparece. Muitas, bem criativas. E o futebol, e o esporte de maneira geral, é campo fértil para isso, vide a quantidade de memes compartilhados após a vitória do Cruzeiro sobre o Atlético no clássico. É por essas e outras que canais do YouTube como o Cenas Lamentáveis e Desimpedidos ganham cada vez mais popularidade, especialmente com as futuras gerações.
Controvérsias
O cara é uma estrela mundial e o principal nome do Brasil para a Copa do Mundo. Apesar de muita gente criticar, toda essa mobilização de imprensa só prova o quão importante ele é e o quão poderoso é esse esporte chamado futebol. Muita gente achou a cobertura ridícula, com “tantas outras coisas para se preocupar”, fazendo comparações com as áreas de saúde e educação, por exemplo. “Precisa criar um ‘BBB’ particular pro cara, não”, disse-me um seguidor no Twitter.
Mea-culpa
Como o assunto é profundo, há quem atribua esse circo sobre o jogador como um reflexo da sociedade. “Se eles fazem um ‘BBB’ com Neymar é por que dá ibope. E o ibope vem da população. Então, nós somos os culpados. A imprensa está fazendo o papel dela”, escreveu Vander, também no Twitter. O próprio Neymar gosta de se expor. A foto que postou com a namorada, Bruna Marquezine, e seu “novo possante” (a cadeira de rodas) é uma prova.
Sem cinto
É tanta gente de olho no craque que alguns percebem detalhes que outros não veem. Quando chegou ao Mater Dei, de carro, junto com o médico da seleção, Rodrigo Lasmar, Neymar estava no banco de trás e não usava cinto de segurança. Ao ver as imagens pela primeira vez, nem tinha percebido isso, mas logo fui alertado dessa infração de trânsito. Irrelevante? Absurdo? Nada é pequeno (sem trocadilhos) quando se fala de um astro do futebol.