Fabrício Carpinejar

Fabrício Carpinejar

Poeta escreve às sextas no Magazine e no Portal O Tempo

OPINIÃO

Uma tragédia nacional

'Nunca ocorreu no país um desastre ambiental dessa magnitude'

Por Fabrício Carpinejar
Publicado em 10 de maio de 2024 | 03:00 - Atualizado em 13 de maio de 2024 | 16:03
 
 
 

Sou gaúcho. Vocês sabem. Sou um gaúcho amineirado, pois o amor de uma mineira mudou a minha vida.  

Queria trazer a situação falimentar do meu Estado. Nunca ocorreu no país um desastre ambiental dessa magnitude. Não foi uma enchente, mas a inundação completa do Rio Grande do Sul. De nossos 497 municípios, 425 foram afetados. 

Os mortos já passam de cem, os desaparecidos também somam mais de uma centena, mas os números não são precisos porque as águas não baixaram. Os resgates vêm sendo feitos em condições precárias, na base de helicópteros e de frota náutica. Há locais remotos, nas encostas, arcando com deslizamentos de terra.  

É um apocalipse, com evacuação de cidades inteiras. Nem Porto Alegre ficou fora, com a elevação das águas do rio Guaíba a 5,33 m. A maior enchente da capital tinha sido em 1941, com 4,76 m. Testemunhou-se meio metro a mais do que o marco histórico, alagando bairros longe do cais. Falta água, falta luz, faltam mantimentos nos supermercados, faltam itens básicos de higiene. Água potável e gasolina entraram em racionamento.  

Os abrigos estão superlotados. Existe um clima de desespero por abandonar as residências submersas, com perdas do imóvel e do que havia dentro. A miséria súbita espalha o terror e compromete a segurança pública, com saques e invasões. Aumentam os riscos de leptospirose e dengue. Jacarés aparecem boiando na área urbana, num evidente desequilíbrio ecológico.  

No Vale do Taquari, o nível da água chegou a ultrapassar 30 m. São 30 m de um rio cobrindo tudo. É um edifício de dez andares de correntes ferozes e barrentas submergindo residências. Cidades como Encantado, Muçum e Roca Sales sumiram temporariamente do mapa. Pontes caíram, estradas cederam o seu asfalto. Cada região se transformou numa ilha incomunicável, apenas possível de se acessar pelos céus. Famílias aguardam socorro em cima dos telhados por dias a fio, suportando tempestades constantes e fortes ventos.  

Dos 350 mil habitantes de Canoas, a terceira maior cidade do RS, 225 mil estão desalojados. Dos 220 mil habitantes de São Leopoldo, a nona maior cidade do RS, 180 mil estão desalojados. Representam municípios colapsados, com uma população jogada na rua, expatriada dos seus lares, expulsa de seus domínios.  

Há enterros e velórios acontecendo em 41 municípios: Bento Gonçalves, Boa Vista do Sul, Bom Princípio, Canela, Canoas, Capela de Santana, Capitão, Caxias do Sul, Cruzeiro do Sul, Encantado, Esteio, Farroupilha, Forquetinha, General Câmara, Gramado, Itaara, Lajeado, Montenegro, Pantano Grande, Paverama, Pinhal Grande, Porto Alegre, Putinga, Roca Sales, Salvador do Sul, Santa Cruz do Sul, Santa Maria, São João do Polêsine, São Leopoldo, São Vendelino, Segredo, Serafina Corrêa, Silveira Martins, Sinimbu, Sobradinho, Taquara, Três Coroas, Vale do Sol, Venâncio Aires, Vera Cruz e Veranópolis.  

Agora começa o frio, com queda brusca de temperatura, para aumentar ainda mais o desamparo. No interior, os termômetros ficarão entre 7ºC e 13ºC.  

Não é, portanto, uma tragédia gaúcha, é uma tragédia nacional jamais vista.  

Se os mineiros, nossos irmãos das montanhas, puderem oferecer ajuda, agradeceremos infinitamente. Colabore com o Pix aos flagelados da enchente: 92.958.800/0001-38 #sosriograndedosul

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