Mineiro não conta as garrafas de cerveja que tomou, não contabiliza os engradados para causar inveja aos amigos e comemorar as suas glórias etílicas.
Não vê sentido em entregar a capacidade de seu fígado.
Não avalia o poder e o alcance de uma festa pelo pouco que sobrou no freezer.
A bebida não é um fim, mas um meio para desfrutar das amizades. É um lubrificante cultural para atingir a sinceridade das relações.
Tanto que ele se importa com a marca na abertura da celebração, depois somente se interessa se está gelada. Seu objetivo de vida é combinar pessoas quentes e cervejas geladas.
Diferente da mania espalhafatosa dos borrachudos de outros estados, que empilham os cascos em cima da mesa, para mostrar o quanto são resistentes, ele esconde de si tudo o que já emborcou. Despacha rapidamente os vestígios de seu crime. Some com as provas por debaixo dos panos.
O mineiro bebe como adulto, para se satisfazer, não como criança, para aparecer.
Bebe por gosto, não permite nenhum desgosto estragar o seu paladar.
Bebe para matar a fome, não a sede, agradecendo a comida boa, fazendo descer a comida ruim.
Bebe acompanhado, para dividir o estrago.
E bebe, acima de tudo, para esquecer o que já bebeu.
Não quer ter noção de que passou dos limites, muito menos do tamanho da conta.
Ele não descreve as suas façanhas, para obter cinturão do MMA do álcool entre os próximos, contenta-se com sua simpática e anônima barriguinha, que carinhosamente chama de tanque de combustível da sedução.
Sonega os seus feitos para garantir a tranquilidade de seu momento - não deseja fiscais por perto.
Defende a sua privacidade antes de ficar alimentando a vaidade com merchandising pessoal.
Guarda o discernimento de que será patrulhado se confessar a verdade. Pois, uma vez repassando a informação, amigos e familiares recriminarão que ele exagerou.
O trago perderá a graça com o bafômetro caseiro. Não poderá dirigir mais as suas piadas sem que todo mundo o enxergue a partir do filtro do estigma e do preconceito. Deixará de ser engraçado e espirituoso para ser unicamente um mero bêbado.
Se perguntar a um mineiro o quanto bebeu, dirá que recém começou os trabalhos, mesmo que esteja há um longo tempo de bico molhado.
Sempre estará brindando, fingindo um novo começo.
O sigilo é uma arte: se há desconhecimento do horário de largada, não há hora para terminar.
Como também não entregará o histórico de sua companhia. É leal com quem divide a contação de histórias. Segura a tontura, equilibra as palavras, porém não cai na delação premiada.
Nunca estabelecerá um número exato de sua consumação. Jamais abrirá a fatura. Não chama atenção quando recalibra o copo, não faz alarde quando esgota o conteúdo de mais uma garrafa. É silencioso como a espuma.
Ninguém bebe como mineiro. Desista de tentar ganhar alguma disputa com ele. Entrará em coma alcoólico precisando desesperadamente de glicose.
Para quem foi criado na cachaça, cerveja é sobremesa.
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