Coluna

Existe solução para a desigualdade

O ano mal começou, e uma pesquisa rápida na internet já traz uma enxurrada de casos de preconceito racial no Brasil e no mundo

Por Tatiana Lagôa
Publicado em 07 de janeiro de 2022 | 03:00
 
 
 
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Produtor cultural americano é alvo de racismo em hotel do Rio de Janeiro”, “Mulheres denunciam racismo em agência bancária na Barra”, “Homem que sofreu racismo na Zara pede indenização de R$ 1 milhão”. O ano mal começou, e uma pesquisa rápida na internet já traz uma enxurrada de casos de preconceito racial no Brasil e no mundo. Parece não ter pandemia, dor, sofrimento ou perda coletiva capaz de mudar essa necessidade que algumas pessoas têm de humilhar o outro. Isso parece ser um fato, e não é com alegria que digo isso na primeira coluna de 2022. Mas, ao contrário do que este início possa ter sugerido, não vamos começar o ano com lamento, e sim com esperança.

Tá, eu sei que fica estranho eu dizer que podemos esperar por dias melhores depois de constatar que uma parte das pessoas não tem cura. Sim, algumas vão escolher o ódio até o dia da morte delas. É por isso que quero sugerir hoje que possamos buscar mudanças na sociedade, e não na visão individual de quem escolheu ser idiota (eu poderia buscar uma palavra mais educada, como “criminoso”, só que hoje acordei com vontade de chamar racista de “idiota”). 

Fato é que nós, negros, gastamos tanto tempo tendo que cavar nossos espaços, nos explicar e proteger em uma sociedade racista que sobra pouco tempo para traçarmos estratégias de ação propriamente dita. Casos como os que citei lá no início do texto nos indignam diariamente e nos trazem a falsa sensação de que não tem saída. Enquanto isso, negros e negras continuam a aceitar salários menores, papéis secundários na sociedade, migalhas e, em casos extremos e não raros, são mortos. Todos os dias. 

Talvez, nesse turbilhão em que estamos todos imersos com pandemia, crise econômica, social e de toda ordem e por toda parte, tenha passado despercebido o fato de estarmos em um ano eleitoral. Os brasileiros vão às urnas para escolher os nomes para presidente, governadores, além de integrantes das Assembleias Legislativas e do Congresso Nacional. Não é neste espaço que eu vou dizer que candidato A ou B ou Z é melhor, porque não é esse o objetivo deste texto. E o conceito de “melhor” é relativo conforme as expectativas de cada um. Por isso, nem me atrevo a entrar nesse mérito aqui. 

Meu intuito é só lembrar que pessoas negras podem e devem votar em candidatos que apresentarem propostas de políticas públicas capazes de reduzir as desigualdades impostas pelo racismo na nossa sociedade. Óbvio que não é possível acabar com o preconceito e o ódio por decreto ou lei. Por isso, eu disse anteriormente que o foco não está nos idiotas. O que dá para fazer, por exemplo, é criar regras que impeçam essa diferenciação por cor nas empresas ou nos órgãos governamentais, por exemplo. Ou elaborar formas de punição de fato eficientes contra o crime do racismo. Até porque é bem revoltante termos uma lei que criminaliza o racismo sem conseguir enquadrar nenhum racista nela. Sendo assim, que tal cobrar diretamente dos candidatos propostas concretas nesse sentido? Afinal, se 56% da população é negra, é preciso que ela seja representada e faça parte do planejamento do governo. 

Pensar nessa possibilidade não é nenhum absurdo. A União Europeia, por exemplo, criou regras no ano passado para tentar reduzir a diferença salarial entre homens e mulheres no mercado de trabalho. A Islândia, em 2018, se tornou o primeiro país do mundo a criar uma lei também tentando impor igualdade salarial entre homens e mulheres. São só dois exemplos para mostrar que, com vontade política, é possível fazer o mesmo no Brasil, tendo como foco a desigualdade racial. Se o combate ao racismo se tornar uma ação de governo efetiva, os tais idiotas que já citei não vão deixar de existir, mas não vão se sentir tão confortáveis em cometer idiotices. Utópico? Talvez. Mas só saberemos se tentarmos. E o momento é agora. Se tem uma coisa que a pandemia nos lembrou, com muita força, é que o amanhã pode não chegar para todos nós.

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