Embora as tradicionais figuras, ocupantes do poder das últimas décadas, muito tenham feito para minorar a importância do movimento ocorrido em todos os Estados da Federação na terça-feira, 7 de setembro, em apoio ao presidente Jair Bolsonaro, não se consegue deixar de reconhecer que se tratou de uma das maiores mobilizações dos últimos 20 anos.
“Como e por quê”, eis a questão. Indigesta para alguns, inconcebível para outros, deixou, entretanto, recados importantes.
A partir do momento em que Bolsonaro tem cometido ao longo de 2021 erros “graves” para um presidente, seja nas atitudes, seja nos pronunciamentos desnecessários à saúde política e econômica da nação e à dele mesmo, outros fatores mais importantes que as cores do evento são sinais evidentes de mudanças profundas.
Redes sociais, a modificação dos costumes, os pecados despudorados das elites, o desnorteamento dos “poderes”, a acessibilidade às informações e, acima de tudo, a transformação do perfil socioeconômico, entre outros fenômenos, sopram a favor de mudanças, que crítica alguma pode parar, aliás, acaba por acelerar.
A um presidente da República condiz governar com serenidade mais do que brigar. Melhor silenciar que metralhar verbalmente os desafetos. Não precisa ter uma opinião pessoal para tudo, mas ser o intérprete das diversidades, para harmonizá las. Às vezes esquecendo até a própria opinião em favor da mais conveniente e proveitosa.
Exemplos pessoais, respeito e boas maneiras facilitam a superação dos muitos obstáculos, mesmo entre latidos, pedradas e tentativas de assaltos. Precisa seguir.
No momento crítico, num país sacudido, a superação da pandemia e o retorno à normalidade se impõem. A acachapante maioria da nação, com razão, confia na eficácia das vacinas e anseia por elas, já que a queda vertical de óbitos se liga à expansão da vacinação. O risco de contágio com 70% de população adulta vacinada, nos países que atingiram essa meta, fez despencar em 75% os casos.
Apesar de alguns acreditarem que é Papai Noel ou um golpe de sorte que faz regredir a pandemia, a observação mostra que o aumento da vacinação coincide com a queda dos casos de contágio. Em Betim, no mês de junho, tínhamos 230 leitos ocupados por pacientes de Covid, quando apenas 10% da população tinha tomado uma dose. Eram 97 pacientes graves em respiração mecânica e 250 óbitos num só mês. Ontem, felizmente, uma semana após se concluir a vacinação até os 18 anos, os leitos ocupados eram apenas 18, e os pacientes em ventilação mecânica, somente seis.
Os eventos do 7 de Setembro não representam a tendência majoritária, mas um movimento “poderoso” de pessoas convencidas e dispostas.
Dois setores que sempre ficaram à margem do comando da nação mostraram força: o agronegócio e os caminhoneiros autônomos.
O setor de produção agrícola, sem carapuça, desceu em Brasília. Talvez em princípio de conscientização de que é ele, de fato, que sustenta o país, e não outros. O setor que quer respeito.
Há mais de uma década produz quantidades ininterruptamente crescentes, alimenta o Brasil, exporta imensidão de produtos, é o maior empregador do país, gera divisas e receitas públicas, esbanja um superávit setorial estonteante.
O agronegócio passou todos os demais setores em importância. Alcançou 26,6% de participação no PIB, R$ 2 trilhões dos R$ 7,45 trilhões do PIB nacional. Deixou para trás o setor industrial, com 20,6% do PIB.
Num cenário em que grandes bancos e as maiores empreiteiras de obras públicas dominaram o “poder”, o futuro sinaliza que o agronegócio quer o quinhão dele, já que é quem paga a conta do déficit financeiro dos desmandos dos outros. Ainda exporta US$ 101,3 bilhões em produtos primários, que quitam o déficit dos demais e geram US$ 50,9 bilhões de superávit para o Brasil. Sem ele seria a falência.
O Brasil, maior exportador mundial de alimentos (e de minérios estratégicos), se ergue como imprescindível aos equilíbrios mundiais.
O motor do Brasil está nas atividades deles, apesar de a cabine de comando (Legislativo e Executivo) ser dominada por outros. Eles, que pagaram a conta da “festa”, passaram a descobrir o potencial de intervenção nos destinos políticos. São eles os mais enfurecidos com os desmandos e a corrupção e a favor da sustentabilidade que praticam de verdade. É o setor com potencial de tirar da pobreza milhões de pessoas, garantir mais qualidade de vida e respeito ao país.
Não se trata mais de “fazendeiros” desnorteados apenas à procura de crédito. Baixaram em Brasília, mais que para apoiar Bolsonaro, para mostrar aos Três Poderes a dimensão hegemônica e a contrariedade com o mecanismo podre que apequena o Brasil. Querem o que a bandeira verde-amarela alardeia: “Ordem e progresso”. Cada macaco no seu galho. São pessoas rústicas que começam a deter as rédeas da economia nacional.
O dia 7 de setembro de 2021 determinou, mesmo que ainda não aparente, a perda enorme de poder da velha guarda e abalou estratégias de quem trabalha para resgatar os petrolões e mensalões, únicas fórmulas para ganhar dinheiro fácil e deixar o Brasil empobrecido.
O noivado do agronegócio com o explosivo Bolsonaro representa mais um repúdio ao “mundo” que a Lava Jato escancarou. Um mundo de gente que não sua a camisa, não arrisca, não trabalha e não produz, gente perigosíssima viciada em luxos, que diminui e sequestra a dignidade do Brasil. Os defeitos e pecados de Bolsonaro desaparecem na magnitude e gravidade dos horrores que presenciaram em outras épocas.
Mas, se eles alimentam a nação, os caminhoneiros são aqueles que movimentam tudo. Outros que molham a camisa, que se sentem vítimas dos “poderes” mais exercidos.
A escalada do agronegócio ainda está em curso, faz parte de uma gênese nacional, talvez a salvação de um Brasil onde o agronegócio quer assumir o que lhe compete.