Nos anos 1960, quando Cauby Peixoto subiu inesperadamente no palco da boate Drink, no Rio, para fazer dueto com Ângela Maria em “Samba em Prelúdio”, de Vinicius de Moraes e Baden Powell, já se antevia que a parceria seria longa e bem-sucedida. Ao lembrar desse primeiro encontro no palco, Ângela brinca: “Ali surgiu a primeira dupla sertaneja”, conta, em meio a gargalhadas e solfejos.
Fato é que Ângela e Cauby são “almas gêmeas” (palavras dela). “Eu me apeguei de alma e coração ao Cauby. A nossa amizade é muito espiritual”, revela a Sapoti. Belo Horizonte, que nunca viu no mesmo palco Ângela Maria, 85, e Cauby Peixoto, 83, terá a oportunidade de conferir a dobradinha no próximo sábado (26), no Teatro Bradesco. “Reencontro”, nome do show, vem do terceiro disco deles feito em dupla (é sucessor dos álbuns lançados em 1982, “Ângela & Cauby”, e em 1992, “Ângela & Cauby, ao Vivo”). Como qualquer disco calcado na nostalgia, é um trabalho composto por grandes canções, ainda inéditas nas vozes dos dois, e teve como critério o resgate de um romantismo perdido.
As faixas seguem como as linhas do diálogo de um casal que se adora e se alfineta, passeando por autores e estilos em músicas como “Se Não For Amor”, sucesso de Benito Di Paula nos anos 1970, “Como É Grande o Meu Amor Por Você”, que Roberto Carlos gravou em 1967, “O Mundo É um Moinho”, de Cartola, “Bronzes e Cristais”, de Maysa, e, claro, “Apelo”, de Baden e Vinicius.
</CW>Mas são os versos de uma canção de Jair Amorim e Evaldo Gouveia que melhor sintetizam a parceria: “Você e eu somos iguais. Não mudamos jamais”. “Eu não me adapto a esse tipo de música de sacudir, não. Eu sou muito romântica, então tem que ser tudo nessa base. Cauby também pensa assim, então casou bem. Não se ouvem mais histórias bem contadas através da música. Eu e Cauby estamos tentando lembrar isso para o público jovem – vamos fazer um sequestro ao passado”, conta Sapoti, ao que seu eterno escudeiro faz coro. “As músicas atuais são pouco românticas, principalmente na harmonia. Teriam que ter mais qualidade nas letras e nas harmonias também. Antigamente tinha que ter voz, talento e saber cantar. Hoje isso não é muito valorizado”, lamenta o cantor, que já assumiu que canta e faz shows semanalmente para não ser esquecido.
Majestades
Cauby é considerado “mito” da música brasileira e Ângela, no ano passado, foi condecorada como a Rainha do Rádio numa cerimônia em que o jogador Neymar lhe entregou a coroa. No entanto, o medo do ostracismo não deixa de pairar sobre Ângela e Cauby, nomes marcantes da era dourada do rádio brasileiro. Mesmo porque quem fez história na música brasileira nem sempre tem o reconhecimento que merece.
Basta lembrar que a morte da cantora Marlene, pioneira e de imensa popularidade no passado, em junho deste ano, teve uma tímida repercussão diante de sua trajetória. “Era maravilhosa a Marlene”, conta Ângela sobre a época em ela e as amigas Marlene e Emilinha Borba dividiam o posto de musa do rádio. “Quase no fim da vida elas foram esquecidas. É um negócio muito sério isso aqui no Brasil. A lembrança desses grandes ídolos que fizeram tantos brasileiros felizes. É uma pena que quando chega uma certa idade as pessoas são esquecidas e jogadas no asilo. Se a gente não mostra que ainda está ali e que esta ótimo, o pessoal não acredita e te mata antes da hora. Tem que fazer show pro povo lembrar e pra fazer essa gente que está nascendo agora saber que ainda existimos”, desabafa Ângela, que revela o segredo para continuar lotando as casas por onde passa.
“Tem que ser jovem. Eu posso ter idade, mas espiritualmente eu sou jovem. Eu sou alegre, bacana, divertida – ou pelo menos eu acho (gargalha). Trato todo mundo bem e acho que tem que ser assim. A minha idade está no papel, na cabeça e no coração eu vou ser sempre o meu melhor eu”. Com outras palavras, Cauby concorda e nos leva a concluir que o segredo da majestade é mesmo a humildade e a perseverança. “A música boa é atemporal. Em algum momento da vida nos enamoramos e é aí que a música romântica corre na frente. Sempre temos como fazer melhor para chegar mais longe”.
Cauby Peixoto e Ângela Maria
No show “Reencontro”
Teatro Bradesco (r. da Bahia, 2.244, Lourdes, 3516-1360). Sábado (26), às 21h. R$ 300 (inteira)
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