“Ainda é tempo de ‘Recanto’”, assegura Gal Costa. Ainda deve demorar para que a cantora corte o cordão umbilical que a une ao rebento lançado em 2011 com a paternidade de Caetano Veloso. Sim, porque o disco que resgatou a Gal provocante e vanguardista que o país conheceu na década de 1960 não atingiu em cheio apenas a crítica, que se entregou aos elogios, e o público, que viu sua diva revigorada.
Gal confessa que foi arrebatada pelo trabalho que a fez entrar no mundo das batidas eletrônicas, do autotune (programa de ajuste de voz) e do funk carioca, em um sentimento que cresce à medida que a turnê se prolonga – quase um ano e meio desde a estreia, no Rio. “‘Recanto’ é um show que me dá uma rasteira de emoções toda vez que subo ao palco. É tão intenso, tão arrebatador, que não importa quantas vezes já fiz ou quantas vezes vou fazer depois. É um mar de sentimentos que só aumenta”, descreve a baiana, que volta a BH depois de um ano para apresentar “Recanto” pela segunda vez, no sábado (3), no Palácio das Artes.
Talvez Gal se sinta arrebatada por si própria, na medida em que “Recanto” promove um reencontro com várias versões de si mesma, desde a tropicalista (“Divino, Maravilhoso”) até a MPB tradicional (“Folhetim”), passando pela popular (“Dia de Domingo”). O novo show traz todas essas personagens de volta à vida, matando a saudade que ela sentia de cada uma.
“Todas as ‘Gals’ juntas formam a história e têm a mesma importância”, diz ela, sem conseguir apontar a Gal que lhe fazia mais falta.
Se não se decide sobre qual provocava mais saudade, Gal deixa sugerido que uma das que mais lhe toca é aquela que em 1971 surgiu fatal e a todo vapor no palco do Teatro Tereza Raquel, no Rio de Janeiro. Quarenta e dois anos depois, na gravação do DVD de “Recanto”, em março deste ano, no mesmo local, ela não segurou as lágrimas ao cantar “Vapor Barato”, uma das faixas do emblemático “Fa-Tal – Gal A Todo Vapor” e uma das gravações mais marcantes de sua carreira. “Essa música foi lançada ali. Naquele momento, resgatei minha vida, minha história. Estar no teatro Net, que era o Tereza Raquel, foi muito simbólico. Rememorei minha história, e tudo que passei até hoje, e não consegui segurar a onda. As lágrimas escorreram”, relembra.
Fora do Brasil
Gal se apresenta em BH depois de temporada na Europa, “algo que eu queria muito, que era levar ‘Recanto’ a muitos lugares”. Documentada pela cantora em seu perfil pessoal no Instagram, com cliques de paisagens litorâneas de Montreux, na Suíça – onde foi chamada pela crítica de “musa”, da arquitetura do Porto, das ruas de Amsterdã e de sua companhia nos shows, o filho Gabriel, de oito anos, a turnê estrangeira surpreendeu. “A recepção é algo que sempre me surpreende, principalmente por estar longe de casa. Sinto carinho e respeito do público”, comenta.
Ela admite que pensa muito no próximo disco, mas, como o momento ainda é de “Recanto”, quer “apenas continuar trabalhando”. Talvez comemore seus 70 anos com projetos especiais, como fizeram muitos de seus companheiros. “Não sei. Ainda faltam três anos”, diz com a calma de quem não se aflige com o passar do tempo. “O tempo tem sido bom comigo, só ganhei sabedoria, experiência. Eu acho a maturidade uma coisa muito bonita”.
Gal Costa
No show “Recanto”
Palácio das Artes (av. Afonso Pena, 1537, 3236-7400). Dia 3 (sábado), às 21h. R$ 200 (plateia 1, inteira), R$180 (plateia 2, inteira), R$ 150 (plateia superior, inteira)