Passeando pela linha do tempo do Facebook, me detenho numa foto avermelhada cuja postagem declara o cancelamento das atualizações de mais de 30 amigos. Mais uma rolagem de barra e um desabafo de quem não fala com o pai há dias por causa de um compartilhamento polêmico de cunho político. Mais abaixo, discussões quilométricas, denúncias, indiretas, troca de farpas, invasões de posts e até mesmo algumas grosserias. Em meio a tudo isso na timeline, um apelo: “É preciso amar as pessoas como se não houvesse eleições”.
Nunca antes na história desse país as redes sociais estiveram tão permeadas pelo embate político. Num cenário de polarização acirrada como neste segundo turno do pleito presidencial, é difícil não se envolver. Mais difícil ainda é encontrar quem não tenha sido atingido, ao menos de raspão, pelo bombardeio de exasperação, discórdia, bloqueios e rompimentos nessa fase de tudo ou nada. Tema com vocação para a polêmica desde sempre, as eleições deste ano ganharam uma pitada a mais de pimenta com a mobilização e a repercussão online, e, apesar de desafiador, é possível debater sem perder a compostura.
“Acho que a opinião divergente é um contraponto. Vejo mais como uma soma de ideias do que como discordância grave. Muitas vezes, as pessoas com quem eu converso querem usar o voto para chegar ao mesmo objetivo que eu, só que por vias opostas”, opina João Paulo Gonzaga de Faria, 28. O médico entende como saudável a divergência e vê como problemática a opinião extremista e intransigente, que confunde as discussões e passa a abordar outras questões que não as políticas. Segundo ele, muita gente confunde opinião assertiva com intransigência e torna a troca de argumentos inviável.
“A princípio, a internet é um espaço para a diversidade, mas ela tem caminhado para um lugar de intolerância. A rede social, em vez de promover a conversa entre diferentes, está promovendo guerra. E isso acontece quando todo mundo se acha o dono da verdade”, diz João, que gosta de discutir política em todo lugar, mas só com aqueles que não carregam pedras nas mãos.
De Fernanda Caldeira, sua amiga há mais ou menos cinco anos, por exemplo, João discorda quanto à opção pelo melhor comandante do Brasil nos próximos quatro anos. Ele vota no tucano e ela apoia a petista. No entanto, nem essa dicotomia ideológica é capaz de tornar o diálogo difícil entre eles.
“Eu não tenho partido, mas tenho uma visão mais à esquerda, então na conjuntura política dessa eleição, estou ajudando a fazer campanha para a Dilma (Roussef, candidata do PT à reeleição). Tenho alguns amigos que vão votar no Aécio (Neves, candidato do PSDB) e que também estão militando. Às vezes, eles apelam e sai faísca, mas com o João dá pra ter discussão saudável com argumentos, sem levar pro lado pessoal”, comenta a estudante de ciências sociais da UFMG, dando a dica para que o papo não passe dos limites: maturidade e posicionamentos embasados. “Saber defender suas ideias e saber ouvir é a chave”, diz.
A falta de ambos os requisitos – informação e flexibilidade – foi a soma que resultou na saída de Paula Delucca de um grupo do Whatsapp formado por amigas de colégio. Por ser a exceção à opinião unânime das outras meninas, a engenheira se sentiu hostilizada e falando para as paredes. “As meninas faziam campanhas pesadas, com muita grosseria e muita besteira. Chegaram a falar que vão cortar relações com quem votar diferente e comentavam sobre ameaçar o porteiro e a empregada se eles não votassem no candidato delas. Quando chega num nível desses, quando ninguém está disposto a ceder e ouvir, não dá. A melhor coisa é ignorar”, conta.
Barraco não tem força
O sentimento que motivou Paula a desistir da conversa pelo aplicativo levou dois psicólogos da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, a estudar a eficácia do embate verbal agressivo – aquele que tem o objetivo de convencer o outro a todo custo de que ele está equivocado. A conclusão: a briga não leva a nada.
O estudo liderado pela dupla Leonid Rozenblit e Frank Keil atesta a existência da “ilusão da profundidade de explicação” que assuntos como a política provocam nas pessoas. Neste sentido, a troca de ideias é mais eficaz. A pesquisa mostra que quando alguém é levado a dar explicações mais específicas acerca de determinado assunto, acaba reconhecendo que entende menos sobre aquilo do que supunha. E se torna mais suscetível a mudar de ideia.
Baseados no preceito de que contra fatos mal contados há argumentos sim, os jornalista Glauber Guimarães tenta colocar panos frios nas discussões advogando no Facebook em prol de um melhor entendimento dos temas. “Sempre tento argumentar com fontes e notícias, provando o contrário ou propondo um olhar mais atento sobre aquilo que acho duvidoso. Deixo meu apoio claro, mas não tento convencer ninguém. Prefiro esclarecer”, afirma Glauber.
AMIGOS E RIVAIS
Desde março, o uruguaio César Charlone não é mais sócio do cineasta Fernando Meirelles na produtora O2. Antipetista, Meirelles se engajou na campanha de Marina Silva e Charlone defende a reeleição de Dilma Rousseff. Segundo eles foi um “divórcio ideológico amigável”.
REDE PAUTA CAMPANHAS