Reportagem

Fruta mapeada 

Colaborativo - Mapa que circula nas redes sociais indica localização e tipo dos pés de fruta de BH

Por Priscila Brito
Publicado em 07 de maio de 2016 | 03:00
 
 
 
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Alguém avisa: “amoras grandes e suculentas, porém, esse pé é mais alto. Para colher as boas você precisa de uma escada ou de um coleguinha beeeemmm alto” (sic). O pé de amora em questão fica na rua Bocaiúva, no quarteirão entre as ruas Divinópolis e Dores do Indaiá, no bairro Santa Tereza. Já o recado prestativo poderia até ter sido dito por um morador a algum curioso que espiava a colorida amoreira, mas ele está registrado mesmo é na internet, para que todos os belo-horizontinos possam ter conhecimento da exata localização e das características das árvores frutíferas espalhadas pelas ruas da cidade.

A amoreira suculenta está devidamente registrada no mapa colaborativo “Fruta na Rua”, que circula desde o início deste mês nas redes sociais (visite no link http://tinyurl.com/frutanarua). Até o fechamento desta edição, mais de cem árvores com cerca de 20 frutos diferentes já haviam sido catalogadas no mapa que está sendo construído coletivamente – qualquer um que acessar o link pode incluir quantas árvores frutíferas tiver conhecimento.

 

Assista o vídeo com Ernani Latella que doa mudas no bairro Achieta:

 
O pontapé foi dado pelo roteirista Felipe Lopes Ivaniska, que planeja usar as informações para um projeto de documentação ainda maior. “Eu pretendo, no futuro, sair pedalando por BH fotografando os pés que as pessoas marcarem pra quem não conhece e também para indicar quais as épocas que elas dão frutos, criar uma página para ir postando isso”, conta.

 

Enquanto o mapa é alimentado, histórias por trás das árvores vão se revelando. Quem adiciona uma marcação tem a opção de incluir as informações que desejar – o tipo de fruto, o endereço exato ou qualquer outro dado. Quem informou sobre a romãzeira que fica na avenida Olegário Maciel, perto da Praça da Assembleia, destacou: “dá bastante fruta, e costuma ser possível catar no pé”. Quem adicionou a árvore de acerolas na rua Nísio Batista de Oliveira, no bairro Novo São Lucas, lembrou: “Pé de acerola já muito conhecido, principalmente pelas crianças e adolescentes da região”.

Sobre o abacateiro e a goiabeira da rua Sargento Assuero Cabral, no bairro Betânia, um aviso: “em crescimento”. Ambas as árvores foram plantadas pelo Coletivo 1207, grupo com várias ações voluntárias de arte e urbanismo para o bairro Betânia e região. As mudas foram cultivadas pelo grupo no que era antes um terreno abandonado tomado por lixo e entulho. “Nos juntamos, limpamos o local e plantamos ervas, flores e árvores no local. Atualmente, também já colocamos um brinquedo para crianças e temos plano de uma horta comunitária”, explica Renata Leite, uma das integrantes do coletivo.

Mas ninguém vai ficar sem árvore frutífera até que as novas mudas cresçam. “Na rua temos pitanga também, mas já está plantada há mais tempo e já dá frutos”, completa Renata. A pitangueira, que já tem mudas, está também devidamente registrada no mapa.

O esforço coletivo gerado pelo catálogo virtual também tira do anonimato árvores frutíferas localizadas em pontos de destaque da capital, como os abacateiros nos arredores do parque das Mangabeiras, na rua Paschoal Riccio. “São duas árvores na divisa com o parque. Estão na calçada”, diz a etiqueta que acompanha a marcação.

O campus da UFMG, na Pampulha, por sua vez, revelou-se um pomar em particular: tem limoeiro, pitangueira, mangueira e amoreira. A propósito, as amoreiras, junto com as goiabeiras, são as árvores que até o momento aparecem em maior quantidade no mapa, correspondendo ao levantamento da Prefeitura de Belo Horizonte sobre as árvores frutíferas mais comuns na cidade.

Apesar de originalmente voltado para Belo Horizonte, o mapa já conta com registros também da região metropolitana. Contagem e Nova Lima já fincaram raízes com um pé de jambo e um pé de pimenta rosa, no Eldorado e na Vila da Serra, respectivamente.

 

Mais Pomares urbanos

Os parques de Belo Horizonte devem ganhar áreas exclusivas de pomares por meio de um projeto da Secretaria Municipal Adjunta de Segurança Alimentar e Nutricional. No momento, as áreas candidatas a receber o projeto estão passando por estudos de viabilidade. O Parque Lagoa do Nado, no bairro Itapoã, e o Parque das Águas, no bairro Flávio Marques Lisboa, devem receber o projeto piloto.

Atualmente, Belo Horizonte tem 50 pomares urbanos distribuídos em escolas e hortas comunitárias. Cerca de 600 mudas de laranjeira, figueira, limoeiro, bananeira e tangerineira foram plantadas no ano passado. Os plantios fizeram parte do projeto Pró-Pomar, que distribuía mudas a comunidades e instituições. No momento, o projeto encontra-se sob reavaliação.

 

 

Por muito mais fruta no pé

Tem abacate, manga, pêssego, graviola, limão capeta, jabuticaba. As variedades se revezam e diariamente são quatro os tipos que ficam expostos para quem passa na rua Grajaú, no bairro Anchieta. Mas não é um sacolão e as frutas não estão à venda. Em seu estágio inicial, ainda no formato de pequenas mudas, elas ficam no muro do aposentado Ernani Façanha di Latella, 85. Ao lado, um recado muito simples e claro: “Muda, jardim e pomar. É sua, pode levar”.
 
Há cerca de três anos, ele distribui mudas de árvores frutíferas para quem quiser levar. São cultivadas em seu próprio quintal com as sementes das árvores que ele também plantou. “Aqui tem muda todo dia. Vem todo tipo de gente aqui. Já teve gente que levou muda daqui até pro Rio, pra São Paulo. Quem sabe da história vem aqui e ‘panha’”, conta.
 
O sucesso da distribuição das mudas do aposentado mostra que um pé de frutas cabe, sim, numa paisagem urbana, por mais que, por exemplo, jaca e asfalto pareçam inconciliáveis – a propósito, há um pé de jaca em plena rua na capital, no Prado, como mostra o mapa colaborativo “Fruta na Rua”, que circula nas redes sociais com o intuito de localizar onde estão as árvores frutíferas de Belo Horizonte e já soma mais de uma centena de registros pelas ruas da cidade e da região metropolitana.
 
O número, na verdade, é ainda muito maior que esse. A prefeitura estima que há hoje cerca de meio milhão de árvores nas ruas, avenidas, praças e na parte da frente de lotes particulares, e parte delas é do tipo frutífera. Resultado de plantios feitos ao longo do século, do tempo em que Belo Horizonte era a “cidade jardim”, e também de projetos recentes do poder público e de iniciativas individuais como a de Ernani. 
 
“Eu tinha um sítio em Igarapé com 56 variedades de frutas – graviola, sapoti e por aí vai. Mas eu não me divertia com o sítio, então, resolvi fazer as mudas no meu quintal aqui para distribuir. Ponho no muro três ou quatro todo dia e ainda vai junto um versinho que eu mesmo escrevo pra alegar as pessoas. Eu sou meio metido a poeta”, ri.
 
Para quem se dispõe a plantar uma das mudas distribuídas, o aposentado dá as dicas: “se ela estiver numa caixinha de leite, basta que a pessoa corte o fundo da caixa pra não afetar a raiz.
 
Quando o vasinho for de plástico, a pessoa vai ter que colocar um pouco de água. Tem planta que pode regar duas ou três vezes por semana”, ensina. As orientações surtem efeito. “Tem gente que volta aqui e fala que já está florando, falam que o primeiro abacate vai ser meu”
 

 

 

 

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