Na última semana, uma frase curiosa do presidente do Santos, José Carlos Peres, chamou minha atenção: “O futebol é muito próximo do crime”. Em que pesem o imbróglio nos bastidores do clube praiano, com a possibilidade de o dirigente sofrer processo de impeachment, e sua briga com o vice-presidente Orlando Rollo, a declaração é muito séria. Porém, verdadeira. Não é de hoje que temos conhecimento dos mandos e desmandos que permeiam os clubes de futebol e o escuso meio que determina as relações com empresários e investidores. Aquele vale tudo que concede aos cartolas o status indissolúvel de executivos e, ao mesmo tempo, de coronéis.
Um vale tudo que se baseia na rivalidade cega, mascarado pelos resultados em campo. Um reflexo do Brasil onde “o rouba, mas faz” foi talhado como o certo. Os torcedores de dirigentes e departamentos jurídicos se multiplicam na mesma proporção da ingenuidade que racha a política nacional. Resultado de uma democracia que ainda não encontrou seu rumo. Como no futebol e na política, os crimes de colarinho branco se multiplicam, abrandados por um sistema judiciário falho, moroso e que permite aos poderosos brechas que os reles mortais não encontram.
Como explicar a um pai de família o funcionamento de um clube de futebol endividado? Estaria o esporte acima do bem e do mal? Infelizmente, está. A má gestão deveria ser punida, não premiada. Pela lei brasileira, os times faturam meio bilhão de reais num ano, mas evitam tributos cunhando em seus estatutos a mesma lógica de associações de moradores, igrejas e ONGs.
Não poderíamos esperar outra coisa de um futebol em que um ex-presidente da confederação que gere o “espetáculo” está preso nos Estados Unidos, condenado a quatro anos de prisão pelos crimes de organização criminosa, fraude bancária e lavagem de dinheiro.
A paixão nacional é o espelhamento de um país que não se move, apenas aceita os fatos na esperança de que uma pontinha dessa indecorosa festa lhe alcance. O honesto e o correto são a exceção. Sentimentos extremamente corruptíveis em um ambiente que ilude a partir do primeiro contato.
Não sejamos hipócritas ao achar que o problema é exclusividade brasileira. O futebol mundial não está impune aos ilícitos atos. Muito pelo contrário. As condições de operação da Fifa são extremamente questionáveis em inúmeros quesitos. Não à toa, Blatter e cia. seguem na mira de investigações que quanto mais aprofundadas percebem o lamaçal em que se encontra o esporte mais praticado no planeta. E o que dizer da Conmebol, que mal sabe coordenar seu sistema de inscrições, permitindo a utilização de jogadores irregulares na Libertadores? Parece piada. Mas não é.
Há de se exaltar algumas práticas europeias para tentar minimizar — diga-se passagem — a irresponsabilidade, clubes-empresa com um dono ou corpo diretor que responde judicialmente pela gestão das atividades. Algo que que falta aos times brasileiros, geridos como uma instituição de caridade, pois realmente o são em vários casos: cabides de emprego a quem se dispõe a entrar no jogo.
A correlação com a política é iminente, tanto que partidos se tornaram times e ganharam torcedores profissionais e fanáticos. No fim, a lógica do jeitinho, seja no campo ou nos governos, prevalece em um Brasil que respira por aparelhos, mas que vive satisfeito com as migalhas que se acumulam no chão.
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