Ontem, no dia em que mais um voo de brasileiros deportados dos EUA pousou em Confins, o adido de imprensa da embaixada norte-americana em Brasília, Mark Pannell, convidou a imprensa mineira para passar a mensagem do seu país a quem deseja cruzar a fronteira ilegalmente.
“Sinceramente, pedimos que não tentem. Não vale a pena, porque as coisas mudaram nos Estados Unidos”, reforçou, na embaixada em Belo Horizonte.
Desde outubro de 2019, 337 brasileiros foram enviados pelo governo dos EUA em cinco voos fretados para serem repatriadas, e mais devem passar pelo processo – são “menos de 300” com ordem de remoção, segundo Pannell, que não informa o número preciso.
Em 2019, cerca de 21 mil brasileiros foram detidos tentando chegar aos EUA – a maioria deles por El Paso, cidade na fronteira entre o Estado do Texas e o México. De acordo com Pannell, é um aumento de 600% em relação a 2018.
A maioria dos imigrantes detidos é de Minas Gerais, conforme diz o adido, daí a destinação dos voos fretados a Confins.
O pesquisador do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) e professor do departamento de demografia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Gilvan Guedes, estuda o fluxo migratório de Governador Valadares e região, no Vale do Rio Doce, e explica que o fenômeno data dos anos 50, com a exploração do mineral mica por norte-americanos.
“No começo, a emigração era de pessoas de alta renda e escolaridade. Ao longo do tempo, por causa de algumas pessoas de menor renda buscarem os EUA ilegalmente para ganhar a vida, começou a se criar uma rede de pessoas da região nesse país, como pessoas que iam sozinhas e, depois, buscavam a família. Isso facilitava, porque brasileiros iam com indicação de atravessadores da fronteira e canais para se empregar”.
Eleições
O discurso contra imigrantes é típico do Partido Republicano – em 2004, no mandato de George W. Bush, também houve voos de deportados ao Brasil. Com o presidente Donald Trump, isso se intensificou, avalia o cientista político e professor do Ibmec, Christopher Mendonça.
“Ele lançou a pré-candidatura à reeleição neste ano e, de novo, bate na pauta de evitar que imigrantes entrem nos EUA e retirem postos de trabalhos de norte-americanos”.
Desde o dia 29 de janeiro, por exemplo, os brasileiros passaram a ser enquadrados no Protocolo de Proteção do Imigrante (MPP na sigla, em inglês), que muda o tratamento de pessoas que pedem asilo.
Antes, elas passavam de três a seis meses nos próprios EUA aguardando a decisão judicial a favor ou contra a permanência no país. Desde a nova regra, passaram a ter que esperar a decisão fora da fronteira – muitas vezes, no México – e deixam de ser responsabilidade do governo norte-americano.
Abusos
Pannell nega que tenha havido maus-tratos nos abrigos dos EUA onde brasileiros aguardam a deportação – alguns deles contam que o ar-condicionado no abrigo era ajustado em temperaturas muito baixas – em pleno inverno no Hemisfério Norte.
Também há relatos de comida escassa e estragada, além de superlotação de quartos. “Elas são detidas, não é um hotel ou uma situação ideal, mas a gente está tentando diminuir o tempo disso”.
O objetivo dos EUA, diz Pannell, é diminuir o tempo de espera das pessoas em abrigos até a deportação – de 17,7 dias, de acordo com os últimos dados informados por ele.
Algemas
- O primeiro voo do ano a chegar a Confins, em 26 de janeiro, acendeu polêmicas, porque passageiros vieram com os pés e mãos algemados.
- Isso não ocorreu nos voos seguintes, que trouxeram famílias, mas pode se repetir. “É o protocolo”, diz Pannell.
- Brasileiros adultos e solteiros estão sujeitos ao procedimento, “por segurança”, explica.