O representante comercial Keytson Dias Batista, 35, primeiro tentou negociar com a escola particular dos dois filhos, de 4 e 3 anos, um desconto para encaixar a mensalidade no orçamento familiar. Mas depois a necessidade de reduzir custos falou mais alto. Representante de fabricante de impressoras, Batista viu a inadimplência de seus clientes subir 35% entre 2015 e 2017 e, com isso, a queda em sua renda foi em torno de 30%. “Tentei negociar uma bolsa na escola, mas ela também vai até onde pode. Foi uma tentativa de reduzir o custo, mas, depois de conseguir a vaga na Unidade Municipal de Educação Infantil (Umei) para o mais novo, resolvemos colocar os dois na rede pública”, afirma Batista.

Segundo o levantamento realizado pelo grupo Mercadológica com exclusividade para o jornal O TEMPO, que ouviu 609 pessoas em 45 municípios mineiros, em julho deste ano, 13% dos entrevistados tomaram alguma atitude em relação à educação de familiares em função da crise financeira. A maioria deles, 9,2%, passou os filhos da escola particular para a pública. Os demais migraram para uma escola mais barata (2,1%) ou buscaram desconto na mensalidade (1,5%).

Segundo dados da Secretaria de Estado de Educação, baseados no Censo Escolar realizado pelo Ministério da Educação (MEC), em 2013, 71.541 alunos da rede privada migraram para escolas estaduais, municipais ou federais de ensino fundamental em Minas Gerais. Já em 2016, no auge da crise financeira, foram 88.605 alunos, um aumento de 24%. No início de 2017, último ano levantado pelo censo, houve um decréscimo de 14% na comparação com o ano anterior. Foram 75.963 alunos trocando a rede privada pela pública, segundo o censo.

A advogada Claudineia Gonçalves, 40, se viu obrigada a mudar os três filhos, de 15, 11 e 4 anos, para a escola pública no ano passado, mas diz que a adaptação ainda não aconteceu. “É difícil. Eles estão demorando a se adaptar. Na rede estadual, vejo os professores muito desmotivados em função do parcelamento dos salários. Vejo que meus filhos ficam desmotivados também”, afirma. Claudineia conta que adiava a decisão de trocar a escola desde 2015, quando ficou viúva.

“Tentei bolsa em instituições filantrópicas, mas não consegui. Como tenho um filho com necessidades especiais, preferi a rede estadual que oferece um professor auxiliar, mas ele nunca chegou”, critica.

A decisão de trocar a escola, segundo a advogada, foi motivada por questão financeira. “Tive que cortar a escola particular porque senti muito a crise econômica. Sou criminalista, e nos últimos dois anos meu número de clientes caiu 60%. Muitas pessoas deixam de contratar um advogado e optam por procurar a defensoria pública”, explica Claudineia.

Queda

Estado. Houve queda no número total de alunos das escolas estaduais de Minas. Em 2014 eram 2,17 milhões de alunos, e em 2017 foram matriculados 2,10 milhões, queda de 22% em três anos.

 

Em BH e região, queda foi de 30% no ensino privado

Na região metropolitana de Belo Horizonte, como em Contagem, a redução do número de alunos nas escolas particulares chega a 30% na comparação com dois ano atrás, segundo o diretor financeiro do Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep-MG), Winder Almeida de Souza. “Em regiões industriais, como Contagem, o desemprego afetou muito as escolas particulares. Aquelas que antes tinham 1.500 alunos, hoje têm 1.100, as que tinham mil agora têm 600”, avalia. Além do desemprego, Souza afirma que a queda na renda das famílias também interfere. “O pequeno empresário, o dentista, o médico, todo profissional liberal foi afetado pela crise”, afirma.

A diretora do colégio ICJ, em Belo Horizonte, Christina Fabel, afirma que, entre os alunos que trocaram de escola no início deste ano, cerca de 60% foram para escolas públicas e 30% para escolas mais baratas. “Sentimos a crise econômica como todo o setor. Em 2016, chegamos a criar um programa de desconto que funcionou nas matrículas de 2017 e 2018. Nesse período, os pedidos de bolsa aumentaram 50%”, conta.

Segundo o diretor do Sinep, com menos alunos e sobrevivendo à base de descontos, muitas escolas estão no vermelho e correm o risco de se endividarem. “Principalmente aquelas que não são instituições filantrópicas e pagam impostos, que são muito altos”, critica Souza. “É comum reduzir a margem, os número de funcionários administrativos e renegociar com prestadores de serviço, como assessoria de imprensa e de tecnologia”, conclui.