Se, para muitos idosos, continuar trabalhando exige muito esforço físico e mental, para outros, seguir economicamente ativo pode representar uma melhoria das saúdes física e mental. E os benefícios vão desde a manutenção da cognição e do equilíbrio emocional até uma maior qualidade do corpo, conforme apontam especialistas ouvidos por O TEMPO.

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Neurologista e presidente da Sociedade Mineira de Neurologia (SMN), Fidel Castro Alves de Meira afirma que os idosos que conseguem se manter atuantes em atividades com as quais sentem prazer acabam prevenindo doenças características da terceira idade, como a demência.

“Ser estimulado pelas tarefas ajuda a botar o cérebro para funcionar mais. Todo estímulo cognitivo é muito bom”, ressalta o médico. Outro ponto benéfico é o social. “A vida no trabalho combate o isolamento, que é um conhecido fator de risco”, completa Meira.

Para Fábio Bordin, médico intensivista do Hospital Semper BH, além dos benefícios cognitivos, há outros físicos para os idosos que seguem trabalhando. “Esse ganho é até subestimado pela própria população. Em muitas atividades, quem está trabalhando está exercitando a coordenação motora, reduzindo perdas motoras, treinando do ponto de vista aeróbico. Há, ainda, um ganho de autoestima, com redução da incidência de depressão e ansiedade, e um ganho de bem-estar, já que a pessoa se sente útil. Os ganhos são enormes”, ressalta.

Maria Campos, a Thylu, aplica reiki em casa em cerca de 12 pacientes por semana. Foto: João Godinho/ O TEMPO

A professora aposentada Maria Campos, de 66 anos, moradora do Barreiro, em BH, é exemplo de que voltar a trabalhar pode “devolver” a pessoa à vida. Ela se aposentou em 2009, mas não aguentou ficar parada em casa, buscou cursos e, em 2021, aprendeu a aplicar reiki – técnica de imposição de energia pelas mãos para fins curativos –, atividade que virou sua nova profissão.

“Vi que ainda poderia ser útil, tanto para mim quanto para outras pessoas, já que eu ajudo a tirar os sofrimentos do dia a dia. É muito bom compartilhar aquilo que a gente sabe.”, disse.

Idosos aprendem a investir

O trabalho dos idosos gira, e muito, a economia. Se a maioria usa o dinheiro para pagar contas e sustentar a casa, muitos dão como destino para a quantia que recebem o bem-estar próprio. É o que aponta Sérgio Batista, gerente de planejamento e análise financeira do banco Mercantil.

“Um terço de todos os nossos investimentos vem do público idoso que a gente tem. É uma clientela altamente ativa, que faz aplicações, poupa, mas também gosta de fazer transações para fins pessoais, como viagens. E é um cliente atualizado, que usa muito o WhatsApp para acessar o banco”, afirma.

O cozinheiro e gerente Diógenes Sampaio, de 62 anos, morador de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, por exemplo, se aposentou no ano passado. Apesar disso, ele segue há 17 anos trabalhando no mesmo restaurante. Durante muito tempo, ele só tinha contas a pagar, porém, hoje, acumula a aposentadoria e o salário e, com isso, consegue ter uma vida mais confortável.

“Não tenho filhos, e a loja paga o plano de saúde. Então, o que recebo vai para a caixinha, no banco, que acompanho no celular, para eu viajar duas vezes por ano. Em dezembro irei à Bahia”, conta Sampaio. O cozinheiro disse que também faz investimentos no Tesouro Direto para ter um rendimento melhor do próprio dinheiro. “Sei que a poupança não rende quase nada. A gente tem que estar sempre atualizado”, afirmou.

Bom pra todos

Os benefícios não são apenas para o trabalhador com 60 anos ou mais. Em geral, o idoso que segue no mercado de trabalho oferece capacidades técnicas e emocionais diferenciadas, é mais responsável com horários, entre outras qualidades, afirma Marcelo de Souza e Silva, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH).

O gestor lembra que, embora tradicionalmente empregue mais jovens, o comércio tem se voltado aos profissionais “prateados”. A própria entidade mantém um programa para estimular o intercâmbio e a relação de trabalho entre empresas e o público da terceira idade. “Temos como objetivo combater a discriminação e o preconceito contra as pessoas dessa faixa etária e, ao mesmo tempo, atuar para a reinserção do público 60+ no mercado de trabalho”.

Quando é preciso parar?

Se não for uma necessidade para sobreviver, o idoso deve parar de trabalhar somente “quando quiser”, afirma Sandra Rabello, coordenadora do Núcleo de Envelhecimento Humano da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). “Mas, do ponto de vista de saúde, é importante paralisar atividades laborativas quando tiver comprometimento locomotor, psicológico, cognitivo, auditivo, déficit visual ou até na sua vitalidade”, pondera.

O taxista Ilton Parreiras, de 69 anos, morador de Contagem, na região metropolitana de BH, se aposentou após uma década como empreiteiro em funções insalubres e mais de duas décadas como taxista, atividade considerada estressante e da qual ainda vive. Atualmente, ele pensa em quando vai precisar interromper o trabalho. “Continuei atuando porque você quer ter uma vida melhor. Não dá para viver só com a aposentadoria. Você quer alguma qualidade, comprar uma carne. Mas, até os 75 anos devo parar, porque o trânsito é muito cansativo, barulhento, e não aguento muito mais”, diz.

Autônomo. O Estatuto da Pessoa Idosa garante, entre outros direitos, a liberdade para executar atividades do nascimento ao falecimento.