A cada ano, desde 2014, os presídios mineiros receberam 5.000 novos detentos. Mas, apesar da maior demanda, no mesmo período, nenhuma nova cela foi construída no Estado. Ou seja, esses 25 mil presos foram amontoados nos espaços já existentes. O resultado é uma população carcerária no Estado de 75 mil pessoas, espremidas em 37 mil vagas de unidades com infraestruturas cada vez mais precárias. Com isso, mais de 90% das cadeias mineiras estão superlotadas. Os dados estão no relatório divulgado ontem pelo Tribunal de Justiça de Minas (TJMG).
O déficit de vagas é tão alto que, dos 197 presídios, 84 não podem mais receber novos presos. As unidades foram interditadas pela Justiça em função do alto número de detentos. A superlotação tem deixado o clima tenso entre os encarcerados. “O convívio sadio está impossível. Imagine 16 ou até 30 pessoas dividindo, em tempo integral, um espaço feito para apenas oito. É desumano”, afirma o ex-presidente de assuntos carcerários da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Minas (OAB-MG), Fábio Piló.
A falta de estrutura tem afetado, inclusive, a segurança nos presídios, segundo o presidente do Sindicato dos Agentes de Segurança Penitenciária do Estado de Minas Gerais (Sindasp-MG), Adeilton de Souza Rocha. “A população carcerária de Minas cresce acima da média do país. Mas não aumenta nem o espaço para eles ficarem, nem o número de agentes penitenciários. Estamos tendo maior dificuldade para desempenhar a vigilância e a segurança dentro e no entorno das unidades”, explicou.
Denúncias. Segundo dados do sindicato, o número de agentes caiu de 19 mil, em 2017, para os atuais 16,7 mil. “É claro que isso cria uma tensão e torna nosso trabalho mais difícil, e o convívio mais conflituoso, porque não podemos perder o controle da situação”, afirma. Esse quadro está eclodindo em denúncias de violência e até torturas praticadas por agentes nos presídios.
A situação está no radar da Defensoria Pública. “Temos recebido relatos (de episódios violentos contra presos). Estamos nos articulando para fazer uma jornada de inspeção nas unidades da região metropolitana entre este mês e o próximo. Vamos averiguar se existem essas irregularidades”, disse o coordenador da área criminal da defensoria, Fernando Camargo.
Uma irmã de um detento do Presídio Inspetor Martinho José Drumond, em Ribeirão das Neves, na região metropolitana, é uma das pessoas que relatam esse tipo de situação. “Os presos estão sendo torturados. Tem gente que é acordada de madrugada com água fria. Tem casos de detento sendo levado para o pátio nu, às cinco da manhã, e leva café quente no rosto. Eles amarram presos pelados na cela, colocam sabão de barra na boca deles e jogam desinfetante na cara deles. Isso não ressocializa ninguém”, afirma.
Respostas
Apuração. Sobre as denúncias de tortura nos presídios, a Secretaria de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) disse, em nota, que acusações formalizadas são devidamente apuradas e se tornam alvos de investigação.
Superlotação. A pasta justificou que a superlotação carcerária é uma realidade nacional, e não só de Minas.
Zema diz que falta dinheiro para comida
Presente durante a apresentação do estudo do Tribunal de Justiça, o governador Romeu Zema (Novo) se mostrou preocupado com a situação no Estado, mas admitiu que o quadro não deve mudar tão cedo. “Desde do dia 2 de janeiro, essa questão da superlotação nos presídios tem nos incomodado muito e, devido à situação financeira do Estado, não será equacionada tão cedo. Temos dificuldade em pagar alimentação, quem dirá em construir novos presídios”, afirmou o governador.
Para amenizar o quadro, o tribunal vai investir R$ 19 milhões em reformas e obras de 44 Associações de Proteção e Assistência ao Condenado (Apacs). O recurso será para construção de 15 novas estruturas e manutenção em outros 29 prédios. A expectativa é que sejam abertas 1.600 novas vagas nas Apacs mineiras até 2020.