No primeiro dia após o pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que criticou o fechamento de comércios e serviços e ainda sugeriu que apenas pessoas do grupo de risco fiquem em casa – o chamado "isolamento vertical" –, prefeituras mineiras relataram uma maior movimentação nas ruas. Desde a última semana, governadores e dirigentes políticos de todo o país fizeram decretos para diminuir as aglomerações nas cidades, em resposta ao avanço do coronavírus no país.
Para o prefeito de Sabará, na região metropolitana de Belo Horizonte, Wander Borges (PSB), falta coesão do governo federal em relação às medidas. "Obviamente que estamos todos preocupados com a economia, mas temos que preservar a vida das pessoas. É preciso um alinhamento entre a União e os Estados para determinar o melhor caminho a ser seguido", comentou.
O pessebista revelou ainda que mais pessoas saíram às ruas na cidade, contrariando o isolamento social. "A gente viu um aumento ligeiro, mas muitas pessoas ainda estão amedrontadas. É uma pandemia invisível e nunca vista", argumentou.
Em Nova Lima, também na região metropolitana, a percepção foi a mesma. "Após o pronunciamento, mais pessoas estão nas ruas, mas a nossa recomendação é que fiquem em casa", alertou o secretário municipal de Administração e coordenador do gabinete de enfrentamento do coronavírus, Jean Seabra.
Conforme o secretário, só supermercados, farmácias, centros de saúde e outros serviços essenciais seguem com permissão de funcionamento na cidade. "Vamos continuar atendendo as recomendações, tanto da Secretaria de Estado de Saúde quanto do Ministério da Saúde. O número de casos suspeitos está crescendo, ontem eram 200 e há três dias não passava de 125. Temos uma população idosa, que requer atenção especial", afirmou.
O prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), disse que as declarações do presidente só "desconstroem" as ações tomadas nos municípios, consideradas por ele "impopulares". De acordo com Kalil, bares, restaurantes e comércios devem seguir o decreto da última semana. "Vai continuar tudo fechado. Agora, cabe ao governo federal fazer o que o governo americano fez, que é o maior plano da sua história. Liberou US$ 2 trilhões (para enfrentar a crise gerada pelo coronavírus)", sugeriu.
Sem alinhamento
Já o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM) e prefeito de Moema, Julvan Lacerda (MDB), enfatizou a falta de alinhamento entre o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e o presidente. "Não vamos entrar no mérito do isolamento vertical ou liberação para voltar à vida normal, isso cabe às autoridades sanitárias. Pedimos uma coesão, já que o ministro orienta uma coisa, e o presidente fala outra. De uma hora para outra, Bolsonaro falou diferente de tudo o que era recomendado, ele que nem formação técnica (sobre o tema) tem", alegou.
Especialista recomenda isolamento total
Infectologista e professora do Departamento de Clínica Médica da UFMG, Helena Duani é contra a proposta do presidente de restringir o isolamento apenas para idosos, pessoas com doenças respiratórias e cardíacas, entre outras do grupo de risco. "Só o isolamento completo vai garantir que a epidemia chegue de forma mais lenta. Temos que acreditar nos estudos feitos até hoje, não na perspectiva econômica que julgam ser a melhor para o país", criticou.
Segundo a especialista, a sugestão cria um falso isolamento. "Temos uma população mais pobre que a dos outros países atingidos, e não há até o momento nenhuma região de baixa renda atingida fortemente pela epidemia para se comparar. A única medida que se mostrou eficaz foi a da China, que promoveu um isolamento muito mais rigoroso", lembrou.
No Rio, mudança de discurso
No Rio de Janeiro, o prefeito Marcelo Crivella (PRB), que é alinhado ao presidente Bolsonaro, mudou o discurso e informou que reabrirá gradativamente o comércio da capital fluminense – a região tem 278 casos e duas mortes confirmadas pela doença. "A partir de sexta (27), começaremos a abrir, aos poucos, alguns comércios, como lojas de material de construção e lojas de conveniência (em postos de combustíveis)", divulgou nas redes sociais.