A Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) já recebeu cerca de 19 mil cadastros de pessoas interessadas em participar dos testes da candidata vacinal contra o coronavírus da Janssen, farmacêutica da Johnson & Johnson. Ainda não há data definida para o início das aplicações das doses, mas a expectativa é que isso ocorra em breve. O objetivo do produto em estudo é atenuar ou modificar a doença, de forma a reduzir a gravidade das infecções e, consequentemente, o número de internações e mortes pela Covid-19.
O tipo de vacina em teste é o de vetores virais: os pesquisadores utilizam a estrutura de um vírus benigno e insere, dentro dele, o código do que se quer combater, neste caso, o coronavírus. Chamada de Ad26.COV2.S, essa vacina usa como vetor um adenovírus humano no qual é inserido o material genético do Sars-CoV-2.
"Ele tem um potencial de entrar rapidamente na célula, que reconhece esse vírus. No caso, é um adenovírus que não replica, mas libera o material genético da proteína do Sars-CoV-2 e induz uma resposta imunológica", explica o pesquisador responsável e professor da UFMG, Jorge Pinto. Trata-se de uma vacina de dose única.
De acordo com o professor, o melhor cenário para uma vacina é quando ela previne a infecção, como é o caso do imunizante contra o sarampo, por exemplo. A ideia é que o produto em estudo não previna, mas, sim, seja capaz de reduzir a gravidade da doença. "Se a vacina for capaz de atenuar ou modificar a doença na população mais velha, especificamente acima de 60 anos, isso já é um grande feito", pontua. Para serem eficazes, as vacinas contra o coronavírus não devem induzir apenas a produção de anticorpos, mas também de imunidade celular.
Testes
Os pesquisadores farão uma triagem dos voluntários inscritos. Todos os participantes devem ter mais de 18 anos de idade, e a prioridade são pessoas que estejam na linha de frente, mais expostas ao vírus, como motoristas de ônibus e balconistas. Há interesse também em minorias étnicas, sociais e de gênero. Além disso, a expectativa é que 30% dos participantes tenham mais de 60 anos, faixa etária que mais vai se beneficiar da redução da gravidade da Covid-19 possibilitada pela vacina.
Os testes serão divididos em etapas e grupos de voluntários. Inicialmente, o produto será testado em pessoas sem patologias prévias. Depois que a segurança for constatada, haverá uma segunda fase destinada a grupos com alguma morbidade, como obesidade, problemas cardíacos e hipertensão. Segundo o professor Jorge Pinto, a UFMG tem potencial para realizar testes em cerca de 2.000 pessoas, mas o número ainda não está definido.
Saiba como se cadastrar para participar dos testes
A previsão é de que os participantes sejam observados por um total de 24 meses. “Nós temos que seguir os preceitos básicos ditados pela ciência. É evidente que há algumas liberações de vacinas em caráter emergencial para populações específicas, mas, quando falamos de previsão de acesso expandido para população inteira, esse é um cenário realista. Não podemos correr o risco de induzir doença ou dano em uma população previamente sadia", pontua o pesquisador. "Não necessariamente a primeira vacina vai ser a melhor", completa.
Metade dos participantes vai receber placebo, e a outra metade, o componente ativo da vacina. Como o estudo é duplo-cego, nem os voluntários nem os pesquisadores saberão o que ficou com cada um. "Esse é o padrão ouro na condução de um estudo que não seja sujeito a vícios de interpretação", explica Pinto.
Os participantes vão receber o produto no Hospital das Clínicas e devem retornar ao local após um mês para uma coleta de exames. Depois, haverá vistas aos voluntários a cada seis meses até o término dos estudos. Haverá, ainda, um canal para que os voluntários comuniquem eventuais sintomas de Covid-19.
"Para entrar no estudo, o participante vai conversar por um tempo prolongado com o pesquisador. Ele tem que estar ciente do que significa o estudo dos procedimentos, das restrições que vão haver por participar de um estudo desse. Ele vai ser avaliado, vai ser feita uma entrevista clínica, exame clínico para ver se ele se encaixa nos critérios do estudo", explica a infectologista e professora da Faculdade de Medicina e coordenadora clínica da pesquisa, Júlia Caporali.
Saiba mais
Cooperação. A UFMG participa como centro colaborador da rede internacional CoVPN, que testará vacinas e anticorpos monoclonais produzidos por diversos laboratórios para combater o coronavírus.
No mundo. O estudo da candidata vacinal da Janssen vai realizar testes em até 60 mil participantes em diversos países do mundo, sendo 7 mil no Brasil, de acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). As aplicações serão realizadas nos Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Paraná, Minas Gerais, Bahia e Rio Grande do Norte.