Justiça

Cresce a disputa entre os pais para ter a guarda dos filhos  

Número de ações movidas pela Defensoria Pública de Minas aumentou 13% no ano passado

Por Joana Suarez
Publicado em 12 de janeiro de 2014 | 04:00
 
 
 
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Desde que os pais se separaram há quatro anos, Gabriel*, 17, Luana*, 13, e Antônio*, 6, não têm mais sossego. O mais novo é o único que ficou com a mãe, já trocou de escola pelo menos cinco vezes, ficou com boletim negativo e faltou às aulas 25 dias em dois meses. “Os pais que vivem em situação de disputa pelos filhos muitas vezes estão doentes e não conseguem enxergar o melhor para o que eles têm de melhor, que são os filhos”, explicou a coordenadora das Defensorias de Família e Sucessões de Belo Horizonte, Paula Regina Fonte Boa Pinto. A Defensoria Pública de Minas Gerais moveu 2.402 ações de guarda de janeiro a novembro de 2013 – os dados de dezembro não foram informados –, número 13% maior comparando-se com igual período de 2012.

A coordenadora explicou que quando os pais acionam o órgão para discutir a guarda, na maioria dos casos, é porque não entraram em acordo durante a ação de divórcio. Porém, ela ressaltou que entre os atendidos há casos de pais que não eram casados oficialmente e precisam de uma ação específica de guarda para definir com quem ficarão as crianças. “Eles entram na Justiça pela guarda. Quando a disputa é acirrada, ocorrem muitos descumprimentos de acordos, e o filho vira moeda de troca”, explicou a defensora. Ainda conforme Paula, muitos casos evoluem para alienação parental – quando um dos pais denigre a imagem do outro diante dos filhos e cria uma rejeição. Nos últimos dois anos, a coordenadora contou que o número de casos anual de alienação passou de um para cinco.

A família citada no início dessa reportagem está constantemente na Justiça para discutir a guarda e o cumprimento dos acordos judiciais. Primeiramente, as três crianças viviam com a mãe. Depois, os dois mais velhos (adolescentes) passaram a ficar com o pai e o menor de 6 anos com a mãe. O pai, o cirurgião vascular Maurício Hélvio Victor Leite, 45, conseguiu o direito de ver o filho pequeno todas as quinta-feiras e fins de semana alternados em julho último. Porém, o acordo não estaria sendo cumprido e Leite afirmou que esta há mais de três meses sem saber o paradeiro do filho e da mãe da criança.

“Foram três anos de luta para eu poder visitá-lo, e agora não consigo nem ver meu filho. Terei que recorrer à Justiça mais uma vez”, contou o cirurgião, que alega pagar uma pensão de seis salários mínimos e meio para a mãe. A reportagem tentou entrar em contato com Luciana Utsch, 44, mas foi informada de que ela estaria em São Paulo. Na decisão judicial de julho último, ela teria o direito de visitar os outros dois filhos apenas na presença de uma psicóloga.

* Nomes fictícios.


Entenda

São três tipos de guarda: 

- Unilateral. Um dos pais fica com a criança e o outro tem direito a visitar em acordados períodos. É a mais comum.

- Compartilhada. O filho mora com um dos pais, mas os dois participam de todas as decisões na vida do filho e ambos estão sempre presentes. É considerada a ideal e era para ser a regra.

- Alternada. Cada semana a criança fica com um dos pais. Não é vista com bons olhos, porque o filho fica sem referência.


Pequenos. De acordo com o IBGE, em 2012, nos processos de divórcio, as mulheres ainda detinham a maior parte das guardas dos filhos menores, com 88,8%. Mas cresceu o compartilhamento da guarda, que passou de 2,7% em 2000 para 5,3% em 2012. Já os homens ficaram com os filhos em 4,9% dos processos.


Depoimentos

"Morro a cada dia"

Já fiquei três meses sem ver meu filho e, quando o reencontrei, a maior emoção da minha vida foi dar um abraço nele. Nesse dia, prometi que sempre o acharia onde quer que ele estivesse, mas não estou conseguindo cumprir a promessa. A relação com a minha ex-mulher é muito complicada. Os dois filhos mais velhos ficaram comigo, e a mãe não tem feito questão de vê-los. Ela vive mudando de cidade, e eu tenho que ligar para todas as escolas para achá-lo. Meu filho não está sendo bem cuidado, e a mãe está me impedindo de vê-lo. Continuo mantendo as coisas dele em casa porque nunca vou desistir de ter meus três filhos juntos e felizes. Eu não vivo, eu morro a cada dia que passa por causa disso.

Maurício Victor Leite, 45, cirurgião vascular


"A guarda não é eterna"
A guarda dos filhos e o direito de visitas podem ser sempre questionados. Nenhuma decisão é eterna. O interesse da Justiça é preservar a unidade familiar, pensando no melhor para as crianças. Mas nenhum adolescente pode dizer com quem quer ficar. Se os pais não entram em acordo, quem decide é o juiz. Ele pode ouvir o depoimento dos filhos, mas a decisão envolve diversos fatores. O ideal seria que os pais sempre entrem em acordo porque eles sabem o que é melhor para os filhos. A briga judicial prejudica todas as partes: os filhos, a família e a sociedade, que vai receber pessoas despreparadas. Filhos de pais que brigam dão problema na escola e na vida.

Ângela de Lourdes Rodrigues, juíza da 12ª vara da família

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