Os Centros de Referência à Saúde Mental (Cersams) continuam sendo motivo de queda de braço entre a prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e o Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG). A disputa ganhou um novo capítulo nessa quinta-feira (14), quando a Justiça Federal decidiu impedir, em medida liminar, a interdição dos centros a pedido do conselho.
Nos últimos dois dias, o CRM vem aplicando a chamada ‘interdição ética’ dos profissionais que atuam nesses locais, alegando que há irregularidades nas unidades. Já a prefeitura, que processou o conselho, alega que há “abuso de poder” por parte do conselho.
A principal crítica da prefeitura é quanto à competência do CRM para impedir o trabalho dos médicos nos Cersams. Segundo o procurador municipal Hércules Guerra, o Conselho atua com abuso de poder ao extrapolar as competências legais.
“A lei que cria o Conselho Federal e os Conselhos Estaduais não dá a esses conselhos o poder de interdição. Quem interdita hospital ou algum equipamento de saúde é somente a Anvisa ou a Vigilância Sanitária. O CRM não tem poder para isso”, alega Guerra.
Em uma série de vistorias realizadas nos centros no ano passado, o Conselho alega ter encontrado irregularidades nas unidades, que incluem a falta de plantonistas, a falta de um diretor técnico que deve ser registrado no CRM e de profissionais para atendimento psiquiátrico e leitos deste tipo nas unidades.
De acordo com a presidente do Conselho Municipal de Saúde, Carla Anunciatta, nenhuma dessas alegações justificam a interdição ética proposta pelo CRM. “ O Cersams são serviços de saúde com atendimento multidisciplinar. Tem enfermeiro, psicólogo, o próprio médico. Estão querendo criar uma dependência desse profissional que não existe nesse tipo de serviço”, alega Carla.
Ela ainda acusa o CRM de agir de forma "corporativista" na oposição à luta antimanicomial. “Belo Horizonte é referência no modelo antimanicomial desde 1993. Eles não podem querer destruir esse modelo em nome de uma posição política, que é o que está parecendo, em nome de uma posição
“O que estão fazendo é terrosimo”, alega usuária
Quem está no meio desse fogo cruzado entre a PBH e CRM-MG sofre com a situação. É o caso da Laura Fusaro Camely, 25, que é usuária dos Cersam desde 2017. Além disso, ela integra o Conselho Municipal de Saúde.
Segundo Laura, o pedido de interdição feito pelo Conselho de Medicina é algo proporcional a um ataque terrorista, tanto para os usuários quanto para quem trabalha nesses locais. “A questão é intimidar, e os médicos também ficam intimidados, com razão, afinal se um conselho faz isso, não dá para confiar”, alega Laura, que completa. “A questão é criar o caos, por isso eu digo que é um ato terrorista. No dia que os usuários souberem que não tem médico no Cersam, as pessoas vão ficar desesperadas, mesmo que esse profissional não seja o único a atuar por lá”, diz.
Quando solicitou a interdição ética dos 16 Centros de Referência em Saúde Mental de Belo Horizonte, o CRM-MG garantiu que encontrou irregularidades que prejudicam o trabalho dos profissionais e defendeu a interdição como "último recurso”. Desde julho, o conselho e a prefeitura tem se reunido para tratar do tema, mas o impasse continua.
política”, acusa a presidente do Conselho Municipal de Saúde.
Outro lado
A reportagem procurou o CRM-MG questionando as alegações da prefeitura e, inclusive, solicitando uma entrevista com a presidente do conselho, Cibele Alves de Carvalho. No entanto, o CRM apenas enviou uma nota dizendo que "procedeu às interdições éticas dos médicos que prestam assistência nos Centros de Referência em Saúde Mental (CERSAMS) de Belo Horizonte, em conformidade com suas prerrogativas legais de atuação". A entidade diz que ainda não foi notificada sobre a ação.
PÚBLICO ALVO
Quem é atendido nos centros: Pessoas em sofrimento mental (depressão, transtorno afetivo bipolar, esquizofrenia e outras psicoses, demência, deficiência intelectual e transtornos de desenvolvimento, incluindo autismo)
ESTRUTURA EM BELO HORIZONTE
8 Centros de Referência em Saúde Mental (Cersam)
5 Centros de Referência em Saúde Mental - Álcool e outras Drogas (Cersam-AD)
3 Centros especializados (Cersamis)
COMO FUNCIONAM
São equipamentos para acolhimento das situações de crises, urgências em saúde mental e acompanhamento de pessoas em sofrimento mental com quadros persistentes.
O atendimento e o acompanhamento dos usuários são feitos por equipes multiprofissionais, que estruturam a proposta terapêutica integral de cada paciente.
A REDE
33 residências terapêuticas
9 centros de convivência
4 consultórios de rua
2 unidades de acolhimento transitório adulto e infantojuvenil
ATENDIMENTO
197.501 atendimentos foram realizados nos Cersams de BH, de janeiro a agosto de 2021, em toda a rede do Sistema Único de Saúde (SUS)
(FONTE: PBH)