Extorsão

Flanelinhas usam até saco de lixo para demarcar as vagas

Métodos usados por guardadores variam de região para região da capital, e preços chegam a R$ 50

Por Aline Diniz
Publicado em 10 de junho de 2019 | 03:00
 
 
 
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A 200 m da 4ª Companhia da Polícia Militar, na área central de Belo Horizonte, na avenida Álvares Cabral, flanelinhas agem livremente, impondo preços para que motoristas estacionem seus carros. Por semana, é preciso desembolsar R$ 35 para garantir a vaga. “Trabalho aqui há 40 anos. No caso de a fiscalização passar, eu ligo para o cliente, e ele coloca a Faixa Azul pelo aplicativo. Prefiro não ficar com a chave do carro. Recebo toda segunda-feira”, contou um guardador de carro, sob sigilo.

Apesar de antiga, a atividade é ilegal. A prefeitura permite a atuação de lavadores de carro, mas cobrar por vagas públicas pode configurar crime de extorsão. O preço da limpeza deve ser estabelecido entre condutor e prestador de serviço, mas o uso da vaga não pode ser condicionado ao trabalho.

Por dois dias, a reportagem de O TEMPO percorreu cinco regiões da capital e flagrou a ação livre dos guardadores.

Valores e regras variam. Para segurar vagas, vale de tudo: uma guardadora que atua ao lado do hospital São Lucas, no bairro Santa Efigênia, usa sacos de lixo da vizinhança para demarcar o espaço. Além disso, ela tem o costume de impor valores.

Retrovisor quebrado

Um colega que divide o ponto com a flanelinha relata: “Ela é cadastrada na prefeitura. Cobra R$ 5 na entrada e R$ 10 na saída. Já briguei com ela por causa da agressividade com os clientes. Eu não determino preço, cada um paga quanto quiser”. Um médico de 49 anos, que pediu anonimato, confirmou a história e revelou que paga porque tem receio de ela danificar seu carro: “A gente fica intimidado e acaba pagando”.

O técnico de telecomunicações Márcio Neves, 53, precisou levar o neto de 3 anos para fazer uma cirurgia no hospital. Ele disse que pagou para estacionar, mas preferiu entregar o dinheiro só na volta. “Eles (flanelinhas) sempre falam que precisaram colocar a Faixa Azul pelo aplicativo, mas nunca entregam o comprovante. Costumo dar o valor do rotativo mais R$ 1 ou R$ 2”, disse. Neves teve o retrovisor quebrado em um dia em que preferiu não pagar.

Mensalistas

Perto da Faculdade Ciências Médicas, na alameda Ezequiel Dias, na região central, o custo de um “mensalista” é de R$ 200. “Sou conhecido de todos os médicos que trabalham na faculdade. Dependendo da especialidade, é mais caro. Para anestesista, por exemplo”, revelou um guardador. Ele trabalha na mesma rua há mais de 30 anos. “Ele é de confiança, todo mundo aqui deixa o carro com ele”, disse um segurança da Ciências Médicas.

Nos arredores do Mineirão, o preço varia de acordo com a importância do jogo ou evento. Em dia de clássico ou partida pela Libertadores, por exemplo, o valor chega a R$ 50.

O motorista é abordado logo que chega às proximidades do campo. Aos gritos de “Olha a vaga aqui, patrão!”, os torcedores se sentem intimidados e acabam “concordando” em pagar. “Ele falou que ia dar uma olhadinha, e eu tive que deixar, mas isso é extorsão. A rua é pública”, reclamou um torcedor de 46 anos, minutos antes da partida entre Cruzeiro e Fluminense pela Copa do Brasil.

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