Rede municipal de BH

Greve de professores prejudica aprendizado e rotina de famílias

Todos perdem, mas prejuízo é maior para alfabetizandos, ressalta especialista

Por Vitor Fórneas
Publicado em 06 de abril de 2022 | 03:00
 
 
 
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“A pandemia trouxe um retrocesso no aprendizado dos meus filhos, e a greve dos professores só fortalece isso”. O desabafo da dona de casa Carolyne Marques, 32, é o mesmo de muitos pais com filhos matriculados na rede pública de ensino de Belo Horizonte, em greve desde 16 de março. Nesta quarta-feira (6) uma assembleia da categoria decidirá quais serão os próximos passos do movimento. Especialista alerta que os impactos do afastamento dos estudantes das classes são enormes e se estendem desde o aprendizado até a formação enquanto sujeito.

O ano letivo de 2022 foi o primeiro após a pandemia com os estudantes na sala de aula desde fevereiro. Em 2021, houve o retornos dos alunos, com escalonamento, em maio, após quase dois anos reclusos, devido à pandemia. Agora, por conta da greve, eles estão novamente nos lares. 

Alteração no cotidiano

A rotina das famílias mudou, e adaptações tiveram que ser feitas. A projetista Amanda Dias, 32, conta ter ficado “desesperada” quando soube que o filho, de 6, não teria aula: “Justo no momento em que ele teve a condição de voltar às aulas e enfim iniciar a vida escolar, não está podendo”. Ela trabalha fora e teve que deixar o garoto aos cuidados da sogra de uma prima. “Se isso não estivesse acontecendo, teria que sair do emprego”, ressaltou.

Pais entrevistados pela reportagem se viram como podem para manter a rotina de estudos para as crianças. “No início da greve, fui criando atividades básicas, lembrando da minha infância e buscando exercícios na internet”, conta Carolyne, que concilia o ensino dos filhos, de 7 e 8 anos, com os cuidados com as filhas mais novas, trigêmeas de 1 ano e 4 meses.

A socióloga Helen Tavares, 43, precisou apertar o orçamento para não interromper novamente o estudo da filha. “Coloquei na aula particular duas vezes por semana. Vai gerar um custo que não estava previsto. Foi a forma que encontrei, já que, devido ao trabalho, não consigo desenvolver atividades com ela”, resumiu.

Há um ‘passo atrás’ na reconstrução do saber pós-pandemia

A greve é “um passo atrás” no processo de reconstrução do saber neste momento de pós-pandemia, segundo a professora de psicologia da educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Libéria Neves. Ela afirmou que as respostas sobre os impactos dos afastamentos das crianças e adolescentes das salas de aula somente poderão ser percebidas depois.

“O tempo nos dirá o efeito disso tudo para esta geração. Dois anos na vida é muita coisa, tanto no ponto de vista emocional e como cognitivo. Vai gerar outro tipo de estudante, de jovem e de criança. Vamos aprender juntos”, resume.

Ela defende a legitimidade da greve dos professores, mas ressalta: “Todo movimento gera perda, que recai na sociedade”. 

Pior para os alfabetizandos

Os impactos se estendem em todas as faixas etárias, segundo ela. No entanto, no caso de estudantes da alfabetização, o prejuízo é ainda maior, pelo fato de estarem na “fase fértil”. “É um momento em que as crianças criam hipóteses em relação a tudo que acontece e precisam da intervenção do professor. Perder isso gera um grande prejuízo”, aponta.

Libéria ressaltou a importância do ambiente da escola: “A falta do espaço escolar incorre em prejuízo muito grande no se constituir como sujeito”.

Nova proposta da PBH vai ser analisada hoje, em assembleia

Em reunião nesta terça (5) entre representantes do Executivo e dos professores, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) apresentou nova proposta de reajuste salarial para os professores, que será votada às 8h30 desta quarta, em assembleia da categoria, na praça da Estação. 

Segundo a professora Adriana Souza, integrante da comissão de negociação do sindicato, a proposta não contempla os pedidos da categoria. “Não responde aos anseios, pois desmonta nossa carreira. Não há reajuste de 33%”, disse. Já a PBH explicou que a proposta está “de acordo com a capacidade financeira do município”.

O índice de reajuste ofertado não tinha sido divulgado pelas partes até o fechamento desta edição.

Dados da adesão à paralisação 

O Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Belo Horizonte (Sind-Rede BH) informou que 40% das escolas municipais aderiram à greve nesta terça-feira (5).

Já a PBH informou que 2% das escolas participaram da paralisação  – sete unidades, de 323, ficaram sem aulas.

Reposição ainda vai ser acertada

Sindicato e governo municipal ainda vão discutir a reposição das aulas, após o fim da greve. “Será uma demanda permanente nossa”, informou Adriana Souza, integrante do sindicato.

Já a PBH respondeu que serão garantidos os 200 dias letivos e que a reposição poderá ser em “dias do recesso de julho, sábados letivos e outros recessos”.

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