Diante do pior desastre ambiental do país – o rompimento da barragem de Fundão em Mariana, na região Central de Minas, no último dia 5 de novembro – a Assembleia Legislativa de Minas Gerais aprovou, no mês passado, o Projeto de Lei 2.946/2015, que altera toda a política ambiental do Estado. Alvo de críticas, a mudança vem, conforme especialistas, na contramão da necessidade de uma legislação mais rígida, uma vez que o texto flexibiliza os processos de licenciamento e fiscalização ambiental, tornando as decisões da atividade uma questão política.
O projeto, que está em fase de redação final pela Assembleia para ser encaminhado para sanção do governador Fernando Pimentel (PT), também prevê mudanças no funcionamento do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) e do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam).
A questão é que as alterações restringem a atuação do Ministério Público de Minas (MPMG) nas decisões do Copam, reduzindo o poder do órgão na fiscalização a apenas alguns processos de licenciamento, e diminuindo a autonomia da sociedade civil. Além disso, também há precedentes para a criação de projetos prioritários com o objetivos de beneficiar empreendimentos.
Para o professor e especialista em direito ambiental Bruno Albergaria, a proposta centraliza no Estado o processo de licenciamento, o que é inverso a um processo democrático, que prevê mais influência da sociedade civil, para garantir a sua idoneidade. “Quanto maior for o processo democrático, mais difícil é se chegar a um consenso de deliberação (como em audiências públicas). O que o projeto de lei está propondo é justamente a concentração, nas mãos do poder público, das análises das licenças ambientais, em detrimento da ‘voz do povo’”, afirma.
A lei vigente determina que todos os projetos que têm potencial poluidor e dependem de um licenciamento ambiental passem pelo Copam. De acordo com a nova proposta, apenas os de maior porte e potencial poluidor (classes 5 e 6) precisarão de uma aprovação do órgão. Além disso, as atuais câmaras temáticas – formadas por membros do MPMG, sociedade civil e órgãos públicos, que avaliam especificamente as atividades consideradas poluidoras, como mineração e construção civil –, passarão a ser câmaras técnicas especializadas, o que pode causar a retirada de alguns desses membros.
Discussão. Secretário de Meio Ambiente de Minas Gerais, Sávio Souza Cruz, acredita que a proposta chega como um avanço, principalmente ao melhorar a gestão interna dos órgãos responsáveis, dar mais autonomia a eles e desobstruir os milhares de processos atualmente estagnados.
Avaliação diferente da feita pelo presidente da Comissão de Meio Ambiente da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Minas Gerais, Mário Werneck. Ele acredita ser possível acelerar as decisões com a participação da sociedade civil. “É uma perda significativa. A sociedade tem grande valia e responsabilidade. Ali, são pessoas que conhecem as causas e que, em muitos casos, denunciam o voto político. É um retrocesso”, ratifica.
Minientrevista - Sávio Souza Cruz - Secretário de Estado de Meio Ambiente
Essa proposta foi resultado de uma força-tarefa, que foi constituída pelo governador, diante de um verdadeiro colapso que tínhamos no sistema estadual de meio ambiente. Além disso, é preciso lembrar que as duas últimas reestruturações foram feitas por leis delegadas. Isso feriu quase que de morte o Sisema. Acabou com toda a estrutura de gestão que existia e ainda hipertrofiamos estruturas de regularização e licenciamento ambiental. Estamos investindo na parte de gestão.
Como ficarão os processos de licença ambiental? Houve agilização ou flexibilização?
Foi muito falado à respeito de agilizar licença. Primeiro que as pessoas confundem agilizar licença, com agilizar concessão de licença. Agilizar é um processo cujo desfecho pode ser a concessão ou a negativa. O que não é razoável é termos 2.700 processos de licenciamento inconclusos. E, com isso, vamos tratar de forma diferente os desiguais. Não é razoável, pelo menos para mim, que o licenciamento de um posto de gasolina siga o mesmo rito do licenciamento de uma mega usina hidrelétrica ou de mineração. O que a gente fez foi: primeiro, aqueles processos mais simples e de menor poluidor vão ficar nas unidades regionais. Até a classe 4 será analisado lá, receberá parecer e o superintendente, com base nos pareceres, concederá ou negará a licença. Se alguém não está satisfeito com a decisão, caberá recurso. Já para projetos de maior porte, recriamos as câmaras técnicas do Copam. Estarão presentes nelas sociedade civil, academia e poder público. Ao contrário do que ouvi muitos dizendo, que o projeto enfraquece o Copam, acho que ele robustece o conselho.
E os projetos prioritários?
Hoje existe aqui, informalmente, um negócio que se chama Núcleo de Análise de Projetos Prioritários. Vai para ele aquilo que o secretário determina e ninguém fica sabendo. Eu não quero nenhum órgão informal. É para existir, então vamos criar uma superintendência de análise de projetos prioritários. Se for empreendimento público, o secretário pode mandar para lá. Se for privado, eu não quero essa responsabilidade para mim. Então é o Conselho Estadual de Desenvolvimento Econômico e Social que analisa e bate o carimbo naquilo que ele achar prioritário.