As polícias Civil e Militar de Minas Gerais são as únicas do Brasil que não informam sobre casos de suicídio entre os servidores que atuam nas instituições, conforme o 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. O documento reúne informações de todos os Estados brasileiros e monitora a evolução dos índices de segurança pública no país. O levantamento foi divulgado na última quinta-feira (20 de julho). A omissão dos dados acende uma alerta, uma vez que o estado acompanha os desdobramentos sobre a morte da escrivã Rafaela Drumond, que tirou a própria vida, no dia 9 de junho, sob denúncias de assédio moral e sexual no trabalho.
De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2022 foram 69 suicídios de policiais militares e 13 de policiais civis. São Paulo é o Estado que possui o maior número de casos, em ambas as instituições, sendo 16 de militares e três de civis. O levantamento, em âmbito nacional, aponta, também, uma redução do número de suicídios. Nas polícias civis do país, foram nove casos a menos em relação a 2021, enquanto nas polícias militares a redução foi de dez casos.
A análise dos dados, presente nas páginas 53 e 54 do Anuário, considera que no caso de Minas Gerais, único Estado a não informar sobre os casos de suicídio entre policiais civis e militares, a ausências dos números “não protege os policiais”, conforme alegado pelas instituições. O documento aponta, inclusive, que a conduta passa a impressão de “que o problema não existe, agravando ainda mais a situação daqueles que precisam de ajuda e não sabem o que fazer”.
A falta de clareza de dados, ainda de acordo com o levantamento, não afeta apenas a categoria dos policiais, mas os rumos da Segurança Pública. “Sem informação precisa e tratada, suicídios de policiais aparecem, de tempos em tempos, como chamada dos jornais, mas, não têm sido o suficiente para a adequação das respostas institucionais, a fim de que outras mortes sejam evitadas”, diz o documento.
O Anuário alerta também para o assédio moral que, embora se tenham poucos registros sobre as causas de suicídios nas polícias militar e civil do país, é um fator que pode ocasionar a autoextermínio. “Além disso, vale lembrar que os policiais são chamados a assumir o papel do ‘policial herói’, negando a própria vulnerabilidade frente aos problemas que demandam ajuda externa para serem dirimidos. Nessa direção, impera o desgaste físico e mental pelo contato continuado com situações de perigo nas ruas, ou mesmo, o estresse pela sobrecarga das atividades administrativas”, acrescenta o texto.
Silêncio como parte da rotina
No dia 6 de julho, a reportagem de O TEMPO questionou as polícias militar e civil sobre os casos de suicídios nas instituições. A Polícia Militar não disponibilizou as informações e justificou, por meio de nota, que os dados estão reservados dentro do ordenamento jurídico vigente.
"A PMMG esclarece, ainda, que as comissões de letalidade e uso da força das Unidades da Polícia Militar de Minas Gerais acompanham os casos de letalidade e vitimização policial e não se restringem à condição do sujeito passivo. Tendo os militares acompanhamento psicológico sempre que há ocorrências com uso de arma de fogo em que haja óbito", disse em nota.
A Polícia Civil também foi questionada na mesma data sobre os casos de suicídio entre servidores. A instituição justificou que não informa os dados com o intuito preservar a família das vítimas e de garantir o direito à privacidade.
Sobre o anuário
Sobre o fato de as instituições serem as únicas do país a não informar os dados sobre casos de suicídios, as polícias Militar, Civil e a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp) foram questionadas na manhã desta segunda-feira (24). O Governo de Minas reforçou, por meio de nota a versão das instituições e garantiu que "que acompanha de perto os dados sobre saúde mental e eventuais casos de suicídio nas respectivas tropas que atuam nas Forças de Segurança do Estado".
O Governo justificou ainda que não disponibiliza os dados para preservar "a família das vítimas, garantir o direito à privacidade e evitar análises descontextualizadas sobre casos individuais que possuem motivações multifatoriais". Por meio de nota, o governo disse ainda que são realizadas diversas ações para prevenção de problemas de saúde mental. A nota pode ser lida na íntegra ao término da matéria.
Dados
- Suicídio de policiais militares por estado em 2022
São Paulo – 16
Pernambuco – 07
Bahia - 06
Paraná - 05
Rio de Janeiro - 05
Rio Grande do Sul – 05
Goiás - 04
Ceará - 03
Distrito Federal – 03
Espírito Santo – 03
Sergipe – 03
Maranhão - 02
Mato Grosso – 02
Mato Grosso do Sul – 02
Amazonas - 01
Rio Grande do Norte – 01
Santa Catarina – 01
Demais estados – disseram não ter tido casos
Minas Gerais - não informou
- Suicídio de policiais civis por estado em 2022
São Paulo – 03
Santa Catarina – 02
Bahia – 01
Ceará - 01
Distrito Federal – 01
Mato Grosso do Sul – 02
Paraíba - 01
Rio de Janeiro – 01
Rio Grande do Sul – 01
Demais estados – disseram não ter tido casos
Minas Gerais - não informou
Fonte: 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública
Veja a nota do Governo de Minas
O Governo de Minas, por meio das Forças de Segurança do Estado, acompanha de perto os dados sobre saúde mental e eventuais casos de suicídio nas respectivas tropas que atuam em Minas Gerais. Contudo, dados estatísticos sobre o tema não são objeto de divulgação, com o intuito preservar a família das vítimas, garantir o direito à privacidade e evitar análises descontextualizadas sobre casos individuais que possuem motivações multifatoriais.
Cabe salientar que são realizadas diversas iniciativas com os servidores para prevenção de problemas no campo da saúde mental.
A Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) realiza, anualmente, o Programa de Saúde Ocupacional do Policial Militar (PSOPM), que tem como objetivo a promoção e cuidado com a saúde integral dos policiais militares da ativa, procurando prevenir, identificar e controlar os riscos relacionados à atividade policial militar, através da realização de avaliação de saúde nas áreas médica, odontológica e psicológica.
Além do acompanhamento e apoio de psicólogos lotados nas Unidades de Atenção Integral à Saúde (UAPS), a instituição também possui na sua rede orgânica a Clínica de Psiquiatria (CLIPS) em Belo Horizonte, que acolhe e atende aos militares e seus familiares em caráter de urgência ou ambulatorialmente. A PMMG conta ainda, para atendimento psicológico e psiquiátrico, com o suporte de uma rede credenciada com serviços disponíveis em todo o estado.
A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG), por sua vez, disponibiliza o Centro de Psicologia do Hospital da Polícia Civil (HPC), que oferece atendimento psicológico clínico, por meio de sessões presenciais e também por teleconsulta, para servidores da ativa, aposentados e dependentes, da capital e do interior do estado.
Ademais, o HPC dispõe doplantão psicológico, que consiste em um dispositivo de escuta especializada, sem necessidade de agendamento, serviço amplamente divulgado aos servidores.