Alarmante

Minas chega a 100 mil notificações de Covid-19 com só 10% dos casos testados

Estado opera muito abaixo da capacidade prometida ainda para o início de abril e tem os piores índices de testagem do país

Por Cristiano Martins
Publicado em 06 de maio de 2020 | 13:52
 
 
 
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Minas Gerais ultrapassou nesta terça-feira (5) a marca das 100 mil notificações de Covid-19. A enorme maioria, porém, segue classificada como "caso suspeito". Com apenas 10,4% de diagnósticos realizados até o momento, o estado opera muito abaixo da capacidade prometida ainda para o início de abril e tem os piores índices de testagem do país, segundo um levantamento realizado pelo Coronavirus-MG.com.br.

De acordo com os últimos números oficiais, Minas registrava, até terça-feira (5), 100.038 notificações de possíveis contágios pelo novo Coronavírus. Destas, 2.452 estão confirmadas (incluindo 94 mortes), 7.984 foram descartadas e 89.602 aguardam análise.

No dia 31 de março, o governador Romeu Zema havia anunciado em entrevista ao “MG1” (TV Globo Minas) que a capacidade estava sendo dobrada, naquele momento, de 200 para 400 testes por dia. E que, já a partir de 3 de abril, esse volume alcançaria os 1.800 diagnósticos diários graças a uma parceria entre a Funed (Fundação Ezequiel Dias) e outros 19 laboratórios particulares e universitários habilitados para o serviço.

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A média, no entanto, tem sido de aproximadamente 130 resultados divulgados a cada dia desde então, conforme dados disponíveis nos boletins epidemiológicos e outros canais oficiais de comunicação do Estado.

Os números também chamam atenção quando colocados em perspectiva junto aos dos demais Estados. O Coronavirus-MG.com.br consultou os boletins epidemiológicos de todas as Secretarias de Saúde que divulgam o número de testes, segundo o Índice de Transparência da Open Knowledge Brasil. Os últimos dados comparáveis, referentes ao dia 4 de maio, colocam Minas em último lugar tanto na média de testes aplicados a cada 100 mil habitantes quanto na proporção de casos testados sobre o total de notificações.

“Sob controle”

O governo tem reafirmado que a situação está controlada em Minas Gerais. Nessa segunda-feira (4), o secretário de Saúde, Carlos Eduardo Amaral, chegou a comparar os números do Estado aos da Coreia do Sul, exemplo mundial na contenção da pandemia. O país asiático registrava na terça-feira (5) 254 mortes, 10.804 casos confirmados e 640.237 testes aplicados: 1.249 a cada 100 mil habitantes.

“Temos um padrão de comportamento e de eficiência semelhante ao da Coreia. Não me parece que estamos mal na condução da Covid-19 em Minas Gerais”, declarou o secretário, ao informar que o número máximo de mortes no Estado não chegaria a 200, ainda que somados os 90 óbitos já confirmados e os outros 86 em investigação até aquele momento.

“Mesmo não realizando exames em 100% dos casos notificados, a SES possui mecanismos de controle capazes de avaliar o real cenário da doença. Cada pessoa notificada por síndrome gripal, mesmo sem diagnóstico laboratorial, permite aos técnicos inferir no que está acontecendo”, argumentou Amaral.

Recentemente, em 23 de abril, durante o anúncio do programa Minas Consciente, o governador havia confirmado a capacidade de 1.800 diagnósticos diários, mas dito que a estratégia do Estado não será a testagem em massa, mencionando o “momento de dificuldade financeira e o fato de os testes não estarem facilmente disponíveis”.

Em 2 de maio, o Estado recebeu uma carga de 1,5 milhão de testes rápidos comprados da China para serem distribuídos em órgãos públicos e prefeituras do interior.

Para o infectologista Luiz Wellington Pinto, professor da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (CMMG), o número de testes realizados precisa ser maior. “O ideal é que se pudessem testar mais pessoas, até para se ter uma noção melhor de quantos já tiveram contato (com o vírus) e desenvolveram alguma imunidade. Ainda mais, considerando a importância de Minas Gerais e a reabertura econômica que estão querendo fazer”, declarou.

“É necessário ter cuidado. Por um lado, valoriza-se demais esse número, perguntando ‘será que é só isso mesmo?’. Por outro, não dá para ficar inerte. Está sendo pouco testado, e o ideal seria fazer uma testagem maior”, conclui o especialista.

Subnotificação

O Coronavirus-MG.com.br havia pedido alguns esclarecimentos sobre o tema ao governo e recebeu uma resposta às 16h01 na terça-feira.

Em nota enviada pela assessoria de comunicação, a Secretaria de Saúde informou que “o percentual de diagnósticos positivos no grupo testado gira em torno de 13,5%, portanto é plausível inferir que, dentro do universo de casos notificados, o número de positivos seja semelhante”.

Segundo os balanços, porém, o percentual de casos positivos é de 23,5% de diagnósticos positivos entre os casos testados, e não 13,5%. Em outras palavras, em uma projeção como esta, o número real de infectados seria de até 23,5 mil pessoas, quase dez vezes mais que os 2.452 confirmados oficialmente.

O Coronavirus-MG.com.br voltou a solicitar esclarecimentos e aguarda um retorno.

Leia as respostas na íntegra:

No dia 31 de março, o governo anunciou que a capacidade de testes seria ampliada para até 1.800 por dia. A média, desde então, tem sido de 130 novos resultados divulgados por dia. Qual a explicação?

Ao todo, a rede de laboratórios parceiros tem a capacidade de realizar até 2 mil exames por mês. Contudo, a quantidade de exames realizados por dia é variável, uma vez que depende da quantidade de amostras que chegam aos laboratórios.

Minas tem os piores índices de testes sobre o total de notificações (10,2%) e também de testes por 100 mil habitantes (47,8) dentre todos os estados do Brasil nos quais essa comparação é possível. Qual a explicação?

Em relação à ocorrência de possíveis subnotificações de casos de Covid-19 no Estado, esclarecemos que a SES-MG possui mecanismos de controle capazes de avaliar o real cenário epidemiológico da doença no estado, mesmo não sendo possível realizar 100% de exames em casos de notificação em uma epidemia.

O acompanhamento diário das notificações de casos é um marcador sensível, porque cada pessoa notificada para doença, mesmo sem diagnóstico laboratorial, permite aos técnicos inferir sobre o cenário real. Considerando que o percentual de diagnósticos laboratoriais que são positivos no grupo testado gira em torno de 13,5%, é plausível inferir que dentro do universo de casos notificados, o número de positivos seja semelhante.

Outro mecanismo extremamente importante são as notificações de óbitos. Uma vez que a notificação de qualquer óbito é compulsória, é possível compreender a evolução da doença e avaliar a real incidência no estado. O acompanhamento das Síndromes Respiratórias Aguda Grave (SRAG), que também são de notificação compulsória, é outro mecanismo que sinaliza sobre o cenário da Covid-19.


Há alguma orientação oficial sobre as prioridades na aplicação de testes? São testados apenas os óbito e casos graves, ou os profissionais de saúde, por exemplo?

Sobre quem está sendo testado no método PCR, a SES-MG informa que se enquadram em situações com indicação para coleta de amostras e testagem para COVID-19 no momento atual:

- Amostras provenientes de unidades sentinelas de Síndrome Gripal (SG) e Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG);
- Todos os casos de SRAG hospitalizados;
- Profissionais de saúde sintomáticos (neste caso, se disponível, priorizar Teste Rápido e profissionais da assistência direta);
- Todos os óbitos suspeitos;
- Por amostragem representativa (mínimo de 10% dos casos ou 3 coletas), nos surtos de SG em locais fechados (ex: asilos, unidades do sistema prisional, hospitais, etc.).

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