Aproximadamente 600 prefeituras em todo o Estado de Minas Gerais fecharam as portas nesta segunda-feira (24), como parte do movimento "Crise nos municípios: prefeituras de Minas param por você", apoiado pela Associação Mineira de Municípios (AMM). Serviços básicos foram interrompidos na tentativa de pressionar os governos federal e estadual para a situação crítica pela qual muitos municípios estão passando. Entre as queixas estão a desoneração dos municípios em relação às políticas públicas de responsabilidade do Estado, judicialização da saúde, repasses do transporte escolar, custeio da Policias Civil e Militar, revisão da Lei Robin Hood, entre outras.
O prefeito de Pará de Minas e presidente da AMM, Antônio Júlio (PMDB), se mostrou animado com a adesão. Segundo ele, via de regra, os prefeitos têm receio de fazer paralisações e sofrer retaliações, serem condenados pela população da cidade ou mesmo pela imprensa. "Esse movimento é para alertar os habitantes sobre a realidade dos cofres públicos municipais. Os prefeitos, principalmente das cidades menores, são praticamente gestores de verbas dos programas federais. Se começam a cortar recursos, o que eles podem fazer? Só fechar as portas mesmo", lamentou.
Ainda segundo ele, essa não é uma ação contra o governo estadual ou federal, mas um movimento nacional que busca evitar uma catástrofe. A de que os municípios fiquem sem dinheiro para serviços básicos na educação e saúde. "Não dá para ser tudo como o Joaquim Levy (ministro da Fazenda) quer. Todos os prefeitos já fizeram muitos cortes seja de pessoal, de salários, número de secretarias, entre outros. Já estamos sentido efeitos dessa crise desde a época da Copa do Mundo", pontuou.
Para Djalma de Oliveira (PSDB), prefeito de Rio Vermelho e presidente da Associação dos Municípios da Microrregião da Bacia do Suaçui (Ambas), as prefeituras estão no sufoco. "A grande maioria já mandou funcionários embora. Não tem como evitar cortes. Mas chega num ponto que nem isso resolve. A arrecadação está baixa. E quem pode nos ajudar é o Estado e a União", afirmou.
O prefeito de Fronteira dos Vales, no Vale do Mucuri, Hayden Matos Batista, o Dr. Branco (PR), liderou no último dia 13 a Marcha dos 300, que levou prefeitos à cidade administrativa para protestar. Ele pede, por exemplo, que o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) seja ampliado, que o Estado pague pelos custos da Polícia Militar, por ser uma obrigação estadual, a manutenção do Fundo da Erradicação da Miséria (FEM) e maiores repasses para o transporte escolar, outra responsabilidade do Estado.
Miséria
Segundo ele, em 2012 governo do Estado criou o Fundo da Erradicação da Miséria (FEM) que findaria em 2015, financiado com um aumento de 2% no ICMS nas vendas de arma, álcool e fumo. "No ano passado o FEM arrecadou R$ 204 milhões, que deveria ajudar famílias em situação de miséria. Até classificaram o que configuraria a família em miséria. Mas esse dinheiro não chegou nas famílias. O Estado acabou se apossando desse dinheiro para usar na Copanor, da Coplag, Sedese, Sedinor. Mais uma vez o dinheirinho do pobre está financiando políticas do Estado", reclamou.
Para ele o FEM precisa ser mantido e destinado corretamente para as famílias pobres, por meio do fundo de saúde, educação, assistência social dos municípios. "Tem que voltar na íntegra para os municípios. E por outro lado, temos que parar de bancas obrigações do Estado. O governador já ventilou tudo isso. São propostas de palanque dele. Acredito que ele tá afinado com isso. Mas precisamos encurtar a distância entre prefeitos e governador. É uma distância muito grande", refletiu.
Branco diz que os municípios estão financiando políticas que deveria ser do Estado. De acordo com ele, são despesas com gasolina, manutenção de veículos e internet para a Polícia Militar, consultas e exames especializados que consomem verbas da atenção básica porque o Estado não paga. "O que recebemos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) não custeia o município. Não dá para fazer nenhum investimento. E aí a sociedade começa a enxergar o prefeito como bandido. Até porque não conseguimos atender a Lei de Responsabilidade Fiscal. É nosso pescoço que está na guilhotina", queixou-se.
BR-381 fechada
Às 10h uma panfletagem parou a BR-381, KM 398, no trevo de Itabira. "Nossa intenção é fazer, ali, uma panfletagem para chamar atenção das pessoas da nossa região para o problema", disse o prefeito de São Domingos do Prata e presidente da Associação dos municípios da microrregião do Médio Rio Piracicaba (Amepi), Fernando Rolla (PSDB).
A Polícia Rodoviária Federal confirmou a manifestação. O protesto durou cerca de 30 minutos, sem prejuízo para o trânsito.
Ainda segundo Fernando, o que se espera, em todo Estado, é que as sedes das prefeituras baixem as portas. "Na nossa micro-região, os funcionários vão trabalhar internamente, mas o atendimento ao público será suspenso hoje", alertou.
A princípio o objetivo era fechar uma pista e panfletar entre 10h e 12h. “Por fim, resolvemos fazer uma paralisação rápida e simbólica para não prejudicar os cidadãos que precisam ir e vir”, afirmou Rolla.
Segundo ele, a União fica com a maior parte do bolo dos impostos em prejuízo dos municípios.
"Dispensei quatro médicos na saúde da cidade. Reduzi contratos com prestadores de serviço em torno de 20%. Estamos controlando e reduzindo o uso de maquinas para economizar combustível. Ainda assim, não tem sido suficiente. Por isso estamos protestando para receber valores que são de direito dos municípios".
O presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), cita como exemplo o Detran. Ele afirma que 70% dos funcionários do Detran, no interior, são na verdade funcionários cedidos pelas prefeituras. “A prefeitura paga o salário para que atuem em um órgão estadual. E o Detran é o segundo órgão que mais arrecada no Estado. Está errado”, afirmou.
Bolo menor
A paralisação surgiu como uma sugestão do prefeito de Cana Verde, região oeste de Minas, Jéferson de Almeida (PSDB). A princípio ele propôs a ideia a prefeitos de 13 cidades vizinhas. Eles iriam protestar para receber o acréscimo de 0,5% do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), pois queixam-se de terem recebido apenas metade; receber os restos a pagar das emendas destinadas aos municípios entre 2013 e 2014 e pontuar, ainda, que a queda de receita poderia implicar no enquadramento de vários prefeitos na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Segundo Almeida, “com a queda no bolo total, também cai os percentuais máximo para gasto com pessoal, entre outras determinações da LRF”, explicou. A iniciativa ganhou as redes sociais e chegou à Associação Mineira dos Municípios (AMM), que apoiou a ideia. Com o respaldo, o movimento ganhou força e destaque na mídia. Foram feitas assembleias com os presidentes das microrregionais que, em assembleia, definiram o dia 24 como data para o protesto.
Pimentel socorre
Na última sexta-feira (21), o governador de Minas Gerais Fernando Pimentel anunciou a liberação de R$ 310 milhões para prefeituras mineiras, entre linhas de financiamento do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) e recursos para o transporte escolar.
Outros Estados
Protestos semelhantes foram realizados no Ceará, onde 131 cidades paralisaram no dia 31 de julho e no Mato Grosso do Sul, no último dia 10, sem um número exato de municípios paralisados.
O que pedem os municípios
- Revisão de Lei Robin Hood: criaram-se tantos crie rios, que as cidades mais carentes não conseguem cumprir. Dessa forma, a fatia do ICMS que o governo do Estado pode gerir livremente e deveria beneficiar aquelas cidades que mais necessitam, acabam indo para cidades que já contam com faturamento maior.
- Fundo de Participação dos Municípios (FPM): é um recurso transferido pelo governo federal a todas as cidades brasileiras composto de 24% da arrecadação do Imposto de Renda (IR), bem como do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Em algumas cidades o FPM chega a representar 80% da receita da prefeitura. Quando o governo federal promove isenções do IPI, por exemplo, a arrecadação cai e, em consequência, as verbas municipais. As prefeituras pedem que, nesses casos, a União faça uma compensação.
- Repasses pendentes de Convênio: Existem cerca de 350 programas federais sendo executados pelos municípios. Como exigem contrapartidas, muitas vezes as despesas de execução são maiores do que os repasses recebidos. Os prefeitos pedem que as transferências de recursos aos municípios para execução dos serviços leve em conta o valor real dos gastos para a execução dos programas.
- Convênio das Multas de Trânsito: As prefeituras fazem jus a 50% dos valores de multas de trânsito nas cidades. Contudo, não há uma periodicidade definida para a transferência destes valores aos municípios conveniados. O município sabe que tem a receita, mas não sabe quanto, nem quando vai receber. A reivindicação é de que seja estabelecida periodicidade e regularidade dos repasses.
- Judicialização da saúde: Muitos cidadãos estão buscando na Justiça a obtenção de medicamentos, tratamentos negados, elevando gastos dos municípios. O pedido, nesse caso, é um maior investimento em saúde por parte da União e do Estado.
- Transporte escolar: É uma obrigação do Estado, mas gerida pelos municípios através de repasses de verbas. Os prefeitos queixam-se de que os valores que recebem não são suficientes e pedem que o montante seja calculado com base no quilômetro rodado.
- Revisão do Pacto Federativo: De cada R$100 recolhidos em tributos, R$ 56 ficam para a União, R$ 26 para o Estado e R$ 18 para os municípios. Os prefeitos pedem maior participação municipal nesse bolo.