A fome, a casa sem banheiro e com apenas um cômodo para dez pessoas e a falta de dinheiro para pagar passagem de ônibus são apenas uma parte da história que Arleide Costa de Moura Oliveira, 32, deixou no passado após obter uma bolsa integral pelo Programa Universidade para Todos (Prouni) e se formar em administração na PUC Minas. Criado em 2004, o benefício completa 15 anos com desafios a serem vencidos para dar seguimento à universalização do ensino superior.
Neste primeiro semestre, 23.142 estudantes de baixa renda entraram em universidades privadas com bolsas integrais e parciais do Prouni em Minas, 2,17% a menos que os 23.656 que conquistaram uma vaga pelo programa no primeiro semestre de 2018, segundo o Ministério da Educação (MEC).
“Todo ano, sobram vagas, mesmo com vários querendo entrar nas faculdades. Isso acontece porque o estudante não tem direito à bolsa se tiver baixa renda, mas tiver estudado em escola particular”, explica o diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior, Sólon Caldas.
Segundo ele, o Prouni é um dos grandes responsáveis pela inserção de pessoas de baixa renda nas universidades. Um exemplo é Arleide, da primeira geração de bolsistas: “Eu nunca tinha tido plano de saúde na vida, era tudo pelo SUS. Desde meu primeiro emprego, pago a assistência. Eu deixava de ir aos lugares por falta de dinheiro para ônibus, mas agora tenho meu próprio carro e moradia digna. Nunca mais me faltou comida”.
Baiana, ela se mudou para BH aos 5 anos, com a família, tendo apenas uma mala e sonhos. Na capital, eles moraram em barracões, de favor, em casas de lona e em um cômodo sem banheiro. “Quando cheguei à universidade e me senti diferente de todos, pensei em desistir. Eu era muito simples. Voltei chorando para casa uma semana”, emociona-se.
Relembre
O relato dela é parecido com o de jovens que acessam as federais com cotas, como mostrou o jornal O TEMPO no último domingo. Até o fechamento desta edição, o MEC não tinha respondido à reportagem se o contingenciamento na educação poderia afetar o Prouni e quais são os planos para o programa.
Mudanças no Fies elevam demanda por bolsas de estudo
As mudanças ocorridas entre 2015 e 2018 no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) tendem a aumentar a demanda de bolsas do Prouni, conforme prevê o diretor executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior, Sólon Caldas. No entanto, nada indica que vai haver elevação da oferta de vagas pelo programa – ou seja, mais pessoas deverão ficar fora das salas de aula do ensino superior.
Agora, o programa não é totalmente arcado por recursos do governo federal. Uma parte dos estudantes, com renda familiar de até três salários mínimos, consegue fechar o contrato direto com a União com juro zero. Mas, para os que têm renda familiar de até cinco salários mínimos, o financiamento é tomado em bancos privados.
“De 2015 para cá, o Fies sofreu modificações que tiraram o caráter social do programa, que se tornou puramente financeiro. Primeiro que, agora, o governo financia uma parte, e o bolsista tem que arcar com o restante. Mas nem todos conseguem pagar esse valor”, explica Caldas.
Ele acrescentou que, como nem sempre os estudantes atendem requisitos impostos pelos bancos privados, mais pessoas vão necessitar de bolsas do Prouni para acessar as universidades.
Entenda
O que é. O Prouni é um programa de universalização do ensino superior que distribui bolsas integrais e parciais para estudantes de baixa renda. Criada por lei em 2004, a iniciativa teve a primeira turma no primeiro semestre de 2005.
Frase
“O corte (o critério para entrada no Prouni) deveria ser a renda, e não a origem dos estudos, já que é um programa social para beneficiar alunos menos favorecidos economicamente.”
Sólon Caldas
Diretor da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior