Na propriedade rural de Waldir Pollak, 73, as lembranças do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, na região Central, ainda se fazem presentes nas marcas da lama que ficaram nas árvores de seu terreno, no distrito de Paracatu de Baixo.

A tragédia, em 2015, matou 19 pessoas. Mas, três anos e meio depois, a força da natureza traz de volta o sentido da vida, e tudo começa a ficar verde de novo.

A propriedade de Pollak foi uma das 25 escolhidas para serem fazendas-modelo em um programa da Fundação Renova, entidade criada pelas empresas Vale, Samarco e BHP para reparar os impactos do rompimento da barragem.

O Plano de Adequação Socioeconômica e Ambiental (Pasea) pretende transformar 235 propriedades rurais atingidas pela lama em unidades produtivas com manejo sustentável em uma extensão de 113 km, de Mariana até Rio Doce, na Zona da Mata.

O programa desenvolve ações para garantir a retomada das atividades a partir de práticas de conservação ambiental. Produtores rurais estão sendo preparados para novas experiências agroecológicas, diversificação da produção, manejo racional do pasto e conservação de recursos naturais.

Por já atuar de maneira consciente desde 2004, quando já cultivava produtos orgânicos, Pollak foi escolhido para ser um dos mestres do projeto, e a propriedade dele virou escola.

Para se tornar uma unidade de demonstração, o sítio de Waldir Pollak também ganhou alojamento, galinheiro, chiqueiro, e um curral será construído. "A vida está recomeçando. O finado papai dizia: 'O que foi ontem já passou'", disse.

Fazenda Corguinho, em Rio Doce, é outra referência em programa da Fundação Renova

Reconstrução integrada

A estratégia de reparação das propriedades rurais atingidas pela lama da barragem de Fundão foi traçada com base em soluções já consolidadas, afirmou o engenheiro florestal especialista no uso sustentável da terra Gabriel Corrêa Kruschewsky, que presta serviços para a Renova. 

Ele explicou que foram feitas análises de água e de solo. Além disso, segundo o especialista, identificaram-se a renda do lugar e o que era produzido para, depois, ser traçado o Plano de Adequação Socioeconômica e Ambiental (Pasea) de cada propriedade.

“Independentemente do nível em que a propriedade rural foi atingida pelos rejeitos, o Pasea olha para ela como um todo e faz a reparação integral”, diz.

Ainda segundo Kruschewsky, o Pasea deve ser implantado nas propriedades atingidas até 2021, mas os donos dos terrenos vão contar com assistência técnica e monitoramento por mais dois anos.

Andamento das obras
O canteiro de obras para o início do reassentamento das 140 famílias que perderam suas casas em Paracatu de Baixo foi concluído em maio, segundo a Fundação Renova, distante 8 km do lugarejo destruído pela lama.
“Foram feitas instalações de escritórios, sanitários, estacionamento, ambulatório e refeitório. Nesse mesmo mês, a fundação obteve anuência do Conselho Municipal do Patrimônio e Cultural de Mariana, documento que estabelece as condicionantes a serem executadas para mitigar e compensar os impactos das obras”, informou a Renova. 

Ainda de acordo com a fundação, a Secretaria Municipal de Obras e Gestão Urbana de Mariana emitiu, em 5 de junho, o licenciamento urbanístico que viabiliza o início das obras de terraplenagem. "Maquinários e mão de obra serão mobilizados para a supressão vegetal e a abertura de ruas”, acrescentou. 

Em relação ao subdistrito de Bento Rodrigues, a Renova informou que as obras de infraestrutura para o reassentamento de 255 famílias caminham para o fim. A próxima etapa será a construção das primeiras casas e bens coletivos, como escola e posto de saúde. A supressão vegetal foi concluída em dezembro”, acrescentou.

O reassentamento de Gesteira está na fase de conclusão de estudo de sondagem e cercamento, “A próxima fase é o desenho do projeto conceitual do reassentamento”, completou a entidade privada.

Construção de barraginhas
A onda de lama do rompimento da barragem em Mariana impactou matas ciliares do rio Doce e as planícies de inundação da propriedade rural de José Maurício Pereira da Silva, 65, no município de Rio Doce. A principal fonte de água do gado “secou”, pois tudo precisou ser cercado. “As planícies de inundação eram as áreas mais férteis para o gado pastar”, lamentou Silva.

José Maurício Pereira, proprietário da Fazenda Corguinho

Na época, caixas d’ água e tanques de alvenaria foram construídos, e a água para o gado beber chegava em caminhões-pipa. 

Com o Pasea, 22 barraginhas foram construídas nos 126 hectares para a captação de água de chuva. Nascentes de água foram protegidas, e o fazendeiro precisou unificar pastagens para o gado matar a sede do outro lado da propriedade. 

Silva, que também é engenheiro civil e ambientalista, considera a água o bem mais precioso, mas destaca o programa Renovando Passagens, implantado em sua fazenda, o mais importante: “Haverá o replantio de madeiras de lei em processo de extinção na região, e vou ter um banco de sementes”, comentou.

A propriedade dele foi transformada em unidade de demonstração de silvicultura e vai receber, no período chuvoso, plantio de mogno, jatobá e cedro.
Em outra propriedade atendida pelo programa, no distrito de Santa Cruz do Escalvado, também às margens do Rio Doce, foram feitos revegetação emergencial e plantio de espécies nativas. O local também recebeu barraginhas. Nessa fazenda-modelo, os vizinhos vão aprender a fazer o manejo sustentável do gado e também a combinar culturas agrícolas e florestais no mesmo espaço. 

O programa também recorre à tecnologia para aumentar a produção de leite com inseminação artificial dos animais e com técnicas de manejo. Ao todo, 170 produtores tiveram seus rebanhos melhorados geneticamente, com a inseminação de 939 matrizes, que já deram 326 crias.

Fazenda Barra do Ipiranga, em Santa Cruz do Escalvado

Próxima etapa

A Fundação Renova informou que as obras de infraestrutura para o reassentamento de 255 famílias do subdistrito de Bento Rodrigues – primeira comunidade destruída pela lama da barragem de Fundão – caminham para o fim. O próximo passo será a construção de casas e bens coletivos, como escola e posto de saúde. No distrito de Gesteira, o reassentamento está em fase de conclusão de estudo de sondagem e cercamento


O repórter viajou a convite da Fundação Renova